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O documento em questão apontou que o governo do primeiro-ministro australiano Scott Morrison tenta "torpedear" o acordo Rota da Seda no estado de Victoria, Austrália, e culpa Camberra por matérias "hostis ou antagônicas" sobre a China pela mídia australiana independente.
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"A China está com raiva. Se você fizer da China a inimiga, a China será a inimiga", afirmou um funcionário do governo chinês em uma entrevista coletiva em Camberra na terça-feira (17), segundo a agência de notícias The Sydney Morning Herald.
'Lista de reclamações' de Pequim
O dossiê conta com 14 disputas e foi entregue pela embaixada chinesa em Camberra aos meios de comunicação Nine News, The Sydney Morning Herald e The Age, em uma iniciativa diplomática que parece ter o objetivo de pressionar o governo de Morrison a reverter a posição da Austrália.
A lista de queixas inclui: financiamento do governo para pesquisa "anti-China" no Instituto Australiano de Política Estratégica, "escrutínio" a jornalistas chineses e cancelamento de vistos acadêmicos, "cruzadas" em fóruns multilaterais sobre assuntos da China em Taiwan, Hong Kong e Xinjiang, investigação independente sobre as origens da COVID-19, proibição da rede 5G da Huawei em 2018, e bloqueio de dez acordos de investimento estrangeiro chinês nos setores de infraestrutura, agricultura e pecuária.
O documento também inclui "alegações veladas contra a China em ataques cibernéticos sem qualquer evidência", e afirma que a Austrália foi o primeiro país sem presença marítima no mar do Sul da China a condenar as ações da China nas Nações Unidas, seguindo os EUA ao rotular as reivindicações da China sobre a área disputada como "ilegais", em julho deste ano.
No documento, a China também acusa os parlamentares australianos de "condenações ultrajantes do partido no poder na China, e ataques racistas contra os chineses ou asiáticos", após o senador liberal Eric Abetz ter exigido a testemunhas sino-australianas a condenar o Partido Comunista Chinês em um inquérito parlamentar.
O dossiê foi entregue pouco antes de o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, culpabilizar a Austrália pelo estado das relações entre os países em uma entrevista coletiva em Pequim.
Em uma ameaça direcionada à posição da política externa da Austrália, o funcionário chinês disse que se Camberra recuasse das políticas da lista, "seria propício para uma melhor atmosfera [política]".
"O lado australiano deve refletir sobre isso seriamente, em vez de se esquivar da culpa e desviar a responsabilidade", afirmou Zhao.
Contudo, a Austrália não recuou nas suas críticas, nem mesmo após meses de tensões traduzidos em uma escalada da retórica nacional chinesa, que proibiu a importação de produtos australianos.
O que está em jogo?
A China é responsável por até 40% das exportações da Austrália, e um em cada 13 empregos australianos, levando a uma crescente ansiedade entre empresários e diplomatas que lutam com objetivos concorrentes: equilibrar a segurança nacional da Austrália, manter uma barreira militar à agressão regional da China por meio de um novo acordo de defesa com o Japão e, ao mesmo tempo, manter abertas as linhas econômicas com a China.
Scott Morrison afirmou nesta quarta-feira (18) que a China não deve se sentir ameaçada pela assinatura de um tratado de defesa histórico entre a Austrália e o Japão, que abre caminho para as duas nações conduzirem mais exercícios militares conjuntos em todo o Indo-Pacífico. No final, Morrison esclarece que tal tratado contribui para a estabilidade na região.
Por outro lado, o presidente do Banco da Reserva da Austrália (RBA, na sigla em inglês), Philip Lowe, pediu, também nesta quarta-feira (18), que a Austrália mantivesse um relacionamento forte com a China.
Em seus comentários mais diretos sobre a disputa diplomática de bilhões de dólares até o momento, Lowe afirmou que era do interesse da economia que o relacionamento entre a Austrália e seu maior parceiro comercial voltasse aos trilhos.
De igual modo, o presidente-executivo da mineradora BHP, Mike Henry, disse durante o evento The Australian’s Strategic Forum que a Austrália era uma economia dependente das exportações.
"Embora [...] dependamos de países que agem de boa-fé, temos que garantir que estamos fazendo absolutamente tudo ao nosso alcance para garantir a prosperidade contínua da Austrália por meio do comércio e cooperação mutuamente benéficos", comentou Henry.
Em um sinal de que o governo australiano está tentando separar os resultados econômicos dos de segurança e militares, o secretário do Tesouro do país, Josh Frydenberg, disse nesta quarta-feira (18) que a Austrália estava pronta para entrar em diálogo "respeitoso e benéfico" com o Partido Comunista Chinês. Porém, acrescentou que, como parte de qualquer diálogo, o interesse nacional da Austrália seria "inegociável".
Os 14 itens identificados pelo documento da embaixada chinesa são vistos pelo Departamento de Relações Exteriores da Austrália como fundamentais para o interesse nacional do país e não são negociáveis, deixando os dois países diante da perspectiva de uma extensa disputa diplomática e econômica.