Enviado especial do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky para a América Latina diz à CNN que Brasil deveria aproveitar sua amizade com Moscou para influenciar Putin
Américo Martins | CNN
Londres - O governo da Ucrânia quer que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aproveite a cúpula dos Brics para pressionar a Rússia para acabar com a guerra no leste europeu.
Bandeiras dos países que formam os Brics durante reunião de cúpula do grupo em Xiamen, na China | 04/09/2017 REUTERS/Wu Hong/Pool |
A afirmação foi feita pelo embaixador Ruslan Spirin, enviado especial do presidente Volodymyr Zelensky para a América Latina, em entrevista exclusiva à CNN.
“Estamos buscando a paz, então toda a sua influência, a sua amizade e o seu relacionamento [do Brasil com a Rússia] deveriam ser usados para influenciar o cérebro do [presidente russo, Vladimir] Putin, explicando que ele não pode violar as regras internacionais e o direito internacional, que tem que retirar suas tropas do território de outro país soberano”, disse Spirin.
O embaixador, no entanto, admite que tem dúvidas se tal mensagem será, de fato, enviada ao Kremlin.
“Em primeiro lugar, respeitamos muito o que o Brasil diz a respeito do processo de paz. Isso realmente é vital. Precisamos de paz, porque todos os dias morrem civis em todo o território do nosso país”, disse ele.
“Espero que sim [que o presidente Lula envie essa mensagem a Putin], mas tenho dúvidas. Porque as últimas declarações do presidente brasileiro… Ele não falou nada parecido. Ele só está falando do restabelecimento da paz da forma como está [a guerra]”, completou o enviado de Zelensky.
Lula já fez diversas declarações defendendo que um grupo de países não envolvidos na guerra tomasse a iniciativa de propor negociações diplomáticas para acabar com o conflito.
O governo ucraniano, no entanto, reclama da postura diplomática do Brasil, dizendo que qualquer processo de paz só pode começar depois de a Rússia retirar todas as suas tropas do país, inclusive da península da Crimeia.
Os ucranianos querem implementar uma proposta de dez pontos do presidente Zelensky para a paz, que inclui, além da retirada imediata de todas as tropas russas de todo o território ucraniano, compensação pelos crimes de guerra e reconhecimento total da integridade da Ucrânia.
Cúpula na África do Sul
A cúpula dos Brics acontece na semana que vem, em Johanesburgo, na África do Sul, com a presença de Lula e dos chefes de governo da Índia, Narendra Modi, da China, Xi Jinping, e da África do Sul, Cyril Ramaphosa.
O presidente Putin não vai comparecer pessoalmente porque poderia ser preso pelas autoridades sul-africanas caso pisasse no país, visto que o Tribunal Penal Internacional (do qual a África do Sul é um dos países membros) emitiu um mandado de prisão contra ele por crime de guerra.
A cúpula acontece justamente quando a guerra completa um ano e meio.
Fontes do Itamaraty ouvidas pela CNN dizem que certamente a guerra será discutida de uma forma ou de outra na cúpula, mas acreditam que este não deve ser o ponto central do encontro.
O Brasil foi o único país do grupo a condenar em votações na ONU a invasão e a violação da integridade territorial da Ucrânia. África do Sul, Índia e China se abstiveram em todas as votações.
O embaixador ucraniano diz ainda que o seu país está retomando centenas de quilômetros do território ocupado pelos russos nos últimos 18 meses.
“Cerca de 55% dos territórios anteriormente ocupados pelos russos já estão liberados. Nosso exército está numa contraofensiva e, em duas semanas, já liberamos mais de 200 quilômetros quadrados”, disse ele, pedindo também que os países aliados enviem aviões para o esforço de resistência dos ucranianos.
O embaixador afirma ainda que a guerra terá que ser resolvida tanto no campo de batalha como no cenário diplomático, mas lamenta os altos custos humanos do conflito.