Almirante Maximiano Fonseca foi ministro da Marinha no governo Figueiredo. Universidade reconheceu contribuições de militar, mas mencionou atuação de almirante em 'graves violações dos direitos humanos'. Empresários protestaram contra FURG.
Por Gustavo Chagas | g1 RS
O comandante da Marinha, almirante Marcos Sampaio Olsen, enviou uma carta à Universidade Federal do Rio Grande (FURG) criticando a cassação do título de doutor honoris causa concedido a Maximiano Eduardo da Silva Fonseca. O almirante, que morreu em 1998, foi ministro da Marinha durante a ditadura militar, no governo de João Figueiredo, entre 1979 e 1984.
Almirante Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, ministro da Marinha entre 1979 e 1984 — Foto: Sociedade Amigos da Marinha/Divulgação |
Na carta endereçada ao reitor da FURG, Olsen manifesta "profundo desagrado" à medida e ressalta que Maximiano foi o "idealizador do mais longevo programa estratégico de pesquisa do Brasil, o Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR)".
"Insisto em apresentar os protestos de indignação da Marinha do Brasil com a cassação do referido titulo", disse Olsen.
O comandante da Marinha ainda afirma que o antigo ministro foi um homem "honrado" e "progressista".
O reitor da FURG, Danilo Giroldo, respondeu a Olsen com um documento de três páginas, no qual explica o que motivou a decisão do Conselho Universitário da instituição. O educador reconheceu a "complexidade" do assunto, afirmando que Maximiano foi "uma pessoa com inquestionáveis e grandiosas contribuições ao nosso país".
No entanto, o reitor explica que Maximiano foi implicado "no cometimento de graves violações dos direitos humanos", citando "o uso do navio hidrooceanográfico Canopus como prisão ilegal".
Apesar dos questionamentos da Marinha, a FURG manteve a cassação do título concedido a Maximiano em 1984. A universidade disse estar à disposição para receber documentos que afastem a responsabilidade de Maximiano no caso do navio-prisão para debater o tema novamente.
"Lamentamos profundamente os transtornos causados por esta decisão da instância máxima deliberativa da FURG, ou por qualquer falha de comunicação ou manifestação indevida da nossa parte e reiteramos que esta decisão em nada fere os atos muito significativos e relevantes praticados pelo Almirante Maximiano. Da mesma forma, este ato não visou em absoluto promover afronta institucional à Marinha do Brasil, uma vez que a FURG preza muito pela frutífera e longa trajetória de cooperação institucional, sempre pautada pelo respeito e pela cooperação em prol do conhecimento e uso sustentável do mar brasileiro e zonas de transição, assim como o fortalecimento da mentalidade marítima nacional", respondeu o reitor.
A medida da FURG provocou reação entre empresários. A Aliança Rio Grande, entidade que reúne representantes de diversos segmentos empresariais no município, afirmou que a universidade "tem se notado por posições profundamente ideologizadas, acaba de protagonizar um dos maiores relativismos de sua história".
A reitoria da FURG manifestou "indignação" com a nota dos empresários, dizendo que o posicionamento da entidade é "carente de fundamento" e "evidencia um profundo desrespeito com a nossa universidade".
"O mais grave é atribuir à defesa dos direitos humanos a uma ou outra posição ideológica, quando todo o processo de avanço civilizatório está a eles relacionados. (...) É lamentável que esse tipo de argumento ainda permeie o posicionamento de lideranças empresariais da nossa cidade", respondeu a FURG.
A Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) de Rio Grande também protestou. "A CDL reitera seu pedido de reconsideração da FURG por entender que a melhor maneira de construir um novo futuro não é apagando o passado e sim, aprendendo com ele. Portanto, que o Conselho Universitário possa rever sua posição e possamos seguir para a retomada de uma pauta que verdadeiramente importa: a pesquisa, o ensino, a extensão, a geração de emprego, renda e novas tecnologias", disse em nota.
Outra entidade a se manifestar foi o Clube Naval, agremiação que reúne oficiais da Marinha, presidida pelo filho de Maximiano, Luiz Fernando Palmer Fonseca, até 2023.
"Vislumbrando essa singela panorâmica dos empreendimentos desenvolvidos por esse brilhante brasileiro, causa indignação, para os integrantes do Clube Naval, a cassação do título de Doutor Honoris Causa outorgado por essa instituição, sendo motivo para repulsa, pois desconsidera o muito que tão renomado Marinheiro fez pela Ciência no Brasil", disse a entidade.
Maximiano Eduardo da Silva Fonseca nasceu no Rio de Janeiro, em 1919. O militar ingressou na Marinha no final dos anos 1930.
Na década de 1960, ele comandou o navio Canopus, que fez o levantamento da costa sul. Em abril de 1964, logo após o golpe militar, a embarcação manteve 19 prisioneiros em Rio Grande.
Como almirante de esquadra, assumiu o Ministério da Marinha em 1979. Maximiano foi responsável por Operações Antárticas na década de 1980, com a aquisição de um navio polar, com a realização de uma expedição ao continente e na instalação de uma base na Ilha Rei George.
Maximiano morreu em 1998, no Rio de Janeiro. Hoje, o almirante batiza um navio polar de 93,4 metros de comprimento e capacidade para 113 pessoas.
Além do almirante Maximiano, a FURG cassou os títulos de doutor honoris causa concedidos ao então presidente Emílio Garrastazu Médici, que governou o país entre 1969 e 1974, e a Golbery do Couto e Silva, chefe do Serviço Nacional de Informações de 1964 a 1967 e ministro da Casa Civil de 1974 a 1981.
