Estadão Conteúdo
Responsável pela articulação política que entregou o comando do Congresso a aliados do Palácio do Planalto, o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, reagiu na segunda-feira, dia 8, a críticas sobre a aliança do presidente Jair Bolsonaro com o Centrão.
Ramos e Jair Bolsonaro | Agência Brasil/Reprodução |
O protagonismo e a vitória eleitoral do ministro, general de Exército da reserva, o fortaleceram no comando da relação com os parlamentares, mas geraram incômodo entre os militares.Um general disse que ele deveria se envergonhar. Mas Ramos rebate e, em entrevista ao Estadão, afirma que oficiais da ativa das Forças Armadas entendem o “momento político” do governo.
“Não me envergonho”, disse o ministro à reportagem. “Não tenho vergonha nenhuma, não. Tomei uma atitude coerente. Meu desprendimento de ter aberto mão da minha carreira no Exército mostra que estou a serviço do País. O governo hoje é do Bolsonaro, mas é do País.”
Para o ministro, os generais da ativa compreendem a situação do governo Bolsonaro, que levou à aliança com partidos do Centrão. O presidente conseguiu, ao abraçar o Centrão, blindar seu mandato de ameaças de impeachment e tenta destravar a própria pauta. Antes, o bloco governista era criticado pelo fisiologismo e chamado de “velha política” pelo presidente na campanha. Chegou a ser associado a “ladrão” no palanque de Bolsonaro, nas palavras do general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional.
“Tenho contato com vários generais, amigos meus, não há isso, não. Eles entendem que é o momento político, que estou cumprindo uma missão. Não há (constrangimento), muito pelo contrário”, afirmou Ramos.
Generais que serviram em cargos de confiança a Bolsonaro no Palácio do Planalto deixaram o governo desprestigiados, passando a uma postura de oposição a diversas frentes do governo, entre eles a gestão da Saúde na pandemia da covid-19. É o caso dos generais Santos Cruz, ministro antecessor na Secretaria de Governo, e Rêgo Barros, ex-porta-voz da Presidência, então integrante da equipe direta de Ramos.
“Tenho contato com vários generais, amigos meus, não há isso, não. Eles entendem que é o momento político, que estou cumprindo uma missão. Não há (constrangimento), muito pelo contrário”, afirmou Ramos.
Generais que serviram em cargos de confiança a Bolsonaro no Palácio do Planalto deixaram o governo desprestigiados, passando a uma postura de oposição a diversas frentes do governo, entre eles a gestão da Saúde na pandemia da covid-19. É o caso dos generais Santos Cruz, ministro antecessor na Secretaria de Governo, e Rêgo Barros, ex-porta-voz da Presidência, então integrante da equipe direta de Ramos.
“Não quero entrar no caminho de criticar a, b ou c. Agora, o general Rêgo Barros trabalhava comigo, estava dando tudo certo, sai e passa a criticar o governo. Santos Cruz trabalhava aqui, (sai) e passa a criticar o governo. Não tenho nada contra. Eles podem fazer isso”, afirmou Ramos.
O ministro Ramos se irritou, especialmente, com declarações do general da reserva do Exército Francisco Mamede de Brito Filho. Eles trabalhavam juntos e tinham bom relacionamento, argumentou o ministro. Brito comandou a 4ª Brigada de Infantaria Leve - Montanha, em Juiz de Fora (MG), enquanto Ramos era seu superior, comandante da 1ª Divisão de Exército, no Rio, em 2014. Em 2019, Brito foi chefe de gabinete no Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).
Brito afirmou que a quantidade de ministros militares incomoda não só quem está na reserva, mas também na ativa. “A imagem da instituição já está arranhada. Ficam do lado de um governo que comete as barbaridades que estamos presenciando”, afirmou Brito. Ele comentou diretamente o trabalho de Ramos, general quatro estrelas que articulou a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado. Como mostrou o Estadão, o gabinete de Ramos passou a ser visto como um QG (quartel general) das campanhas do Legislativo, onde eram acertados os repasses de verbas e cargos para o Centrão, o que Ramos nega. Cerca de R$ 3 bilhões em verbas extras foram distribuídas para contemplar 285 parlamentares.
