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SÃO PAULO, SP - A porta entrada são as nações vizinhas do bloco: Polônia, Letônia ou Lituânia. O impasse, que já envolve líderes como o presidente russo, Vladimir Putin e chanceler alemã, Angela Merkel, tem se aprofundado nos últimos dias à medida que nenhum dos lados tem sinalizado uma trégua.
SÃO PAULO, SP - A porta entrada são as nações vizinhas do bloco: Polônia, Letônia ou Lituânia. O impasse, que já envolve líderes como o presidente russo, Vladimir Putin e chanceler alemã, Angela Merkel, tem se aprofundado nos últimos dias à medida que nenhum dos lados tem sinalizado uma trégua.
Crise na fronteira entre Polônia e Belarus | Reprodução CNN |
O Ocidente acusa o governo belorusso de ter atraído os migrantes com a promessa de uma passagem fácil para a UE e, em seguida, forçando-os a permanecer na fronteira como retaliação às sanções impostas sobre a repressão do regime à dissidência no país ex-soviético.
De olho em não repetir a crise migratória de 2015, a UE apoiou a Polônia, a Letônia e a Lituânia, que barricaram suas fronteiras apesar da morte de quase uma dúzia de migrantes. Tanto a Polônia quanto a Lituânia são considerados, assim como Belarus, países de trânsito para refugiados e migrantes, muitos dos quais têm como destino final localidades como Alemanha, França, Áustria e Holanda, onde costumam ter familiares ou conhecidos. De acordo com as autoridades alemãs, pelo menos 5.000 pessoas chegaram ao país via Belarus.
Na terça-feira, as forças de Varsóvia dispararam gás lacrimogêneo e canhões de água em baixas temperaturas contra uma multidão de centenas de pessoas que avançaram da fronteira após uma semana vivendo num campo improvisado.
O ministro da Defesa polonês, Mariusz Blaszczak, alertou na quarta-feira que a crise pode durar "meses ou até anos". Acredita-se que cerca de 4.000 pessoas estejam atualmente presas ao longo da fronteira com a Polônia, onde a maioria dos migrantes está concentrada.
Em um sinal de que a crise está se aprofundando, as autoridades bielorrussas colocaram cerca de 1.000 migrantes em um "centro logístico" esta semana, uma medida que poderia tornar o campo uma presença semipermanente nas fronteiras da UE.
Os países-membros do G7 pediram a Belarus hoje que cesse "imediatamente" à crise migratória nas fronteiras da UE. Em comunicado conjunto, os ministros das Relações Exteriores de Reino Unido, França, EUA, Canadá, Alemanha, Itália e Japão, assim como da União Europeia (UE), criticaram "a organização, por parte do regime bielorrusso da imigração ilegal [sic] em suas fronteiras".
"Os atos do regime bielorrusso constituem uma tentativa de desviar a atenção de seu desrespeito permanente pelo direito internacional, pelas liberdades fundamentais e pelos direitos humanos, incluindo os de seu próprio povo", acrescentaram. Os países do G7 também pedem a Belarus que conceda às organizações internacionais "acesso imediato e sem obstáculos para poder fornecer ajuda humanitária".
O que dizem os lados
A UE acusa o presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, de engendrar a crise para forçar os europeus a reiniciar o diálogo, que o Ocidente interrompeu depois que seu regime lançou uma repressão à oposição após uma eleição presidencial questionada no ano passado. Lukashenko, que tem governado Belarus com punho de ferro por quase três décadas, nega as acusações.
Nesta semana, ele falou duas vezes por telefone com a chanceler alemã, Angela Merkel, em sua primeira ligação com um líder ocidental desde o ano passado. Na quarta-feira, seu gabinete disse que negociações diretas entre Belarus e a UE são iminentes. A Alemanha, no entanto, não confirmou negociações diretas.
Berlim, em vez disso, delineou um processo de fornecimento de ajuda humanitária e deportação de migrantes envolvendo a agência das Nações Unidas para os refugiados, ACNUR e a Organização Internacional para as Migrações, em cooperação com a Comissão Europeia. Ainda assim, o porta-voz de Merkel, Steffen Seibert, disse na quarta-feira que é "útil" manter o diálogo com Minsk (capital-sede do governo belurosso) "para melhorar esta situação humanitária", mesmo que as negociações sejam com um líder cuja legitimidade a Europa e a Alemanha não reconhecem.
