O presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou neste domingo (24) que Paris vai repatriar o seu embaixador no Níger e retirar, em breve, a presença de 1,5 mil militares franceses que se encontram no país africano. Em julho, um golpe de Estado derrubou o presidente eleito Mohamed Bazoum e as relações entre os militares nigerianos e a França se deterioraram.
RFI
“Não existe mais ‘Françáfrica’. Quando tem um golpe de Estado, a gente não intervém”, afirmou Macron, em uma entrevista às duas principais emissoras de TV francesas, TF1 e France 2. O presidente explicou que, neste contexto, a presença de soldados franceses – que estão há vários anos na ex-colônia para combater o terrorismo na região – será encerrada.
Emmanuel Macron deu entrevista a duas emissoras de TV neste domingo, 24 de setembro de 2023. © Capture d'écran France TV |
“Nas próximas horas, o nosso embaixador [Sylvain Itté] vai voltar para a França (…) e os nossos soldados, na semana e nos meses que vêm”, com uma previsão de finalização "até o fim do ano”, informou. O diplomata já havia sido declarado "persona non grata” pela junta militar no poder em Niamei.
“Nós não estamos lá para sermos reféns dos golpistas. Nós continuaremos ajudando o continente africano na luta contra o terrorismo, mas somente a governos democraticamente eleitos”, advertiu o chefe de Estado, ao ressaltar o “sucesso” da operação Barkhane, iniciada em 2014 para conter a emergência do grupo Estado Islâmico e o fortalecimento da Al Qaeda, entre outras organizações jihadistas, na região africana do Sahel.
“Os golpistas são amigos da desordem. No Mali, há dezenas de mortos todos os dias”, lembrou, referindo-se a outro país em que a cooperação militar francesa foi encerrada, no ano passado.
Relações tensas com o Níger
A junta que assumiu o poder em Niamei há havia sinalizado que desejava a retirada do contingente francês do país. No início de agosto, os militares anunciaram o fim dos acordos de cooperação assinados com Paris.
O regime afirmou que, em 1º de setembro, que houve uma reunião entre o chefe do Estado-Maior nigerino e o comandante das forças francesas no Sahel para discutir "um plano de retirada das capacidades militares francesas”.
Antes do golpe de 26 de julho, o país da África Ocidental e antiga colônia francesa era um dos seus últimos aliados no Sahel. A França considera o presidente deposto Mohamed Bazoum, mantido refém pela junta militar no poder, como presidente legítimo do país e rejeita as reivindicações dos golpistas.
França não poderá ‘acolher toda a miséria do mundo'
Na entrevista, Emmanuel Macron também respondeu às críticas do papa Francisco sobre a "indiferença" europeia à chegada de milhares de migrantes nas fronteiras do bloco. O pontífice encerrou neste sábado (23) uma visita de dois dias a Marselha, no sul da França, e o tema foi evocado.
O presidente declarou que a França está fazendo “a sua parte” em termos de acolhimento dos migrantes. “O papa tem razão em pedir um sobressalto contra a indiferença”, mas “nós, franceses, estamos a fazer a nossa parte”, disse o líder.
“Não podemos acolher toda a miséria do mundo", acrescentou, usando a famosa frase do antigo primeiro-ministro socialista Michel Rocard.
Macron convocou uma resposta europeia para "uma abordagem consistente com os países de origem e os países de trânsito” dos migrantes, e pediu para "não deixar os italianos sozinhos”. A Itália é uma das principais portas de entrada na Europa de migrantes vindos da África pelo mar Mediterrâneo.
Cooperação com países mediterrâneos
Aos países da margem sul do Mediterrâneo, em particular à Tunísia, ele espera que a Europa se ofereça para “levar estudos, especialistas, equipamentos, etc. às suas costas para desmantelar os traficantes de pessoas”, como parte de “uma parceria respeitosa”.
“É isso que estamos fazendo com os britânicos. Concordamos em ter especialistas britânicos em Calais para nos ajudar a desmantelar estas redes de contrabandistas e temos resultados muito bons”, explicou Macron.
No plano interno, o presidente defendeu que a lei de imigração que será analisada no início de novembro no Senado seja objeto de um “compromisso inteligente”, particularmente sobre o polêmico tema da regularização de imigrantes sem documentos para exercer profissões com falta de mão de obra na França.
“Não devemos ser hipócritas: há, de fato, profissões sob tensão que contratam muitas mulheres e homens que vêm da imigração e que muitas vezes estão em situação precária há vários anos”, lembrou o chefe do Estado. Mas adverte: “não existe direito incondicional à regularização. Nunca haverá”.
Com AFP