O ex-diretor geral do escritório da ApexBrasil em Miami, general Mauro Lourena Cid, resistia a aceitar o resultado da eleição presidencial de 2022 vencida por Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e afirmava que ele não tomaria posse do cargo. Essa é uma das conclusões a que a auditoria interna apontou na apuração do uso da unidade para armazenar e negociar as joias recebidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que teve o resultado divulgado nesta sexta (12).
Por Guilherme Grandi | Gazeta do Povo
Ao todo, 16 pessoas foram interrogadas pela Comissão Extraordinária designada em abril deste ano para apurar as irregularidades que levaram ao indiciamento de Bolsonaro e outras 11 pessoas na semana passada, por peculato, lavagem de dinheiro e associação criminosa. O resultado da apuração será enviado à Polícia Federal, ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Tribunal de Contas da União (TCU).
General Lourena Cid dizia a funcionários do escritório de Miami que Lula não tomaria posse, mesmo após eleito.| Foto: Roberto Oliveira/Alesp |
De acordo com a ApexBrasil, Lourena Cid teve um “comportamento desviante” das atividades que lhes foram atribuídas e uma “resistência explícita ao resultado eleitoral”. O órgão aponta, ainda, que ele levou dois assessores dele no escritório a uma visita ao acampamento montado na época em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília.
“O general Lourena Cid manifestava repetidamente aos funcionários sua convicção de que, mesmo depois de eleito, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tomaria posse e de que ele, Cid, continuaria em seu cargo à frente do EA [escritório de Miami]”, diz a síntese do relatório da ApexBrasil a que a Gazeta do Povo teve acesso. A reportagem procurou a defesa dele e aguarda retorno.
A comissão da ApexBrasil afirma no relatório que essa expectativa de Lourena Cid “pode ser lida a partir da ruptura institucional que, na ocasião, articulava-se em setores militares e que culminou na tentativa golpista de 8 de janeiro de 2023”.
Segundo a apuração, o general esteve no acampamento de Brasília no dia 3 de dezembro de 2022 acompanhado de dois funcionários do escritório de Miami, e que foram destacados para prestar serviços pessoais a ele “inclusive na residência na cidade, em claro desvio de função”.
“O desvio de função e a presença em local onde se articulava um movimento golpista, esses funcionários também feriram normativos da Apex, como o Código de Ética, que consagra os princípios de impessoalidade, moralidade e legalidade como pilares”, diz a nota da agência.
Um deles já foi demitido da ApexBrasil, já o outro não teve a atual condição trabalhista divulgada.
A apuração da agência apontou que Lourena Cid utilizou o escritório para armazenar e negociar as joias recebidas de presente pelo ex-presidente mesmo após ter sido exonerado, no dia 3 de janeiro de 2023. Ele manteve o crachá de acesso ao prédio por mais 6 dias e resistiu a devolver o celular e o notebook corporativo – que foram usados para fotografar e armazenar as imagens das mercadorias.
De acordo com a investigação da Polícia Federal, o general foi o operador do esquema nos Estados Unidos. Ele ainda recebeu no gabinete o corretor de imóveis Cristiano Piquet, que confessou à Polícia Federal que transportou uma mala de joias de Bolsonaro de Orlando para Miami, durante a viagem do ex-presidente aos Estados Unidos a partir do dia 30 de dezembro de 2022 – dois dias antes da posse de Lula.
A ApexBrasil também aponta que Lourena Cid tinha um “comportamento desviante” em relação às suas atribuições como diretor do escritório, com “baixo perfil” e “afastamento das atividades de negócios”.
“Jamais fez proposições voltadas à exportação ou captação de investimentos. Não solicitou relatórios, tampouco avaliou resultados. Segundo relatos unânimes, o general aprovava todas as propostas levadas a ele, sem aprofundar conteúdos, sugestões ou reparos”, pontua a nota.
À reportagem, a ApexBrasil afirmou ainda que fez uma intervenção no escritório de Miami e que “prossegue na apuração e no exame de desdobramentos, desvios e eventuais irregularidades relacionados ao escritório”. “Novas providências poderão ser tomadas após a continuidade do processo de apuração e responsabilização, inclusive o desligamento de colaboradores”, completou.