“Não tem como dizer que ele está a serviço do País, ele serve ao governo. Se não se envergonha de ter feito isso, como não se envergonhou em outros eventos passíveis de constrangimento... Eles vão continuar, têm suas motivações”, disse Brito.
O general também lembrou que Bolsonaro prometeu a seus eleitores, em 2018, não ceder ao “toma lá, da cá”, a troca de cargos e verbas federais por votos no Legislativo: “O que está acontecendo agora é mais uma traição às promessas de campanha, mais uma que vai para o ralo. A política do toma lá, da cá é agora praticada de maneira aberta e escancarada. Considero um fato grave e, se eu estivesse no governo, ficaria muito constrangido e certamente estaria pensando em abandonar o barco”.
As declarações desagradaram o ministro de Bolsonaro. Ramos disse repudiar os comentários, que, para ele, expressam “desconhecimento” das funções de ministro. Ele criticou a forma como Brito deixou o Exército, em 2017, no cargo de general de Brigada, sem ser escolhido para promoção.
“O que me incomodou foi um general que trabalhou comigo, sabe meus valores, sabe que sou uma pessoa correta. Se ele acha que meu desempenho está tendo repercussão ruim no Exército, essas atitudes e declarações dele é que estão ficando ruins para ele. Deveria ter mais compromisso com a verdade”, afirmou o ministro. “Ele não tem lastro moral nenhum. Se alguém tem que ter vergonha, no caso, é o general Brito pela maneira como saiu do Exército, ao não ser promovido a general de Divisão. Foi uma grande decepção. Não quis passar o comando.”
Para o ministro, a prova de que ele não tem outras motivações ao permanecer no governo é que decidiu passar à reserva no ano passado, embora pudesse ficar na ativa até o fim deste ano. Houve forte pressão de colegas generais, incomodados com a presença de oficiais em atividade no primeiro escalão ministerial. Além de Ramos, o ministro de Minas e Energia, o almirante Bento Albuquerque, também pediu a reserva na Marinha e agora vê seu cargo cobiçado pela base do governo no Senado. A permanência do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, como general de Divisão na ativa ainda contraria o Alto Comando do Exército.
“Eu pedi reserva exatamente para não dar margem a comentários do tipo que ele fez. Comuniquei minha decisão ao comandante do Exército, o presidente nem era favorável, para que não haja nenhuma ilação como está havendo com Pazuello. Abri mão de estar no Exército por um ano e meio. Brinco que sou um trapezista que mandou tirar a rede de proteção embaixo. Estou ministro de Estado. Se o presidente decidir me trocar, vou para casa. Não tem prova maior de desprendimento do que isso”, afirmou Ramos.
Ele não quis comentar mudanças no governo para abrir espaço ao Centrão, que almeja ministérios e deve atingir ministros de carreira militar.
Como o Estadão mostrou, generais da ativa admitem, reservadamente, a expectativa de que a formação do governo seja de fato alterada. Eles também reconhecem certo constrangimento com a chegada do Centrão à primeira linha do governo, mas ponderam que “ainda é cedo” para saber no que a nova aliança vai dar.
Os oficiais dizem que o presidente estava “emparedado” e foi forçado a buscar amparo político, na base do fisiologismo. Também lembram que não será o primeiro governo a se aliar ao Centrão, apesar das promessas do presidente de não ceder à troca de cargos, e argumentam que o bloco pode dar sustentação à agenda de campanha.
O general de Exército Maynard de Santa Rosa, ex-secretário de Assuntos Estratégicos de Bolsonaro, afirmou que não considera saudável rotular um arranjo político inteiro como corrupto. Reconhece, porém, que existe esse preconceito com o bloco entre os militares. “Só vai ter problema se o Centrão confirmar o preconceito”, disse. “O que acontece fora do Exército não necessariamente influi na tropa, a não ser que haja interesses afetando os dois lados. O que pode afetar é a imagem da instituição na opinião pública.”