Passado mais de um ano da assinatura do contrato entre o Exército Brasileiro (EB) e o Consórcio Iveco–OTO Melara (CIO) para a aquisição inicial de 98 viaturas blindada de combate Cavalaria (VBC Cav) 8X8 Centauro II, o processo avança conforme o planejado, mas poderia ser acelerado.
Por Paulo Roberto Bastos Jr. | Tecnologia & Defesa
O projeto de aquisição foi aprovado em 11 de dezembro de 2020, pela Portaria– EME/C Ex nº 275, originado em 2019 no Grupo de Trabalho (GT) Nova Couraça, dentro do Programa Estratégico do Exército (Prg EE) Forças Blindadas, prevendo as 98 viaturas (que podem ser expandidas para 221), com seu respectivo suporte logístico (SLI), e um sistema de simulação.
Um dos Centauro II BR sendo avaliado pela comitiva da DF, em Montelibretti |
Na primeira consulta pública, entre 22 de março e 31 de maio de 2021, 55 empresas demonstraram interesse e 28 modelos foram ofertados. Este número foi reduzido à cerca da metade no refinamento do projeto, em 16 de novembro. Na entrega oficial das propostas apenas seis modelos se apresentaram, em grande parte pela exigência da viatura já estar em produção seriada, que foi tomada de forma inteligente pelo EB para diminuir os riscos, tendo o “short list”, publicado em 07 de outubro de 2022 (e antecipado por T&D em maio) com três candidatos: Centauro II, LAV 700 AG e ST1-BR.
Em 25 de novembro de 2022, o Comando Logístico (CoLog) / Diretoria de Material (DMat), anunciou o Centauro II como vencedor e o contrato foi assinado em 15 de dezembro. A entrega das duas primeiras unidades do lote protótipo ocorreu em 30 de janeiro de 2023, na unidade da empresa Leonardo, em La Spezia.
SEQUÊNCIA
Atualmente, o processo está em fase de negociação de aceitação do lote protótipo, com as seguintes organizações militares envolvidas:
- Estado-Maior do Exército (EME): por intermédio do Escritório de Projetos do Exército (EPEx), estabelecendo as diretrizes gerais para a obtenção das viaturas, orientando e coordenando as fases preliminares de viabilização;
- Comando Logístico (CoLog): através da Chefia de Material (Ch Mat), conduzindo a obtenção e atividades logísticas relacionadas;
- Departamento de Ciência e Tecnologia (DCT): através da Diretoria de Fabricação (DF), que é a responsável pela gestão das modificações de configuração para a versão do EB, apoio técnico na análise do atendimento aos requisitos estabelecidos em contrato e inspeção das viaturas previamente ao embarque, e do Centro de Avaliações do Exército (CAEx), para as atividades relacionadas aos testes e avaliações;
- Comando de Operações Terrestres (COTer): responsável por conduzir os estudos para a adequação das atividades doutrinárias e a preparação do pessoal e instalações, tanto logístico como operacional, como os regimentos de Cavalaria, que responderão pela manutenção de primeiro escalão; e
- Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx): responsável pela capacitação do pessoal na operação e manutenção das viaturas e nos estabelecimentos de ensino apropriados.
Assim, será feita a assinatura do contrato para o lote de produção com as primeiras 96 unidades, em lotes graduais, e a definição final dos prazos de entrega e nível de nacionalização, com a montagem final feita em território nacional.
Em relação aos programas de compensação (“offset”) também ainda está em discussão, sendo que as prioridades do EB são a produção nacional da munição de 120mm, o desenvolvimento de um simulador para a viatura e a capacitação de empresas nacionais para dar o suporte logístico.
A VERSÃO BRASILEIRA
A VBC Cav adotada, o Centauro II BR, possui poucas (mas significativas) diferenças em relação à versão utilizada pelo Exército Italiano, sendo a principal dela a opção por um sistema de carregamento manual do canhão.
A justificativa para tal escolha foi financeira, já que isso representa menores custos na fase de aquisição, de manutenção e, conseqüentemente, ao longo do ciclo de vida do material, e operacional, pois a presença de mais um militar na viatura (quatro, ao invés de três) aumentaria a autonomia da equipe na operação e manutenção deste complexo sistema de armas.
Também serão instalados os equipamentos do sistema de comando e controle (C2) padronizado no âmbito do EB, cuja integração deverá ocorrer até o final deste ano, com as viaturas já no Brasil.
Este sistema é composto pelo equipamento rádio Falcon III, o computador tático militar (CTM), o software de gerenciamento do campo de batalha (GCB) e o sistema Sotas Intercom. Sua integração permitirá a aplicação do conceito de consciência situacional do campo de batalha em todas as fases da operação, com comunicação externa sem fio, estrutura para tráfego de voz, dados e imagens, interligando-o na parte eletrônica da viatura e seu armamento. Futuramente, deverá ser integrado ao RDS-Defesa, da AEL Sistemas.
O Centauro II BR, inicialmente, virá equipado com uma metralhadora MAG, calibre 7,62x51mm, em um reparo manual sobre a torre, porem, no futuro, poderá receber um sistema de armas remotamente controlado (SARC), como o REMAX 4, da Ares Aeroespacial e Defesa. Também estará apto a receber todos os sistemas disponíveis na versão italiana, como os de proteção eletrônica, como os emissores “jammer” Guardian H3, para defesa contra a detonação remota de dispositivos explosivos improvisados (“improvised explosive device” – IED), bastando, em caso de necessidade, o EB adquirir tais equipamentos e os instalar.
OS TESTES
Após as entregas das duas VBC Cav, já se iniciaram os testes na Itália para onde foi enviado um grupo de militares brasileiros para integrar a primeira equipe de avaliação técnica (de abril a julho), composto pelos:
- Coronel QEM Ismael Cardoso de Campos (CAEx);
- Major Cav Marcelo Vitorino Álvares (CI Bld);
- Capitão Cav Marcelo Eduardo Deotti Junior (17º RC Mec);
- Capitão Rafael Vitor Guerra Queiroz (CAEx); e
- Capitão QEM Elthon Bernardes Sales Bento (CAEx);
A primeira campanha de tiro e maneabilidade correu no final de maio, nos campos de prova de Montelibretti e Nettuno, e contou com a presença do general-de-brigada Willian Koji Kamei, 4º subchefe do EME.
Na avaliação, sempre com tripulação brasileira, a viatura rodou centenas de quilômetros em diversas situações e efetuou mais de 200 disparos, obtendo uma precisão de mais de 97%, o que surpreendeu a todos no EB, já que nunca tiveram um sistema de armas com tamanha precisão. A equipe de avaliação deverá retornar à Itália no próximo mês.
Um grupo da DF, chefiado pelo general-de-divisão Tales Eduardo Areco Villela, diretor daquele órgão, também esteve na Itália, em julho, para acompanhar a avaliação e conhecer os processos de fabricação das VBC Cav em La Spezia e Bolzano.