Drones e mísseis russos continuam a violar o espaço aéreo da Otan, colocando em risco cidadãos nas regiões orientais da aliança. Especialistas propõem possíveis reações.
Alexandra von Nahmen | Deutsch Welle
Nas primeiras horas de domingo passado (08/09), dois caças F-16 romenos decolaram de uma base aérea em Borcea, uma cidade perto da fronteira com a Ucrânia. Os moradores da região foram avisados por alertas de texto.
Segundo o Ministério da Defesa da Letônia, um drone Shahed caiu na parte oriental do país no fim de semana passado © Middle East Images/picture alliance |
A resposta de emergência foi acionada depois que o sistema de vigilância por radar da Romênia rastreou um drone russo entrando no espaço aéreo da Romênia. O drone teria pairado lá por mais de 30 minutos e finalmente voltou para a Ucrânia.
Não foi o primeiro incidente desse tipo na Romênia ou, nesse caso, em território da Otan. Apenas um dia antes, um drone russo caiu perto da cidade letã de Rezekne, provavelmente vindo da vizinha Belarus.
O número de tais incidentes tem aumentado nas últimas quatro semanas, com a Rússia parecendo disposta a correr mais riscos. "Está piorando, e a Otan agora realmente precisa encontrar uma resposta", disse à DW Jamie Shea, ex-secretário-geral adjunto para desafios emergentes de segurança da Otan.
Shea, membro sênior do think tank Friends of Europe, sediado em Bruxelas, argumenta que a aliança tem "que fornecer mais proteção aos seus Estados-membros". A aliança prometeu proteger cada centímetro do território da Otan desde o início da guerra da Rússia na Ucrânia.
A Rússia está testando a Otan?
A organização condenou as recentes violações do espaço aéreo pela Rússia, chamando-as de "irresponsáveis e potencialmente perigosas".No entanto, em uma publicação na plataforma social X, o vice-secretário-geral em final de mandato, Mircea Geoana, destacou que a aliança não tem nenhuma informação "indicando um ataque intencional da Rússia contra os aliados".
Especialistas como Jan Kallberg, um membro do Center of European Policy Analysis, com sede em Washington, suspeitam que a Rússia pode estar sondando a reação da Otan e buscando encontrar discrepâncias "entre o que dizemos e o que fazemos". Eles também podem "tentar testar a capacidade de comunicação dos aliados da Otan", disse ele à DW.
A questão esteve entre os tópicos discutidos durante uma reunião a portas fechadas do Conselho do Atlântico Norte em Bruxelas esta semana. A pressão parece estar crescendo para que a Otan vá além das medidas já implementadas, incluindo o aumento da vigilância e patrulhas aéreas e a implantação de mais sistemas de defesa aérea nas regiões orientais da aliança.
A Otan deveria simplesmente abater drones russos?
Em uma entrevista recente ao jornal Financial Times, o ministro das Relações Exteriores polonês, Radek Sikorski, disse que a Polônia, assim como outros países que fazem fronteira com a Ucrânia, têm o "dever" de abater mísseis russos antes que eles entrem em seu espaço aéreo.Em novembro de 2022, dois fazendeiros morreram quando um míssil — dessa vez um míssil de defesa aérea ucraniano — causou uma explosão fora da vila de Przewodow, cerca de 8 quilômetros a oeste da fronteira ucraniana.
Como nação soberana, a Polônia certamente poderia fazer o que considerasse necessário para sua autodefesa, mas é improvável que o governo polonês vá em frente sem uma decisão coletiva da aliança. Até agora, a Otan se opôs a essa proposta, afirmando que corre o risco de a aliança se tornar parte do conflito.
"A mentalidade de escalada está limitando a capacidade dos países da Otan de ajudar a si mesmos e à Ucrânia", diz Kristine Berzina, especialista em política de segurança do German Marshall Fund, um think tank de política pública dos EUA. Ela destaca que, apesar de a Rússia proclamar "linhas vermelhas em todo o lugar", nem o apoio crescente do Ocidente à Ucrânia nem a recente incursão da Ucrânia em território russo na região de Kursk provocaram "qualquer tipo de resultado cataclísmico de forma alguma".
Zona-tampão na fronteira com a Ucrânia?
"Estender as defesas aéreas da Polônia ou da Romênia sobre o oeste da Ucrânia ajudaria a Polônia não apenas a proteger seus próprios cidadãos, mas também cidades ucranianas como Lviv", sublinha Berzina. Isso seria um efeito colateral importante e bem-vindo para a Ucrânia, já que o inverno está se aproximando, época conhecida por um rápido aumento nos ataques russos à infraestrutura energética da Ucrânia.Shea, o ex-oficial da Otan, também espera que a perspectiva de incidentes no espaço aéreo da Otan cresça à medida que a Rússia ataca mais alvos no oeste da Ucrânia.
"A verdadeira questão é: alguém tem que morrer além dos dois poloneses, e quanto a situação tem que piorar até que esse tipo de problema venha a ser tematizado?", questiona Shea.
Mas Shea observa que se a Otan decidir usar seus sistemas de defesa aérea na fronteira com a Ucrânia dentro de uma área limitada, "tem que ser suficientemente limitada" para não dar a impressão de que "esta é a introdução do Ocidente na guerra".
Ainda assim, "tem que ser operacionalmente eficaz" não apenas para interceptar drones, mas também mísseis balísticos, antes que eles possam cruzar para o território da Otan. De acordo com Shea, uma zona de 100 quilômetros em território ucraniano é provavelmente "o mínimo para lhe dar tempo adequado de reconhecimento, vigilância e interceptação".
Aliados da Otan contidos pela política interna
No final, é certamente uma decisão política. Especialistas com quem a DW conversou concordam que se a Otan quiser uma zona-tampão na fronteira com a Ucrânia, ela terá os recursos para estabelecê-la.Mas é provável que isso aconteça?
Com a próxima eleição presidencial nos EUA e a difícil política interna na França e na Alemanha, os governos parecem ter pouco apetite para tomar decisões que podem ser criticadas por levar seus países à beira da guerra com a Rússia."Enquanto os russos não estiverem deliberadamente nos atacando, faremos vista grossa", disse o ex-oficial da Otan Jamie Shea.
"Mas se houver um incidente sério em que um drone russo caia em um supermercado em um país da Otan", ele acrescenta. "Será uma história bem diferente."