Defesa de Braga Netto diz que Cid foi coagido e mudou versão sobre general

Nulidade da delação é um dos pilares da defesa prévia do general no caso da trama golpista


Cézar Feitoza e Ana Pompeu | Folha de S.Paulo

Brasília - A defesa do general Walter Braga Netto afirmou ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta sexta-feira (7) que o tenente-coronel Mauro Cid mudou versões sobre a participação do ex-ministro na trama golpista de 2022 após ser coagido em sua delação premiada.

O general da reserva Braga Netto foi ministro da Casa Civil e da Defesa no governo Jair Bolsonaro (PL) - Pedro Ladeira - 25.mar.20/Folhapress

A equipe comandada pelo advogado José Luis Oliveira Lima afirmou que a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) tem pouca sustentação em provas e se baseia em trechos enviesados da colaboração de Cid.

Para a defesa, o acordo de colaboração de Mauro Cid "é, certamente, um dos mais problemáticos e ilegais da história [do] STF". Um dos motivos, segundo os advogados, seria a velocidade com que a delação foi negociada e homologada sem a anuência da PGR de Augusto Aras.

As afirmações foram feitas na defesa prévia apresentada por Braga Netto. Os advogados do general seguiram a mesma estratégia adotada por outros denunciados e não se aprofundou no mérito das acusações contra o militar, dando mais destaque a questões procedimentais, como a falta de acesso às provas e as controvérsias da delação de Mauro Cid.

Em um dos trechos do documento, a defesa de Braga Netto diz que a denúncia da PGR não apresenta provas que corroborem a declaração de Mauro Cid sobre o suposto repasse de dinheiro do general, em uma caixa de vinho, para militares que monitoravam o ministro Alexandre de Moraes.

"Além de referida afirmação ter sido extraída à fórceps do colaborador após coação, muitas mudanças de versões, e através de delação completamente viciada e desprovida de provas sustentadoras do relato, a denúncia não narra as circunstâncias de referido financiamento", diz.

Os advogados do militar dizem ser impossível refutar que Braga Netto enviou dinheiro se a denúncia "sequer entende quando, como e onde ocorreu a referida entrega". "É evidente que a ausência de descrição e de elementos probatórios é tamanha que compromete seriamente a defesa do requerente", completa.

A defesa do general afirma ainda que a Procuradoria-Geral da República faz "meras suposições" ao concluir que Braga Netto se encontrou com militares das Forças Especiais em sua casa, em 12 de novembro de 2022, para preparar o plano de assassinato do ministro Alexandre de Moraes.

"Diferente do que quer fazer crer a acusação, não encontra respaldo na palavra do colaborador a alegação da acusação de que o ‘Copa 2022’ era um plano de execução do ‘Punhal Verde Amarelo’, muito menos que o Gen. Braga Netto teria atuado efetivamente no âmbito de planos golpistas que tinham como intenção monitorar e executar o Min. Alexandre de Moraes."

A resposta do general ao Supremo recorre a frases impactantes para descredibilizar a denúncia da PGR. Nas primeiras páginas, a equipe de defesa de Braga Netto chama a trama golpista investigada de "imaginado atentado à democracia". Pouco mais à frente, afirma que a denúncia "embarca de vez na ficção própria de um filme ruim" e que assume "total descompromisso com a verdade".

O texto afirma que a denúncia descreve sete diferentes planos e estratégias para a ruptura democrática, dos quais Braga Netto é acusado de envolvimento em apenas um, o "Copa 2022". Ele teria financiado a operação. Os advogados rebatem a acusação afirmando ser baseada apenas nas declarações de Mauro Cid, também questionadas por eles.

"Não é necessário ser um especialista em armas para conceber que toda essa operação e seu pesado armamento custariam bem mais do que cem mil reais. Mas não é preciso fazer qualquer esforço para descredibilizar a denúncia, pois ela já é desmentida pelo seu principal pilar de sustentação, o coagido delator Mauro Cid", diz a defesa.

A manifestação ainda exalta o currículo do general, enumerando os cargos ocupados por ele. "A fantasiosa acusação lançada pela PGR não será capaz de manchar a honra e a trajetória de vida do Gen. Braga Netto", diz.

A defesa dedica 18 páginas aos argumentos da falta de acesso completo aos autos e diz ter tido contato com elementos já filtrados pela PF, e não ao material bruto. Os advogados também reclamam do modo como as provas são apresentadas, sem um padrão e de forma desorganizada, e com materiais por vezes não coincidentes.

De acordo com eles, trata-se de uma prática ilegal, conhecida como document dump, segundo a qual é despejado sobre o acusado um volume elevado de documentos sem estabelecer de maneira clara e objetiva a conexão de cada informação com cada acusação, invertendo o ônus da prova e deixando-os "afogados" em meio à "busca de uma agulha no palheiro".

Outras defesas apresentaram nesta sexta a resposta inicial à denúncia pela trama golpista. O general Estevam Theophilo defendeu que a Polícia Federal atuou de forma "viciada" e "contaminou" as provas. Ele negou que tenha apoiado conspirações golpistas e elencou dez generais como testemunhas de sua probidade.

Também apresentaram suas defesas os denunciados Silvinei Vasques, Hélio Ferreira Lima, Marília Ferreira de Alencar, Sérgio Ricardo Cavaliere, Guilherme Marques de Almeida e Wladimir Matos Soares.
Ex-ministro da Defesa e vice na chapa de Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2022, Braga Netto foi acusado pela PGR de ser um dos líderes da tentativa de golpe de Estado após o ex-presidente perder o pleito para Lula (PT).

Ele foi denunciado pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e de golpe de Estado, de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado e participação em uma organização criminosa.

As penas máximas somadas chegam a 43 anos de prisão, sem contar os agravantes. Além de Braga Netto e Bolsonaro, outras 32 pessoas foram denunciadas pelas conspirações golpistas.

O general é um dos poucos denunciados que está preso preventivamente, por decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes. Ele está detido desde 14 de dezembro de 2024 em uma sala de Estado-Maior na 1ª Divisão do Exército, no Rio de Janeiro.

A unidade militar, subordinada ao Comando Militar do Leste, já esteve sob o comando de Braga Netto de 2016 a 2019 — período que abrange a intervenção federal no Rio, durante o governo Michel Temer (MDB).

A prisão foi decretada após pedido da Polícia Federal. Segundo os investigadores, Braga Netto tentou conseguir detalhes sigilosos da delação premiada de Mauro Cid ao procurar o pai do tenente-coronel, o general Mauro Lourena Cid, em setembro de 2023.

Na representação contra Braga Netto, a PF ainda diz que o general "obteve e entregou os recursos necessários" para a execução do plano de matar Lula, Geraldo Alckmin (PSB) e Moraes.

A afirmação tem como base o depoimento prestado por Cid a Moraes. O tenente-coronel disse que Braga Netto repassou dinheiro em uma caixa de vinho ao militar Rafael de Oliveira — denunciado como um dos executores do plano frustrado de assassinato de Moraes.

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