O movimento é semelhante em outras instituições federais no estado. Em 2022, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) cassou os títulos de doutor honoris causa concedidos aos ditadores Médici e Arthur da Costa e Silva.
Este ano, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) cassou os títulos concedidos ao ex-presidente Emílio Garrastazu Médici e ao ex-ministro da Educação Jarbas Passarinho. Além disso, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) revogasse os títulos "honoris causa" dados a Costa e Silva e Humberto de Alencar Castello Branco.
O comandante da Marinha ainda afirma que o antigo ministro foi um homem "honrado" e "progressista".
Resposta da FURG
O reitor da FURG, Danilo Giroldo, respondeu a Olsen com um documento de três páginas, no qual explica o que motivou a decisão do Conselho Universitário da instituição. O educador reconheceu a "complexidade" do assunto, afirmando que Maximiano foi "uma pessoa com inquestionáveis e grandiosas contribuições ao nosso país".
No entanto, o reitor explica que Maximiano foi implicado "no cometimento de graves violações dos direitos humanos", citando "o uso do navio hidrooceanográfico Canopus como prisão ilegal".
Apesar dos questionamentos da Marinha, a FURG manteve a cassação do título concedido a Maximiano em 1984. A universidade disse estar à disposição para receber documentos que afastem a responsabilidade de Maximiano no caso do navio-prisão para debater o tema novamente.
"Lamentamos profundamente os transtornos causados por esta decisão da instância máxima deliberativa da FURG, ou por qualquer falha de comunicação ou manifestação indevida da nossa parte e reiteramos que esta decisão em nada fere os atos muito significativos e relevantes praticados pelo Almirante Maximiano. Da mesma forma, este ato não visou em absoluto promover afronta institucional à Marinha do Brasil, uma vez que a FURG preza muito pela frutífera e longa trajetória de cooperação institucional, sempre pautada pelo respeito e pela cooperação em prol do conhecimento e uso sustentável do mar brasileiro e zonas de transição, assim como o fortalecimento da mentalidade marítima nacional", respondeu o reitor.
Polêmica com entidades
A medida da FURG provocou reação entre empresários. A Aliança Rio Grande, entidade que reúne representantes de diversos segmentos empresariais no município, afirmou que a universidade "tem se notado por posições profundamente ideologizadas, acaba de protagonizar um dos maiores relativismos de sua história".
A reitoria da FURG manifestou "indignação" com a nota dos empresários, dizendo que o posicionamento da entidade é "carente de fundamento" e "evidencia um profundo desrespeito com a nossa universidade".
"O mais grave é atribuir à defesa dos direitos humanos a uma ou outra posição ideológica, quando todo o processo de avanço civilizatório está a eles relacionados. (...) É lamentável que esse tipo de argumento ainda permeie o posicionamento de lideranças empresariais da nossa cidade", respondeu a FURG.
A Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) de Rio Grande também protestou. "A CDL reitera seu pedido de reconsideração da FURG por entender que a melhor maneira de construir um novo futuro não é apagando o passado e sim, aprendendo com ele. Portanto, que o Conselho Universitário possa rever sua posição e possamos seguir para a retomada de uma pauta que verdadeiramente importa: a pesquisa, o ensino, a extensão, a geração de emprego, renda e novas tecnologias", disse em nota.
Outra entidade a se manifestar foi o Clube Naval, agremiação que reúne oficiais da Marinha, presidida pelo filho de Maximiano, Luiz Fernando Palmer Fonseca, até 2023.
"Vislumbrando essa singela panorâmica dos empreendimentos desenvolvidos por esse brilhante brasileiro, causa indignação, para os integrantes do Clube Naval, a cassação do título de Doutor Honoris Causa outorgado por essa instituição, sendo motivo para repulsa, pois desconsidera o muito que tão renomado Marinheiro fez pela Ciência no Brasil", disse a entidade.
Quem foi o almirante Maximiano
Maximiano Eduardo da Silva Fonseca nasceu no Rio de Janeiro, em 1919. O militar ingressou na Marinha no final dos anos 1930.
Na década de 1960, ele comandou o navio Canopus, que fez o levantamento da costa sul. Em abril de 1964, logo após o golpe militar, a embarcação manteve 19 prisioneiros em Rio Grande.
Como almirante de esquadra, assumiu o Ministério da Marinha em 1979. Maximiano foi responsável por Operações Antárticas na década de 1980, com a aquisição de um navio polar, com a realização de uma expedição ao continente e na instalação de uma base na Ilha Rei George.
Maximiano morreu em 1998, no Rio de Janeiro. Hoje, o almirante batiza um navio polar de 93,4 metros de comprimento e capacidade para 113 pessoas.
Outras cassações
Além do almirante Maximiano, a FURG cassou os títulos de doutor honoris causa concedidos ao então presidente Emílio Garrastazu Médici, que governou o país entre 1969 e 1974, e a Golbery do Couto e Silva, chefe do Serviço Nacional de Informações de 1964 a 1967 e ministro da Casa Civil de 1974 a 1981.
O movimento é semelhante em outras instituições federais no estado. Em 2022, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) cassou os títulos de doutor honoris causa concedidos aos ditadores Médici e Arthur da Costa e Silva.
Este ano, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) cassou os títulos concedidos ao ex-presidente Emílio Garrastazu Médici e ao ex-ministro da Educação Jarbas Passarinho. Além disso, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) revogasse os títulos "honoris causa" dados a Costa e Silva e Humberto de Alencar Castello Branco.