Forças israelenses se retiraram do Hospital al-Shifa, após invadi-lo há duas semanas, deixando o maior complexo de saúde da Faixa de Gaza em total estado de destruição, com estruturas carbonizadas e alas vandalizadas.
Monitor do Oriente Médio
O exército israelense retirou-se do Hospital al-Shifa, maior centro de saúde da Faixa de Gaza, na cidade homônima, no centro do território, na manhã desta segunda-feira (1°), deixando destruição extensa e diversas baixas no local e em seus arredores.
As informações são da agência de notícias Anadolu.
O exército seguiu caminho ao bairro de Tel al-Hawa, a sudoeste da Cidade de Gaza, segundo testemunhas.
Soldados da ocupação israelense deixaram para trás alas inteiras incendiadas, incluindo prédio de cirurgias especializadas, a recepção principal e o pronto-socorro. As ações incorreram na completa cessação dos serviços. Refugiados, contudo, sem ter para onde ir, voltaram às ruínas após a retirada das tropas.
Os setores de tratamento renal, oncologia, maternidade e cuidados contra queimaduras foram destruídos, além do necrotério e de uma clínica para pacientes prestes a receber alta.
Segundo fontes, o hospital está completamente fora de serviço, após o exército ocupante destruir equipamentos médicos, salas de operação e unidades de terapia intensiva.
O cemitério improvisado em al-Shifa, no qual palestinos buscavam sepultar seus mortos diante da escala do genocídio israelense, foi destruído e exumado. Há relatos de diversos corpos no hospital e nas ruas ao redor — entre os mortos da operação recente e outras.
Casas e prédios civis adjacentes ao hospital também foram destruídos e incendiados.
A ocupação invadiu al-Shifa, que abrigava milhares de pacientes e refugiados, às 2h00 da manhã de 18 de março, mantendo hostilidades por duas semanas, sob o pretexto de combater supostos militantes do grupo palestino Hamas que se “reagruparam” no local.
Treze pacientes da unidade de terapia intensiva (UTI) foram mortos, seja por disparos diretos ou ao privá-los de oxigênio, remédios ou alimentação. Estima-se de 250 mortos, além de numerosos detidos, incluindo profissionais de saúde, pacientes e refugiados.
É o segundo ataque a al-Shifa, após a instalação sofrer uma primeira ofensiva em novembro, sob as mesmas alegações. Contudo, sem provas sequer após a operação.
Propaganda de guerra e violações
Israel caracterizou seu mais recente massacre em al-Shifa como uma das ações mais bem-sucedidas de sua ofensiva a Gaza, ao supostamente matar militantes do Hamas. Um porta-voz disse que 900 “suspeitos” foram presos, além de armas e recursos.
O exército israelense insistiu que a invasão foi conduzida “ao evitar danos a civis, pacientes e equipes médicas” — informação desmentida por testemunhos em campo, cobertura de imprensa e relatórios de agências independentes sobre a matéria.
Mohammad Sukkar, voluntário de 27 anos, deixou al-Shifa ao Hospital dos Mártires de Al-Aqsa, em Deir el-Balah, um pouco mais ao sul, ferido e sem roupas, dias após o exército israelense detê-lo, humilhá-lo e torturá-lo, junto de outras dezenas de pessoas.
“De madrugada … começaram disparos intensos enquanto tanques avançavam ao hospital”, relembrou Sukkar. “Não sabíamos o que estava acontecendo. Com alto-falantes, nos mandaram não sair do hospital e não se mover de maneira alguma”.
“Não tínhamos comida ou água. Estamos famintos e apavorados. Tudo que ouvíamos eram os estrondos, os disparos e o fogo por toda a parte”, acrescentou.
Conforme o cerco, a fome e a sede se estenderam, algumas pessoas decidiram sair. “Homens, mulheres, crianças e idosos — todos com bandeiras brancas, caminhando devagar. Então, abriram fogo, nos forçaram a implorar por salvo-conduto. Insistiram que voltássemos e pouco depois ordenaram os homens a fazer fila e as mulheres a irem ao sul”.
Segundo o testemunho, os homens foram então despidos, algemados e vendados. “Por quatro dias, ficamos acorrentados no pátio, sem comida ou água. Se pedíamos qualquer coisa, gritavam, chutavam e cuspiam em nós”.
Eventualmente, foram soltos — sem roupas ou pertences — e forçados a fugir ao sul.
‘Não há vida aqui’
Segundo Ismail al-Ghoul, correspondente da Al Jazeera em al-Shifa, famílias desabrigadas tentam ainda salvar o que podem. Contudo, observou: “Não há vida aqui. O complexo está em ruínas e não pode ser recuperado”.
“Prédos em todos os departamentos foram incendiados e a estrutura do hospital foi danificada por dentro”, acrescentou al-Ghoul. “Pelo que podemos ver, parece que a ocupação alvejou deliberadamente o setor de saúde para destruir de vez o maior hospital de Gaza”.
Testemunhos coletados pelo Monitor de Direitos Humanos Euromediterrâneo, ong radicada em Genebra, registraram diversos relatos da execução “a sangue frio” de ao menos 13 crianças palestinas por forças israelenses durante a invasão a al-Shifa.
Entre as vítimas, estão crianças de 4 a 16 anos de idade, mortas em frente a suas famílias.
Segundo o Monitor Euromediterrâneo, algumas das vítimas foram cercadas por soldados dentro de suas casas ou abrigos, então fuziladas. Outras foram assassinadas em rotas de fuga caracterizadas por Israel como “seguras” à evacuação civil.
Organizações internacionais, incluindo agências das Nações Unidas e o Conselho de Segurança, pedem um cessar-fogo imediato em Gaza, incluindo acesso humanitário. Todavia, sem a anuência de Israel. Segundo a Agência das Nações Unidas para a Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), a fome “está por toda a parte”.
Israel mantém ataques indiscriminados a Gaza desde 7 de outubro, deixando 32.490 mortos e 74.889 feridos, além de oito mil desaparecidos e dois milhões de desabrigados. Entre as fatalidades, são 13 mil crianças e quase nove mil mulheres.
Escolas, hospitais, abrigos e mesmo rotas de fuga não foram poupados.
Apesar de uma ordem do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), em Haia, emitida em 26 de janeiro, Israel mantém um cerco militar absoluto aos 2,4 milhões de palestinos em Gaza — sem comida, água, medicamentos, energia elétrica ou combustível.
As ações israelenses são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.