Maria João Pinto e Ineke Mules | France Presse
Os Estados Unidos instaram uma vez mais os seus nacionais a deixarem imediatamente por conta própria a Etiópia, avisando que não haverá evacuação militar do país ao "estilo do Afeganistão".
Soldados do Governo capturados marcham por Mekele © Yasuyoshi Chiba/AFP |
A embaixada dos EUA tem vindo a apelar há vários dias aos cidadãos americanos para que façam voos comerciais para deixar o país, onde os grupos rebeldes já não excluem a marcha à capital Adis Abeba. A embaixada oferece empréstimos aos que não podem comprar um bilhete imediatamente.
"Estamos a fazer isso não por sermos pessimistas quanto às perspectivas de paz, mas porque somos práticos", disse o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price.
Ele disse temer uma "má percepção" entre o público "de que o que vimos no Afeganistão é algo que o governo dos EUA pode empreender em qualquer lugar e em qualquer parte do mundo".
Em meados de agosto, quando os Talibãs capturaram Cabul antes dos militares norte-americanos terem completado a sua retirada do Afeganistão, Washington enviou milhares de soldados de volta ao aeroporto da capital para improvisar uma operação de evacuação sem precedentes.
Esforços africanos de mediação
Continuam os esforços de mediação da União Africana, apoiada pelos Estados Unidos, um ano depois do início da guerra entre as forças do Governo de Abiy Ahmed e os combatentes da Frente Popular de Libertação de Tigray (TPLF, na sigla em inglês), no norte do país.
O bloco africano, com sede em Adis Abeba, intensificou a ofensiva diplomática nas últimas semanas para acabar com o conflito, com o antigo Presidente nigeriano, Olusegun Obasanjo, a liderar a iniciativa.
No entanto, os confrontos agravaram-se desde então e os rebeldes alinhados com a TPLF conseguiram ganhos significativos, enquanto avançam para a capital.
Obasanjo deixou a Etiópia na quinta-feira (11.11), após encontros com o primeiro-ministro Abiy Ahmed e os líderes da TPLF. No entanto, nenhum dos lados se comprometeu a negociar.
Obasanjo adertiu, entretanto, que "o diálogo não terá sucesso num ambiente de escalada das hostilidades militares" e apelou a um cessar-fogo de ambas as partes. "É o momento de tomarmos ações coletivas para encontrar uma solução duradoura e evitar a escalada da situação", disse.
O Presidente do Quénia, Uhuru Kenyatta, esteve em Adis Abeba no último domingo (14.11) para apoiar as negociações de paz do bloco africano, às vésperas de uma visita de três dias do secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken.
"Há uma oportunidade, espero, para toda a gente recuar, sentar-se, travar o que está a acontecer no terreno e, por fim, produzir um cessar-fogo para permitir o acesso da assistência humanitária e, com tempo, negociar uma solução política mais duradoura", disse Blinken.
Entre as condições apontadas pelo Governo etíope para eventuais conversações estão um cessar-fogo e o reconhecimento da legitimidade do Governo por parte da TPLF. Por sua vez, as forças do Tigray exigem o levantamento do bloqueio que cortou o acesso a alimentos, medicamentos e outra ajuda humanitária à região de cerca de seis milhões de pessoas e deixou centenas de milhares a enfrentar a fome.
Ameaça de sanções
Desde 18 de outubro que não chegam apoios por terra e 364 camiões continuam retidos na região de Afar à espera de autorização, segundo as Nações Unidas. Esta segunda-feira, entretanto, a ONU anunciou que vai fornecer cerca de 35 milhões de euros em fundos de emergência para as regiões do norte da Etiópia e para as regiões do sul afetadas pela seca.
"O atual Governo etíope está prestes a cair. Está-se a formar uma coligação de nove partidos políticos, incluindo a TPLF, para derrubar o Governo etíope e facilitar a transição", alertou num comunicado o líder rebelde Debretsion Gebremichael.
Na sexta-feira, os Estados Unidos avisaram que estão preparados para impor sanções ao Governo da Etiópia e às forças rivais da região do Tigray, caso recusem avançar para negociações. No mesmo dia, decretaram sanções económicas contra o exército e o partido no poder na Eritreia, pelo seu papel no conflito no país vizinho.
Com milhares de mortos, dois milhões de deslocados e receios crescentes do avanço dos rebeldes para a capital, a guerra na Etiópia ameaça atirar a frágil região do corno de África para a instabilidade.