Lula diz no Brics que Gaza virou ‘maior cemitério de crianças e mulheres do mundo’

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Presidente, que também citou o conflito entre Rússia e Ucrânia, afirmou que bloco precisa contribuir com negociações de paz


Por Bernardo Lima e Alice Cravo | O Globo — Brasília

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta quarta-feira na reunião de Cúpula do Brics que a Faixa de Gaza se tornou o "maior cemitério de crianças e mulheres do mundo". Segundo Lula, o bloco precisa atuar para evitar a escalada dessa "insensatez".

Presidente da Rússia, Vladimir Putin, assiste ao discurso do presidente Lula durante cúpula do Brics — Foto: Reprodução/Transmissão Oficial/ Brics

Em seu discurso, Lula também citou o conflito entre Rússia e Ucrânia.

— Como disse o presidente [turco, Tayyip] Erdogan na Assembleia Geral da ONU, Gaza se tornou o maior cemitério de crianças e mulheres no mundo. Essa insensatez agora se alastra para Cisjordânia e Líbano. Evitar uma escalada e iniciar negociações de paz também é crucial no conflito entre Ucrânia e Rússia — afirmou o presidente brasileiro.

Segundo Lula, os conflitos simultâneos na Europa e Oriente Médio podem culminar em uma nova guerra mundial.

— No momento em que enfrentamos duas guerras com potencial de se tornarem globais, é fundamental resgatar a nossa capacidade de trabalhar juntos em prol de objetivos comuns. Por isso o lema da presidência [do Brasil no Brics, no ano que vem] será fortalecer a cooperação do Sul Global para uma governança mais inclusiva e sustentável — completou.

Na semana passada, o Exército israelense anunciou a morte do líder do Hamas, Yahya Sinwar, apontado pelas autoridades do país como o principal idealizador do ataque de outubro do ano passado. Desde o atentado, a guerra já deixou mais de 42 mil mortos no enclave palestino e espalhou-se para o vizinho Líbano.

O líder brasileiro fez uma participação por vídeo após um acidente doméstico no sábado impedir sua viagem para Kazan, na Rússia, onde ocorre o evento. Lula conversou na terça-feira com o presidente russo Vladimir Putin.

"O presidente Putin quis saber do estado de saúde do presidente e lamentou que ele não pôde ir à Cúpula do Brics, e o presidente Lula também, devido ao acidente sofrido no sábado. E que serão feitos os arranjos para a participação dele na reunião por videoconferência", diz a nota da Presidência.

Crise climática

No Brics, Lula voltou a cobrar a responsabilidade dos países ricos pela crise climática e disse que é preciso "ir além" de promessas de apoio financeiro aos países em desenvolvimento.

— O Brics é ator incontornável no enfrentamento da mudança do clima. Não há dúvida de que a maior responsabilidade recai sobre os países ricos, cujo histórico de emissões culminou na crise climática que nos aflige hoje. É preciso ir além dos 100 bilhões (de dólares) anuais prometidos e não cumpridos e fornecer medidas de monitoramento dos compromissos assumidos.

Relações assimétricas

Em seu discurso, Lula mencionou pontos importantes da sua política internacional, ampliada principalmente através da presidência brasileira do G20, como a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza e a taxação de super-ricos. Lula também destacou a realização da COP 30 no Brasil e falou sobre a presidência brasileira do Brics, que terá o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global para uma Governança mais Inclusiva e Sustentável”.

— Na presidência brasileira dos Brics, queremos reafirmar a vocação do bloco na luta por um mundo multipolar e por relações menos assimétricas entre os países. Não podemos aceitar a imposição de "apartheids" no acesso à vacina e medicamentos como ocorreu na pandemia, nem no desenvolvimento de inteligência artificial que caminha para se tornar privilégio de poucos.

Lula também criticou a estrutura financeira mundial e afirmou que hoje acontece um "Plano Marshall" às avessas, com países em desenvolvimento financiamento países desenvolvidos. Nesse contexto, ele citou a presidência de Dilma Rousseff no Novo Banco de Desenvolvimento, ou Banco do Brics, destacando as linhas de crédito.

— O fluxo financeiro continua seguindo para as nações ricas. É um Plano Marshall às avessas, em que as economias emergentes em desenvolvimento financiam o mundo desenvolvido. [...] O novo Banco de Desenvolvimento que neste ano completa 10 anos tem investido na infraestrutura necessária para fortalecer nossas economias e promover uma transição justa e soberana. Sobre a liderança da companheira Dilma Rousseff, o NDB conta com uma carteira com quase 100 projetos com financiamento na ordem de US$ 33 bilhões.

Dependência do dólar

Lula também defendeu o avanço na criação de meios de pagamentos alternativos para transações entre países membros do Brics. A medida é uma busca de formas de os países do bloco dependerem menos do dólar nas transações comerciais e de organismos multilaterais de crédito, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.

— Agora é chegada a hora de avançar na criação de meios de pagamento alternativos para transações entre nossos países. Não se trata de substituir nossas moedas. Mas é preciso trabalhar para que a ordem multipolar que almejamos se reflita no sistema financeiro internacional. Essa discussão precisa ser enfrentada com seriedade, cautela e solidez técnica, mas não pode ser mais adiada.

Brics

Até o ano passado formado por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, desde o início deste ano o Brics aumentou para dez países. Por iniciativa da China, o bloco conta agora com Egito, Irã, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Etiópia. Há ainda pelo menos 30 outras nações interessadas em entrar para o clube.

A fala de Lula ocorreu um dia depois de o Brasil vetar, informalmente, o ingresso da Venezuela e da Nicarágua no Brics. O governo brasileiro, que teve de aceitar a imposição da China de ampliar o bloco em 2023, também deixou claro que não aceitaria o ingresso do Afeganistão, que está sob o regime do Talibã.

Acidente doméstico

No sábado, Lula sofreu uma queda no banheiro e bateu a cabeça. O médico do presidente, Roberto Kalil, afirmou que exames apontaram "mínimo ponto de hematomas" no cérebro do presidente após a queda. De acordo com Kalil, é pouco provável que esse hematoma evolua.

Após a queda, Lula foi atendido no Hospital Sírio Libanês em Brasília e precisou levar pontos no local. Com o acidente, ele cancelou a ida à Rússia onde participaria da Cúpula do Brics.

Kalil o liberou para trabalhar normalmente, porém sem atividades físicas nesta semana. Nesta segunda-feira, ele seguiu a recuperação no Palácio da Alvorada, mas recebeu ministros para reuniões.

Nesta segunda-feira, Lula afirmou que o acidente doméstico que sofreu no sábado foi "grave", mas que não afetou a parte "mais delicada" da cabeça.

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