No depoimento que se arrastou por nove horas, na segunda, 11, ex-ajudante de ordens detalhou que durante um encontro o ex-presidente recebeu de seu então assessor Filipe Martins o rascunho de uma minuta de decreto golpista
Por Pepita Ortega | O Estado de S.Paulo
No longo depoimento à Polícia Federal, prestado nesta última segunda, 11, o ex-ajudante de ordens da Presidência, tenente-coronel do Exército Mauro Cid, delator, confirmou detalhes de uma série de encontros com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro e da cúpula de seu governo para debaterem um plano de golpe de Estado. O militar afirmou não ter participado da discussão entre Bolsonaro e o alto escalão das Forças Armadas sobre o mesmo tema. O relato de Mauro Cid durou cerca de nove horas.
Mauro Cid afirma que Bolsonaro "mexeu" no rascunho de decreto golpista. Foto: Reprodução/Processo judicial Foto: Reprodução/Processo judicial |
Ele declarou à PF que em uma reunião o ex-presidente recebeu de seu então assessor Filipe Martins o rascunho de uma minuta de decreto golpista. Detalhou encontro com o comando das Forças Armadas para uma ‘sondagem’ de apoio ao eventual golpe.
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro também foi questionado sobre a reunião de 5 de julho de 2022, na qual o ex-presidente disse que ‘o plano B tem que pôr em prática agora’. O vídeo do encontro foi resgatado pelos investigadores no computador de Mauro Cid.
Ele reiterou detalhes de sua delação premiada, que abrange informações de interesse dos inquéritos sobre as joias sauditas, a suposta fraude na carteira de vacinação do ex-presidente e o plano de golpe de Estado.
A oitiva foi considerada uma espécie de ‘chaveamento’ dos relatos de Cid. Ela seria dividida em dois dias, mas a pedido da defesa, o depoimento foi todo concentrado na segunda, 11, e por isso se estendeu até por volta de meia noite.
O militar conversou com os investigadores após o ex-comandante do Exército, general Marco Antônio Freire Gomes, confirmar a participação em reuniões em que foi debatida a ‘minuta do golpe’. Freire Gomes foi chamado a depor por causa de mensagens trocadas com Mauro Cid, as quais colocam Bolsonaro no centro da suposta trama golpista sob investigação da PF.
Cid já havia relatado à PF que apenas o então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, teria aderido à proposta de Bolsonaro. Freire Gomes, então comandante do Exército, repudiou com veemência o movimento e o comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior, também não acolheu a proposta. Baptista Júnior foi enfático e advertiu que não abriria mão de sua posição legalista.
A oposição de Freire Gomes e de Baptista Júnior à trama levou o general Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa, a classificar o ex-chefe do Exército de ‘cagão’ em mensagem pelo WatsApp - interceptada pela PF - endereçada ao capitão reformado do Exército Ailton Gonçalves Moraes Barros, também investigado.
Braga Netto afirmou que a ‘culpa pelo que está acontecendo e acontecerá é do general Freire Gomes’ e que a ‘omissão e indecisão não cabem a um combatente’.