Ao atacar mais uma vez o sul da Faixa de Gaza nesta quinta-feira (15), incluindo as instalações de um hospital, Israel prometeu realizar uma operação terrestre “poderosa” na cidade superlotada de Rafah. Apesar da crescente pressão internacional, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, quer destruir o "último bastião" do movimento islâmico nesta localidade fronteiriça com o Egito e que se tornou, também, o último refúgio para centenas de milhares de civis que fogem da guerra.
Maria Paula Carvalho | RFI
Nas últimas 24 horas, o número de mortos chegou a 87 no enclave palestino, segundo as autoridades de saúde do grupo islâmico palestino. Após mais de quatro meses de conflito armado contra o Hamas no território sitiado, Israel mantém seus planos de um ataque, enquanto países mediadores negociam no Cairo em busca de uma trégua, incluindo novas libertações de reféns e palestinos detidos.
Uma mulher palestina segura sua filha ferida enquanto elas andam em uma carroça até uma clínica em Rafah, sul da Faixa de Gaza, em 12 de fevereiro de 2024. © Mohammed Abed / AFP |
As conversas são mediadas pelo Catar, Egito e Estados Unidos. Em todo o mundo, multiplicam-se os apelos sobre as consequências potencialmente devastadoras de uma grande operação militar israelense.
"Todos nós acompanhamos as notícias sobre uma possível operação militar em Rafah. Eu conheço a cidade, que habitualmente tinha cerca de 23.000 habitantes e hoje está superlotada com 1.5 milhão de pessoas, aglomeradas num lugar pequeno, em abrigos improvisados", relata à RFI Rik Peeperkorn, representante da Organização Mundial da Saúde (OMS) na região. "Você vê o medo nos olhos das pessoas. Operações militares num lugar povoado assim seria uma catástrofe, um desastre acima da imaginação", alerta.
O principal hospital da região, o hospital Nasser em Khan Younis, foi palco de mais uma noite de terror com ataques e tiroteios dentro e ao redor do estabelecimento que deixaram um morto e vários feridos. Essa instituição é a espinha dorsal do sistema de saúde no sul de Gaza, de acordo com a OMS, que acusa Israel de dificultar a ajuda internacional a um sistema de saúde à beira da implosão.
Os médicos desse hospital consideraram a situação desesperadora. Eles contam que a maioria dos deslocados obedeceu à ordem de evacuação do Exército de Israel e "não tem para onde ir”, numa “paisagem apocalíptica”. As equipes da Organização Médicos Sem Fronteiras, que ainda atuam no hospital atacado, dizem que os bombardeios “fazem parte da vida quotidiana”.
De acordo com a ONU, cerca de 1,4 milhão de pessoas, o que significa mais de metade da população de Gaza, estão agora em Rafah. Muitas delas já se mudaram várias vezes. Os deslocados da guerra transformaram a cidade em um acampamento gigantesco, onde reina o medo de uma grande ofensiva israelense.
“Meu marido e meu filho Mohammad partiram na quarta-feira com milhares de pessoas, mas não sei o que aconteceu com eles, perdemos contato”, disse à AFP Jamila Zidane, deslocada no hospital Nasser.
“Temos medo”, confidenciou outra mulher de 43 anos, internada no hospital com as seis filhas. “Há vários dias que não comemos e bebemos água suja”, deplora.
"Vitória completa"
Nesta quinta-feira, Austrália, Canadá e Nova Zelândia alertaram Israel contra uma operação militar potencialmente “catastrófica” em Rafah. “Simplesmente não há para onde fugir”, sublinharam esses três países em relação à situação dos civis confinados na fronteira fechada com o Egito. A ONU e os Estados Unidos haviam feito um alerta semelhante, com os americanos, principais aliados de Israel, exigindo “garantias” para a segurança dos civis na Faixa de Gaza.
Na quarta-feira (14), Benjamin Netanyahu deixou claro: “lutaremos até a vitória completa, o que implica uma ação poderosa em Rafah e isto depois de permitir a saída da população civil das zonas de combate”, declarou o primeiro-ministro israelense.
O Exército confirmou nesta quinta-feira “continuar os ataques direcionados” em Khan Younis, acrescentando que a força aérea realizou “uma série de ataques” em apoio às tropas terrestres em todo o território, que atingiram “instalações subterrâneas, bases militares do Hamas e postos de tiro”.
Rafah também é uma porta de entrada da ajuda humanitária com o Egito, controlada por Israel, por onde entram carregamentos insuficientes para satisfazer as necessidades de uma população ameaçada pela fome e pelas epidemias.