Ex-presidente dos tribunais internacionais para a ex-Iugoslávia e Ruanda, o juiz israelense-americano Theodor Meron integrou o comitê de especialistas convidados pelo promotor Karin Khan.
Por Sandra Cohen | g1
Entre os seis especialistas que ajudaram o procurador-chefe do Tribunal Penal Internacional (TPI), Karim Khan, a formular a acusação de crimes de guerra e pedir a prisão do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, de seu ministro da Defesa e de três dirigentes do Hamas está um sobrevivente do Holocausto: o juiz israelense-americano Theodor Meron, de 94 anos, uma das maiores autoridades em direito internacional humanitário.
Nascido em Kalisz, na Polônia, ele passou parte da infância e da adolescência em guetos e um campo de trabalhos forçados nazista. Perdeu a maior parte de sua família na Segunda Guerra Mundial. Meron sobreviveu e cresceu em Israel, onde estudou e trabalhou para o governo, como diplomata, consultor do Ministério das Relações Exteriores e enviado para a ONU.
Foi um dos primeiros especialistas a alertar contra a construção de colonatos nos territórios conquistados por Israel na Guerra dos Seis Dias. Num memorando ultrassecreto redigido logo após a guerra e revelado quatro décadas depois pelo escritor Gershon Gorenberg no livro “Israel e o nascimento dos assentamentos”, o então consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores, afirmou:
“A minha conclusão é que a colonização civil nos territórios administrados contraria as disposições explícitas da Quarta Convenção de Genebra.”
A convenção estabelece que uma potência ocupante não deve transferir os seus civis para o território que ocupa. “Se for decidido avançar com o assentamento judaico nos territórios administrados, parece-me vital, portanto, que o assentamento seja realizado por entidades militares e não civis”, advertiu Meron, há mais de meio século. Não foi ouvido.
Em 2001, como cidadão americano, Theodor Meron foi nomeado juiz do TPI para a ex-Iugoslávia, presidido por ele mais tarde. Serviu também no TPI para Ruanda e, ao todo, cumpriu sete mandados como presidente dos tribunais de guerra da ONU.
No sistema judiciário ou nos bancos acadêmicos de universidades prestigiadas como Hebraica, Harvard e Cambridge, grande parte de sua carreira foi dedicada a não permitir que genocídios, como o do Holocausto, se repetissem.
“Tentei trabalhar em áreas que pudessem contribuir para tornar as atrocidades impossíveis e evitar o caos terrível, o desamparo e a perda de autonomia, dos quais eu me lembrava tão bem”, declarou Meron.
Em artigo publicado esta semana pelo jornal britânico “Financial Times”, os seis especialistas em direito internacional convidados pelo procurador Karim Khan explicaram por que apoiam os processos do TPI em Israel e Gaza. Além de Netanyahu e o ministro Yoav Gallant, Khan busca mandados de prisão também para três dirigentes do Hamas: Yahya Sinwar, Mohammed Deif e Ismail Haniyeh.
Meron e os outros juristas ressaltam, no texto, que as acusações contra os cinco, por crimes de guerra e contra a humanidade, não têm a ver com as razões do conflito entre Israel e os palestinos. E que os pedidos de prisão são apenas um primeiro passo e um marco na história do direito internacional.
“Não há conflito que deva ser excluído do alcance da lei; a vida de nenhuma criança é menos valorizada do que a de outra. A lei que aplicamos é a lei da humanidade, não a lei de qualquer lado. Deve proteger todas as vítimas deste conflito; e todos os civis em conflitos que estão por vir”, justificam.