Presidente Lula e chanceler Mauro Vieira participaram de dezenas de reuniões sobre reformas na governança global durante a Assembleia Geral da entidade, em Nova York
Américo Martins | CNN
Londres - O Itamaraty fez uma verdadeira “blitz diplomática” em defesa de reformas na ONU e da ampliação do seu Conselho de Segurança durante a Assembleia Geral da entidade, em Nova York.
Reunião do Conselho de Segurança da ONU. Imagem de arquivo | Foto: Reuters/Carlo Allegri |
Os protagonistas dessa ofensiva foram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, que participaram durante a semana de dezenas de reuniões sobre esses e outros temas da governança global.
Lula teve 13 encontros em sua atribulada agenda, inclusive importantes reuniões bilaterais com os presidentes dos Estados Unidos, Joe Biden, e da Ucrânia, Volodymyr Zelensky.
Vieira participou de 11 dessas agendas e de uma sessão do Conselho de Segurança, teve encontros bilaterais com 15 chanceleres e dirigentes de organismos internacionais e compareceu a outras 14 reuniões com representantes de grupos de países prioritários para o Brasil.
Os dirigentes brasileiros receberam ainda mais de 50 pedidos cada para reuniões que acabaram não acontecendo por falta de tempo.
Os pedidos de tantos países para reuniões com o Brasil coroa os esforços diplomáticos do Itamaraty e do presidente Lula, que não perdeu a chance de usar o bordão de que “o Brasil está de volta” ao cenário geopolítico em todas as cúpulas recentes das quais participou, como a do G7, a dos Brics, o G20 e, claro, a Assembleia Geral.
Um importante diplomata brasileiro disse à CNN que “havia uma grande demanda reprimida” pela participação do Brasil nos fóruns internacionais.
“Agora, essa demanda volta a ser atendida justamente no momento em que o debate sobre a reforma da ONU e do Conselho de Segurança volta ao radar de todos. Isso não significa que haverá um desfecho a curto prazo, mas é evidente que os principais atores estão se mexendo, e que o Brasil é um deles”, afirmou a fonte.
Cobrança contundente
O ponto alto dessa movimentação toda foi a participação de Lula na abertura da Assembleia Geral, quando o líder brasileiro defendeu de forma contundente a necessidade de se reformar o sistema de governança global.
“O Conselho de Segurança da ONU vem perdendo progressivamente sua credibilidade. Essa fragilidade decorre em particular da ação de seus membros permanentes, que travam guerras não autorizadas em busca de expansão territorial ou de mudança de regime. Sua paralisia é a prova mais eloquente da necessidade e urgência de reformá-lo, conferindo-lhe maior representatividade e eficácia”, afirmou.
O próprio secretário-geral da ONU, António Guterres, fez uma fala praticamente idêntica, cobrando mudanças em sua organização e no conselho. A semelhança dos discursos foi interpretada por diversos diplomatas como um dos sinais de que este seria o momento certo para aumentar a pressão por reformas.
E o chanceler Mauro Vieira não perdeu tempo para tentar capitalizar esse movimento em favor da candidatura do Brasil como membro permanente do Conselho de Segurança –uma demanda de décadas do Itamaraty.
Entre as diversas reuniões que teve, o chanceler deu prioridade àquelas que envolveram países que já têm vagas permanentes ou que também são candidatos a essa posição no conselho, como foram os casos de Rússia, França e Japão.
Além disso, o Brasil coordenou pelo menos três reuniões com grupos de países envolvidos diretamente na tentativa de reformas da ONU: o G4, o L69 e o IBAS.
O primeiro é formado por quatro fortes candidatos a uma vaga permanente no Conselho de Segurança: Brasil, Alemanha, Índia e Japão. O IBAS junta Brasil, Índia e África do Sul. E o L69 tem mais de 40 países em desenvolvimento da América Latina, Caribe, Ásia e África.
Em todas as reuniões ficou acertado que os membros vão trabalhar em conjunto pelas reformas.
O processo, no entanto, é longo e não há nenhuma garantia de sucesso no curto prazo.
Diplomatas afirmam, nos bastidores da ONU, que o país mais reticente a mudanças na estrutura do Conselho de Segurança é a China. Um dos motivos seria a alta possibilidade de ascensão da Índia e Japão, dois rivais regionais de Pequim, ao Conselho de Segurança.
Também existe a avaliação de que os Estados Unidos precisam se engajar nas negociações de fato para as reformas, deixando de lado as suas declarações parcialmente simpáticas às mudanças.
As duas maiores potências do mundo, no entanto, ainda devem resistir por mais tempo à ideia de repartir o poder de veto que hoje têm sobre as mais importantes decisões globais.