Prestes a entrar no terceiro ano de guerra, o Exército ucraniano, exausto após a sua contraofensiva fracassada em 2023, está mais uma vez na defensiva face a um front estagnado e aos ataques das tropas russas, mais numerosas e melhor armadas.
France Presse
Duas semanas antes do segundo aniversário do início da invasão russa, em 24 de fevereiro, o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, substituiu o comandante-em-chefe das suas Forças Armadas, Valeri Zaluzhni, pelo general Oleksander Sirski.
Um veículo blindado russo em chamas durante combates com as forças armadas ucranianas em Kharkiv, 27 de fevereiro de 2022 © Sergey BOBOK |
Ciente de que a situação poderia tornar-se crítica, Zelensky confiou-lhe a reconstrução das suas legiões para eventualmente libertar as regiões sob controle russo e não perder outras enquanto isso.
"A hora da renovação é agora", disse Zelensky, que pediu ao seu novo comandante-em-chefe "um plano de ação realista e detalhado" para 2024 com a ambição de recuperar 20% do território ucraniano ocupado.
"2024 não pode ser um sucesso para a Ucrânia a menos que haja mudanças", acrescentou.
- Exaustos -
Mas no front, a chuva e a neve do inverno desgastam o físico e a moral das tropas.
"Os meninos estão muito cansados. Moralmente, fisicamente, eles não aguentam mais. Porque depois de dois anos, não vimos o fim do túnel", disse à AFP em janeiro um soldado perto de Kupiansk, no nordeste, uma das áreas atacadas incansavelmente pelos russos durante meses.
No final de 2022, a moral foi reforçadas por ofensivas bem-sucedidas em Kharkiv, no nordeste, e em Kherson, no sul. Mas 2023 e o início de 2024 foram marcados por uma série de contratempos.
A cidade de Bakhmut caiu nas mãos dos russos em maio, após meses de batalha sangrenta. Posteriormente, a contraofensiva de verão de Kiev permitiu somente a recuperação de algumas cidades às custas de enormes perdas.
As tropas ucranianas encontraram uma sólida defesa do Exército russo, que agora parte para a ofensiva com ataques constantes, especialmente em Avdiivka, no front oriental.
- Símbolo de resistência -
Esta cidade da classe trabalhadora tornou-se um novo símbolo da resistência ucraniana.
Desde outubro, as forças russas têm atacado e bombardeado massivamente a cidade onde, no meio de uma destruição generalizada, ainda vivem cerca de 900 civis dos 30 mil de antes da guerra.
O cerco russo está se apertando e a retirada não está descartada. O prefeito, Vitali Barabash, falou recentemente de uma situação "crítica" em alguns bairros e admitiu que os combates chegaram às ruas.
Já em novembro, o Exército russo enviava os seus homens "em ondas", sofrendo perdas massivas, com "campos cobertos de cadáveres" descritos pelos soldados que defendiam a cidade, para onde a AFP se deslocou naquele momento.
A única boa notícia nos últimos meses foi a situação no Mar Negro. A Ucrânia pode se orgulhar de ter repelido a poderosa frota russa com a ajuda de mísseis e drones marítimos e de ter aberto uma rota crucial para a exportação de cereais ucranianos.
- Homens e armas -
Em dois anos, o Exército ucraniano também sofreu perdas, cuja magnitude não foi revelada, mas que segundo os Estados Unidos ascenderiam a cerca de 70 mil mortos e até 120 mil feridos.
Atualmente, mal encontra voluntários para o front, o que torna urgente a reposição das perdas. Além disso, alguns veteranos começam a exigir o direito à desmobilização.
A Rússia, o país mais populoso, mais rico e mais autoritário, parece reforçar as suas fileiras graças a uma mistura de propaganda patriótica, coerção e incentivos econômicos.
Na Ucrânia, o debate sobre a mobilização causa controvérsias e o governo teve que repensar o seu projeto de lei sobre esta questão.
"Nossas unidades não têm pessoal suficiente. Precisamos de jovens, com menos de 40 anos. E o mais importante é estar motivado", disse à AFP no final de dezembro um comandante de um batalhão perto de Bakhmut.
O Exército queria mais 500 mil mobilizados, mas o presidente Zelensky não autorizou.
No domínio do armamento, a situação é incerta porque os Estados Unidos, no contexto de uma campanha eleitoral, hesitam em continuar a enviar ajuda à Ucrânia. Um pacote de ajuda de 60 bilhões de dólares está bloqueado há meses.
Por sua vez, os europeus desbloquearam, com dificuldades, uma nova ajuda de cerca de 54 bilhões de dólares, mas estão atrasados no que diz respeito às entregas de projéteis de artilharia.
Contudo, sem ajuda e com uma indústria militar incipiente, a Ucrânia não será capaz de responder ao potencial de uma Rússia cuja economia está completamente orientada para o esforço de guerra.
- Controlar o céu -
No entanto, Kiev poderá contar este ano com os caças F-16, que exigiu durante meses e que foram finalmente entregues pelos aliados ocidentais.
Com esta nova arma poderá compensar a escassez de artilharia, essencial para conter os ataques russos e realizar ofensivas.
A Ucrânia deve também multiplicar a sua produção de drones, que se tornaram uma arma indispensável.
Finalmente, para resistir, Kiev exige meios de defesa aérea dos seus aliados. Em novembro, Volodimir Zelensky destacou que se os russos "controlarem todo o céu, não poderemos avançar".
"Em 2024, a prioridade é expulsar a Rússia do céu porque quem controla o céu determinará quando e como a guerra terminará", insistiu em janeiro o chefe da diplomacia ucraniana, Dmitro Kuleba.