Para Varsóvia, a crise é uma oportunidade para restaurar a sua imagem aos olhos dos seus parceiros europeus, que acusam as autoridades polacas de desrespeitar princípios como a independência do poder judicial e o primado da lei.
Ao permanecer firme e fechar suas fronteiras, a Polônia tem servido como uma barreira, a primeira na linha de defesa da Europa para evitar um influxo de migrantes. O principal apoiador político e financeiro de Lukashenko, o presidente Putin, por sua vez, se apresentou como um mediador, promovendo na quarta-feira o contato direto entre a UE e Minsk.
Autoridades de diversos países da União Europeia afirmam que Moscou está envolvido diretamente na crise de migração, mas ainda não apresentaram provas. O primeiro-ministro polonês, Mateusz Morawiecki, por exemplo, disse: "Este ataque que [o presidente bielorrusso] Lukashenko está perpetrando tem seu cérebro em Moscou. O cérebro é o presidente Putin". As autoridades russas refutam categoricamente essas acusações.
O secretário de imprensa do presidente russo, Dmitry Peskov, considerou as palavras de Morawiecki irresponsáveis e inaceitáveis. A chanceler alemã, Angela Merkel, pediu ao presidente Putin que intervenha na crise, situação que a União Europeia considera "um ataque híbrido" com o objetivo de desestabilizar o bloco europeu.
A Rússia elogiou o tratamento "responsável" de seu aliado bielorrusso na questão da fronteira e disse que está acompanhando a situação de perto. O fato é que as autoridades belorussas nunca informaram o número exato de pessoas que chegaram recentemente ao país. De acordo com relatos de moradores nas redes sociais, centenas de pessoas estão acampando nos arredores de shoppings, em passagens subterrâneas e pelas redondezas de de prédios em toda a cidade de Minsk.
Nos últimos dias, o governo de Belarus deixou de emitir vistos no aeroporto para cidadãos de cinco países: Síria, Irã, Afeganistão, Nigéria e Iêmen.
O lado mais fraco
Os migrantes, principalmente curdos iraquianos, abandonaram seus países, gastando milhares de dólares para chegar a Belarus com um visto de turista, determinados a entrarem na Europa. Em resposta, a Varsóvia tem enviado milhares de soldados para a fronteira e até planeja erguer um muro, a fim de tornar impermeável a passagem de pessoas que tentam entrar na região ilegalmente.
À medida que o inverno no hemisfério norte se aproxima, as condições climáticas devem dificultar ainda mais a vida dos migrantes, cujas opções atuais são limitadas a ficar em Belarus e esperar que a Europa os aceite, ou voltar para casa.
Já entre 200 e 300 iraquianos parecem ter feito sua escolha: um vôo de repatriação de Minsk deve levá-los de volta ao Iraque ainda hoje.
O começo do impasse
Desde 2020, as autoridades de Belarus cancelaram ou simplificaram os requisitos de visto para 76 países. Entre os quais estão regiões afetadas por conflitos como Síria, Líbia, Iraque e Afeganistão, de onde milhares de pessoas têm tentando sair.
Agências de viagens da Síria, Iraque e Turquia começaram a vender viagens para Belarus destacando a oportunidade de moradia e emprego em um país da União Europeia. As passagens custam o equivalente a até R$ 100 mil. Além disso, Belarus aumentou significativamente o número de voos de nações do Oriente Médio.
Vários países da Europa denunciam que até as autoridades do país estão por trás dessas ofertas promovidas pelas agências de viagens.
Até meados de 2021, o Iraque era o principal ponto de partida para o país do Leste Europeu. Em setembro, o alto representante das Nações Unidas, Josep Borrell, conseguiu negociar com as autoridades iraquianas uma redução desses voos para Belarus.
Atualmente, os curdos que fogem da Síria são a maioria dos que tentam entrar na União Europeia por esse percurso. Na Síria, eles são ameaçados não apenas pelo regime sírio, mas também por militantes do Estado Islâmico.
Há também migrantes da Líbia, Afeganistão, Iêmen e de vários países africanos onde há conflitos religiosos e políticos, como Congo e Etiópia.