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Um tribunal de Moscou condenou nesta sexta-feira (08/07) um vereador a sete anos de prisão por suas declarações contra a guerra na Ucrânia. É a primeira condenação do tipo na Rússia por fazer oposição ao conflito.
Gorinov está preso desde abril | Foto: KIRILL KUDRYAVTSEV/AFP/Getty Images |
A sentença sem precedentes aumenta a pressão sobre os críticos do Kremlin na Rússia, que cada vez mais são perseguidos por condenarem a invasão da Ucrânia por Moscou.
Alexei Gorinov, de 60 anos, foi considerado culpado de espalhar "informação sabidamente falsa" sobre os militares russos, o que é considerado um crime na Rússia e pode acarretar uma sentença máxima de 15 anos de prisão, de acordo com uma lei aprovada pelo Parlamento uma semana após o início da guerra na Ucrânia.
Gorinov é a primeira pessoa a cumprir pena atrás das grades por essa acusação, de acordo com o Net Freedoms, grupo de assistência jurídica focado em casos de liberdade de expressão. As outras duas condenações desse tipo até agora levaram a uma multa e uma pena suspensa, informou o grupo.
Gorinov está preso desde abril. Em março, ele criticou as ações militares da Rússia na Ucrânia em uma reunião do conselho municipal. Um vídeo no YouTube mostra Gorinov expressando ceticismo sobre a realização de um concurso de arte infantil planejado em seu distrito eleitoral enquanto "todos os dias crianças morrem" na Ucrânia.
A juíza Olesya Mendeleyeva disse que Gorinov e outra vereadora – Yelena Kotyonochkina, que fugiu da Rússia – "enganaram" os russos sobre a campanha militar na Ucrânia e os fizeram "sentir ansiedade e medo".
Protesto durante o julgamento
Gorinov recusou-se a se declarar culpado e denunciou a invasão novamente enquanto dava sua declaração final no tribunal na quinta-feira.
"Há cinco meses, a Rússia vem realizando hostilidades, chamando-as de 'operação especial'. Nos prometem vitória e glória. Por que, então, uma grande parte dos meus compatriotas sente vergonha e culpa?'' disse Gorinov. "Estou convencido de que a guerra é o caminho mais rápido para a desumanização, quando a linha entre o bem e o mal desaparece. É sempre a morte, eu não aceito isso."
Fotos do julgamento publicadas pela mídia russa nesta sexta-feira mostram Gorinov segurando um cartaz que dizia: "Você ainda precisa desta guerra?" Um oficial de justiça uniformizado usou as mãos para tentar cobrir as palavras das câmeras.
Alla, esposa de Gorinov, chorou no tribunal quando a sentença foi lida. "Nós vivemos 32 anos juntos. Achei que continuaríamos vivendo felizes", disse a repórteres, com a voz embargada. "Eu vou esperar por ele. Ele é o melhor".
Do lado de fora, cerca de 40 pessoas se reuniram para mostrar apoio ao vereador. Uma mulher de 80 anos segurava uma bolsa com flores e símbolos folclóricos russos bordados, com as palavras "Não à guerra" costuradas à mão. A polícia cercou a mulher e tentou afastá-la, mas cedeu após pressão dos demais manifestantes.
"É importante estarmos juntos e vermos que há pessoas que são realmente contra o que está acontecendo, contra as leis repressivas, e compartilham visões pacifistas", disse Nataliya Chichilanova, de 39 anos.
Anistia Internacional diz que condenação é "chocante"
Bruce Millar, vice-diretor da Anistia Internacional para a Europa Oriental e Ásia Central, classificou a sentença de Gorinov como "chocante", dizendo que a "investigação oficial do caso levou apenas cinco dias". "É uma represália ilegal por expressar seus pontos de vista, e não uma forma de justiça", disse em comunicado.
Segundo ele, Gorinov "não cometeu nenhum crime reconhecido internacionalmente ao chamar a guerra desencadeada por Vladimir Putin na Ucrânia do que realmente é: uma guerra criminosa".
A analista política Tatyana Stanovaya, fundadora do think tank R.Politik, disse que a sentença de sete anos de Gorinov foi uma "decisão política especial" e que seu caso se destacou porque ele expressou opiniões antiguerra enquanto falava como funcionário público em um encontro do conselho.
"A sentença é um aviso desafiador e enfaticamente cruel para todos: 'dissidentes, todos vocês ficarão atrás das grades por muito tempo se combinarem retórica antiguerra com atividade política''', escreveu Stanovaya no Telegram.
A oposição exilada da Rússia também criticou a sentença. Leonid Volkov, um dos principais aliados do líder da oposição preso Alexei Navalny, chamou-a de "execução pública" para desencorajar qualquer forma de protesto contra o governo de Moscou.
Perseguição a críticos
Quando o presidente russo, Vladimir Putin, ordenou a invasão da Ucrânia em 24 de fevereiro, uma onda de indignação e sentimento antiguerra varreu a Rússia. Milhares de pessoas protestaram diariamente nas ruas de Moscou e São Petersburgo, e centenas de milhares assinaram petições online se opondo ao ataque.
O Kremlin, no entanto, insistiu que o que chama de "operação militar especial" na Ucrânia tem apoio público esmagador e agiu rapidamente para suprimir qualquer crítica. Milhares de manifestantes foram presos e dezenas de meios de comunicação foram fechados.
Pessoas que se manifestaram publicamente contra a invasão ou acusaram as tropas russas de cometer atrocidades na Ucrânia foram alvos da nova legislação.
Até esta sexta-feira, o Net Freedoms já contabilizava 68 casos criminais envolvendo acusações de informações falsas e pelo menos 2 mil casos de contravenção por suposta depreciação dos militares russos.