Após visitas ao Oriente Médio, chefe de Assuntos Humanitários descreve “tragédia paralela” vivida nos dois lados do conflito; coordenadora humanitária da ONU para a Palestina explica desafios da suspensão de serviços essenciais em Gaza; diretor da Unrwa comenta tragédias em abrigos da ONU, que sofrem cada vez mais com ataques e falta de insumos essenciais.
ONU News
Nesta sexta-feira, o subsecretário-geral da ONU de Assuntos Humanitários, Martin Griffiths mencionou “intensas negociações humanitárias acontecendo noite e dia” e disse que vê progressos na permissão para a entrada de um pouco de combustível em Gaza. Ele participou em Nova Iorque de uma sessão informativa sobre a crise Israel-Palestina.
Martin Griffiths, subsecretário-geral para Assuntos Humanitários da ONU, informa sobre a situação humanitária no Território Palestino Ocupado | ONU/Mark Garten |
O chefe de ajuda humanitária disse que nesta quinta-feira 100 caminhões com itens essenciais entraram em Gaza, o maior comboio até o momento. No entanto, ele enfatizou que as pausas humanitárias são extremamente necessárias, e que, “sem elas, não será possível atender as necessidades.”
Tragédias paralelas
Ao se referir ao sofrimento de famílias tanto em Israel quanto nos Territórios Palestinos Ocupados, Griffiths caracterizou a situação como “tragédias paralelas”.
Ele disse que para os familiares de alguns dos 240 reféns mantidos em Gaza desde os ataques do Hamas em 7 de outubro, “cada dia é um dia de ansiedade terrível e incerteza”.
Encontrar esses reféns e levá-los para casa é “um assunto humanitário da mais alta importância”, afirmou Griffiths.
Sobre o diálogo com famílias palestinas, ele citou a conversa com um homem que teve a casa totalmente destruída e teve que enterrar 30 membros da família com as próprias mãos.
Segundo Griffiths, durante a conversa uma garota de oito anos interrompeu a ligação e disse “eu simplesmente não quero morrer”.
Perdas em todos os lados
O chefe de assuntos humanitários também prestou tributo aos 72 funcionários da ONU que perderam a vida tentando responder à crise.
As 1,4 mil pessoas mortas em Israel em 7 de outubro é uma quantidade três vezes maior do que a soma de todas os óbitos registrados pelo Escritório de Assuntos Humanitários da ONU, Ocha, desde 2005.
A quantidade de mortos em Gaza chegou a 9 mil, um número quatro vezes maior que durante o conflito de 50 dias em 2014. Griffiths enfatizou que o número de mortos só será realmente conhecido quando as construções e os escombros forem removidos.
22 dias de apagão total
A coordenadora humanitária da ONU para a Palestina, Lynn Hastings, também disse que “todos os esforções diplomáticos para libertar os reféns israelenses são bem-vindos.”
Em Gaza ela afirmou que a situação é trágica, com 1,5 milhão de pessoas deslocadas, mais de 190 mil delas abrigadas em unidades da Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos, Unrwa.
Hastings disse que pelo 22° dia consecutivo, Gaza continua sob um apagão total de eletricidade, devido a suspensão de abastecimento de luz e combustível imposta por Israel.
Segundo ela, os geradores que sustentam muitos serviços essenciais, como hospitais, dessalinização da água e produção de comida estão parando de funcionar, à medida que o suprimento de combustível acaba.
A coordenadora humanitária enfatizou que a “sanidade, humanidade e a lei internacional devem prevalecer”.
Sobrevivendo com apenas dois pães por dia
Falando do sul de Gaza, o diretor da Unrwa, Thomas White, disse que a crise está colocando a agência no limite, num momento em que muitas pessoas estão buscando abrigo sob a bandeira da ONU e que está bandeira “é a única esperança para as pessoas em Gaza”.
Ele enfatizou que os funcionários da Unrwa estão oferecendo serviços sob extremo risco e que muitos deles são também deslocados internos, tal como as pessoas que buscam ajudar.
White ressaltou que “a ordem civil está à beira do colapso” e que é possível surgir “uma nova onda de pessoal desabrigadas no Sul”.
Segundo ele, muitas pessoas em Gaza temem não conseguir alimentar suas famílias. Atualmente, muitas pessoas estão sobrevivendo com apenas dois pedaços de pão por dia.
Busca de proteção sob a lei internacional
A Unrwa apoia 89 padarias, que produzem pão para 1,7 milhão de pessoas e praticamente todo pão consumido no enclave é feito com trigo fornecido pela agência.
Sobre os abrigos, o diretor da Unrwa disse que boa parte são escolas projetadas para mil alunos, mas em média eles estão abrigando 4 mil pessoas e que não há como fornecer condições sanitárias adequadas. Ele explicou que mulheres e crianças dormem nas salas de aula e os homens ao ar livre.
No momento, a Unrwa perdeu o contato com os abrigos no norte da Faixa de Gaza. Ao todo, 38 pessoas já morreram em instalações da Unrwa, que não foram poupadas dos ataques. Nesta quinta-feira, quatro abrigos, ocupados por 20 mil deslocados, foram atingidos deixando 23 mortos.
Tomas White concluiu dizendo que essas são pessoas que estão buscando proteção sob a lei internacional, e que há um grande clamor popular por um cessar-fogo imediato.
Princípios desrespeitados em ambos os lados
Falando a jornalistas em Genebra nesta sexta-feira, a porta-voz do Escritório de Direitos Humanos da ONU, Liz Throssell, destacou as preocupações com os ataques aéreos israelenses nos campos de refugiados de Jabalia e Al Bureij nos últimos dias.
Os bombardeios deixaram dezenas de edifícios residenciais destruídos e um elevado número de vítimas em Gaza. Ela citou também relatos do “uso de armas explosivas de amplo alcance em algumas das áreas mais densamente povoadas de Gaza”.
“Temos sérias preocupações de que os princípios da distinção e da proporcionalidade não estejam a ser respeitados por ambos os lados”, disse ela.