Nesta semana, o presidente da França, Emmanuel Macron, voltou a chamar a atenção sobre a ameaça de expansão para o oeste da guerra da Rússia contra a Ucrânia. Nas bancas, as revistas semanais francesas verificam em que estado se encontra a preparação militar da França, da União Europeia e da aliança atlântica (Otan) para um eventual enfrentamento com Moscou.
RFI
“Estamos prontos?”, questiona a Le Point na capa. Em 25 páginas, a revista investiga a capacidade de defesa e ataque da França isoladamente, mas também no contexto das suas alianças militares.
O presidente francês, Emmanuel Macron, deixa base naval de Cherbourg, Normandia, após discursar para o Exército. (19/01/2024) AP - Christophe Petit-Tesson |
A reportagem explica que, desde a queda do muro de Berlim, a França apostou “na convicção, então fundamentada, de que não existia mais ameaça existencial sobre a população”. Ao longo dos anos, essa escolha conduziu as Forças Armadas francesas a estarem defasadas – em orçamento como em tecnologia, frisa o texto. O sistema, “concebido para a gestão de crises e não para um conflito de alta intensidade, caducou”, diz Le Point.
“A invasão da Ucrânia pela Rússia marca a abertura do grande confronto entre os impérios autoritários e as democracias, e ele começa no nosso continente”, salienta uma das reportagens. Se, por um lado, o arsenal da Otan é incomparavelmente superior ao russo, mostram os números, uma aliança entre Moscou e Pequim daria lugar a um conflito devastador – e sem contar o apoio de outros países como Coreia do Norte e Turquia, aliados da Rússia.
Ameaça de Trump para futuro da Europa
E é neste aspecto que a possível eleição de Donald Trump nos Estados Unidos é arriscada, e poderia marcar “a transformação dos Estados Unidos em uma democracia não-liberal, o desaparecimento da Otan e até a negociação com Vladimir Putin de um novo Yalta para partilhar a Europa”, destaca a revista, em referência à conferência realizada entre as potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial, em 1945.
Enquanto isso, a mobilização de uma economia de guerra da União Europeia, por meio da indústria bélica, está longe de ser um consenso entre os países, constata a Le Point, mas também a concorrente L’Obs. “Na Europa, quantas divisões?”, pergunta a publicação, em um jogo de palavras com o linguajar militar.
“As incertezas de Washington obrigam os aliados europeus a reforçar o seu apoio a Kiev contra a Rússia, mas eles permanecem paralisados por desacordos estratégicos e uma indústria de defesa balbuciante”, salienta L'Obs.
Economia de guerra
A revista avalia que “se tem uma coisa que Emmanuel Macron sabe fazer bem é falar demais”. Assim, seus comentários sobre a possibilidade de envio de soldados para ajudar Kiev “tiveram o mérito de deixar claro quanto há divergências entre os aliados europeus” sobre qual deve ser o apoio do bloco para a Ucrânia enfrentar a invasão russa.
Na visão de François Heinsbourg, conselheiro especial da Fundação de Pesquisas Estratégicas entrevistado pela publicação, esta é a forma mais eficaz de tentar evitar a ampliação do conflito para dentro das fronteiras do bloco. “A Europa tinha que não apenas manter a ajuda a Ucrânia, mas dobrá-la”, alegou o consultor em Defesa.
Só que a Alemanha, que por três décadas apostou toda a sua segurança na solidez da Otan, agora não parece disposta a ver a França querer ditar os rumos da "economia de guerra” defendida por Paris, caso a aliança militar desabe nos próximos anos. “Para a Alemanha, é todo sistema de pensamento que desmorona”, disse o especialista, à L'Obs.