Colonizada por holandeses e britânicos, país é o único da América do Sul que tem o inglês como língua oficial
Folha de S.Paulo
São Paulo - Ex-colônia de Holanda e Reino Unido, lar de 800 mil pessoas e, mais recentemente, estrela da economia global, a Guiana foi colocada em uma disputa de território nos últimos anos. No próximo domingo (3), um plebiscito na vizinha Venezuela vai consultar a população sobre uma possível anexação da região de Essequibo, uma área de 160 mil km² sob domínio guianense rica em petróleo.
Prédio da Suprema Corte de Justiça da Guiana, em Georgetown - Avener Prado - 15.jan.2019/Folhapress, |
Até pouco tempo atrás, a então pacata nação era uma das mais pobres do hemisfério Ocidental. O cenário mudou em 2015, quando foram descobertos bilhões de barris em suas águas profundas — parte delas justamente na disputada Essequibo. Desde então, a economia do país deu um salto, que trouxe consigo uma crise política e o acirramento da questão territorial com a Venezuela, que remonta ao século 19.
O crescimento da Guiana acelerou a partir de 2019, quando a americana ExxonMobil começou a extração de petróleo no país. Segundo dados do FMI (Fundo Monetário Internacional), ninguém em 2022 cresceu tanto quanto o país, que alcançou uma taxa de 62%. A previsão é de que a bonança continue neste ano, com um avanço de 37%.
Conheça características do país sul-americano abaixo.
ECONOMIA
Após um período de diversas estatizações, nas décadas de 1960 e 1980, que deixaram grande parte da economia nas mãos do Estado, a Guiana passou por um processo de privatização de muitas de suas empresas na década de 1990, com o apoio do FMI e do Banco Mundial.
Há alguns anos, o PIB (Produto Interno Bruto) do país estava entre os mais baixos da América do Sul — em 2015, ano da descoberta do petróleo, foi de US$ 4,28 bilhões. Em 2020, já havia pulado para US$ 5,47 bilhões e, dois anos depois, em 2022, alcançou US$ 15,36 bilhões. É um crescimento de quase 360% em sete anos. Atualmente, estima-se que a Guiana tenha uma reserva de mais de 11 bilhões de barris de petróleo, segundo o Banco Mundial.
No ano passado, petróleo foi quase 88% do total das exportações do país. Excluída essa commodity, açúcar, ouro, bauxita, camarão, madeira e arroz representam 90% do que o país exporta — a base da economia da Guiana antes da descoberta do petróleo. A capital, Georgetown, é o centro cultural e financeiro do país, com uma população de mais de 200 mil habitantes.
A Guiana é uma república presidencialista que se emancipou do Reino Unido em 1966. Um dos líderes da luta pela independência foi Cheddi Jagan, que posteriormente se tornou o primeiro presidente guinês. Atualmente, o país é governada por Irfaan Ali, do esquerdista Partido Popular Progressista, desde 2020. Ele é o primeiro muçulmano a ocupar a chefia do Executivo.
O político aposta no petróleo para seus planos de expandir a economia e tornar o país mais competitivo no mercado global, e para isso, pretende mudar a política de imigração para atrair massa trabalhadora estrangeira. "Estamos investindo em saúde, educação e outros serviços sociais que melhoram o nível de vida da população", disse Ali em entrevista para o site FDi Inteligence.
O raciocínio, porém, é alvo de disputas internamente. O Transparence Institute of Guyana (Instituto de Transparência de Guiana, em inglês), argumenta que o nível de pobreza não diminuiu com o dinheiro do petróleo, e afirma que, no ranking de corrupção da Transparência Internacional, a nação ocupou a 85ª colocação em 2022, entre 180 países.
CULTURA
A Guiana é o único país da América do Sul em que o inglês é uma língua oficial —uma herança do período em que a nação foi uma colônia do Reino Unido. A maioria da população, porém, tem como primeiro idioma o crioulo da Guiana, cuja base é o inglês. Outras línguas influenciam o idioma, como holandês, arawak, karib, bhojpuri, akan, kikongo e iorubá — resultado da colonização holandesa e da presença africana, indiana e indígena no país, o que faz da Guiana um dos países mais etnicamente diversos do continente.
A população é formada principalmente por negros e descendentes de indianos que migraram para a Guiana após a abolição da escravidão. Há ainda indígenas de diversas etnias — algumas delas, como a Wapishana e a Macushi, também estão no Brasil — e descendentes de colonizadores europeus e imigrantes chineses.
A culinária do país tem influências de todas essas culturas que formaram a Guiana. Entre os ingredientes, é possível encontrar o curry, um tempero indiano, e a mandioca, um tubérculo presente na culinária indígena. Uma das comidas típicas é o roti. Originalmente da Índia, o prato é uma espécie de tortilha de farinha de milho acompanhado de carne cozida com especiarias como noz-moscada e canela.
O esporte mais popular do país é o críquete, que tem como um de seus astros Roger Harper. O atleta teve o auge de sua carreira nos anos 1980 e 1990, e atualmente é treinador. Já o músico mais conhecido é Eddy Grant, guitarrista e compositor do The Equals. Nascido na Guiana, Grant cresceu no Reino Unido e foi um forte crítico do apartheid na África do Sul.
Um dos mais importantes ativistas e intelectuais da Guiana foi Walter Rodney. Seu principal livro é o "Como a Europa subdesenvolveu a África", publicado no Brasil pela editora Boitempo. Ele lecionou na Jamaica e na Tanzânia entre 1966 e 1974 e, ao voltar para sua terra natal, deveria assumir um cargo na Universidade da Guiana, o que foi impedido pelo governo. Rodney morreria seis anos depois, aos 38 anos, após um atentado a bomba em seu carro que nunca foi totalmente esclarecido.
ATRAÇÕES TURÍSTICAS
A forma mais prática de chegar em Georgetown é por meio de uma conexão na Cidade do Panamá, na América Central. O primeiro voo costuma durar quase sete horas; o segundo, três horas e meia. Ida e volta custam entre R$ 5.000 e R$ 15 mil, a depender da época e da companhia aérea.
Uma das principais atrações é a natureza — com grande biodiversidade, a Guiana oferece praias do Caribe, no norte e floresta amazônica no sul. As cataratas de Kaieteur, de 226 metros, por exemplo, são um dos pontos turísticos, assim como o rio Essequibo, que dá nome ao território em disputa com a Venezuela.
Na capital, algumas das principais atrações são o Museu Nacional, que conta a história da nação, a catedral anglicana de São Jorge, feita de madeira, e o mercado Stabroek, o maior do país.