Anne Barbosa | CNN
Desde 2011, o Brasil participava da Unifil, força interina da ONU no Líbano, com o objetivo de impedir a entrada de armas e outros materiais ilegais no país. A presença nessas operações é considerada uma forma de projeção do poder nacional.
Fragata Independência F-44 | Divulgação |
O Ministério da Defesa aponta dois motivos para essa saída: priorizar o entorno estratégico e a dificuldade de manter esses navios operando em boas condições no Mediterrâneo.
Para o ex-embaixador Rubens Ricupero, a ausência de tropas do país acontece quando o Brasil aumenta ainda mais seu isolamento internacional e poderá trazer consequências para o país.
“O Brasil fica mais isolado e a saída dessas áreas de conflito, como o Oriente Médio, faz com que o país se torne mais provinciano, mais voltado pra dentro. Não aconteceu nada nos últimos 20 anos pra cá que justifique concentrar forças no Atlântico Sul”, disse.
O país vai continuar participando de oito das treze operações de paz da ONU, mas restarão apenas os capacetes azuis, como são chamados os peacekeepers, que trabalham como observadores militares em missões individuais, além dos civis e dos policiais. Isso acontece em países como Sudão do Sul, Congo e República Centro Africana.
“Vai ficar menos visível, mas certamente o Brasil ainda ocupa uma posição de prestígio no sistema ONU de paz e segurança internacional, mesmo sem a tropa da Unifil”, afirma Eduarda Hamann, pesquisadora e professora da FGV.
Investimento em queda
O investimento com manutenção de tropas no exterior tem sofrido queda nos últimos anos. Em 2016, o país destinou R$ 188,6 milhões para as forças de paz. Já em 2020, o valor caiu para R$ 68 milhões. Para 2021, a expectativa é de que sejam investidos apenas R$ 24 milhões. Enxugar o orçamento já estava nos planos do ministério da defesa antes da pandemia.
Pandemia nas missões
As missões de paz da ONU só existem com o consentimento dos países que as abrigam e acontecem quando uma nação não consegue administrar sozinha os seus conflitos e problemas, nunca são intervenções. Com a pandemia da Covid-19, a realidade desses países ficou ainda mais difícil.
As missões contam com três forças: a civil, a militar e a policial. São mais de 14 mil civis, 70 mil militares e cerca de 9 mil policiais em operações em todo o mundo. As mulheres, ainda que minoria, participam de todas as áreas das missões e por causa da pandemia, problemas específicos também surgiram.
“Houve o aumento de violência doméstica. As famílias ficaram convivendo bastante tempo em casa, então houve esse aumento da violência e a nossa forma de administrar foi o aumento das nossas patrulhas, onde a nossa presença inibia essa prática”, conta Darilene Monteiro, policial na Minusca, missão de paz na República Centro-Africana.
O país vive uma guerra civil desde 2012. Seu papel como policial, além de assegurar a proteção da população local, é também monitorar e relatar a situação dos mais vulneráveis.
A mais de seis mil e quinhentos quilômetros dali: uma cidade no meio do deserto. Menaka, na língua local, significa: ‘para onde vamos?’ No interior do Mali, está em andamento uma das missões em que o Brasil continua participando. Ela é considerada uma das mais perigosas da ONu e, desde que foi criada, em 2013, mais de 180 capacetes azuis foram mortos.
O brasileiro Francisco Osler trabalha há 25 anos nas Nações Unidas e chefia o escritório regional da Minusma, a missão de paz no Mali.
“A pandemia afetou diretamente, porque o nosso trabalho, principalmente no Mali, é direto com a população. Direto com o estado, com a representação, com a sociedade civil, com direitos humanos, grupos armados então muita interação física. De cara, logo com a pandemia, a primeira coisa foi essa ruptura do contato físico”, conta.
Cuidados específicos de higiene e distanciamento social se juntaram às atividades diárias. Em algumas situações isso significou ter de lidar com o vírus ao mesmo tempo em que enfrentavam grupos armados.