Cinco navios iranianos carregados com gasolina foram enviados para aliviar escassez do produto na Venezuela chavista. Provocação, solidariedade entre aliados ou oportunidade de negócios? Ou tudo isso?
Enrique Anarte | Deutsch Welle
Clavel, Florest, Faxon, Fortune e Petunia. Esses cinco nomes, que soam como o de cruzeiros de luxo no Caribe, são o novo foco do confronto diplomático entre os Estados Unidos e o Irã e que passa a ter a Venezuela como coadjuvante.
Os navios zarparam do Irã ao final da primeira quinzena de maio em direção à Venezuela. Nos porões: gasolina e derivados – uma carga avaliada em pelo menos 45 milhões de dólares. O combustível foi enviado para tentar aliviar a escassez do produto na Venezuela e ao mesmo tempo desafiar as sanções impostas pelos EUA. A carga é suficiente para um mês de consumo na Venezuela arrasada pela crise econômica.
Apesar de possuir as maiores reservas de petróleo do mundo, a Venezuela não tem conseguido produzir gasolina por causa da ruína da sua infraestrutura petrolífera, que vem sendo afetada pela crise, fuga de funcionários, corrupção e má gestão.
O primeiro navio, o Fortune, adentrou águas venezuelanas na noite de sábado (23/05), após passar por Trinidad e Tobago.
"Os navios da fraternal República Islâmica do Irã estão agora em nossa zona exclusiva econômica", tuítou Tareck El Aissami, vice-presidente Setorial da Economia da Venezuela e que acumula ainda a chefia das pastas do Petróleo e da Indústria.
A televisão estatal venezuelana mostrou imagens da chegada do navio e da aproximação de uma embarcação da Marinha venezuelana e de um avião militar que foram ao seu encontro.
A oposição a Nicolás Maduro, liderada por Juan Guaidó – reconhecido como presidente interino do país por mais de cinquenta países, incluindo a Alemanha e Brasil – denunciou que o envio dos navios é ilegal e pediu cooperação internacional para impedir que as embarcações continuem a viagem.
No entanto, não houve sinal de resposta imediata dos EUA, apesar de os iranianos e venezuelanos terem apontado que as embarcações foram observadas por navios de guerra e aviões americanos. Um porta-voz do Pentágono afirmou que não tinha conhecimento do episódio envolvendo as embarcações. Outra autoridade dos EUA, no entanto, disse que o país considerando tomar medidas.
A interminável crise econômica na Venezuela, que recentemente sofreu mais um abalo com a pandemia do coronavírus, também vem sendo exacerbada pelas sanções dos EUA. O governo Donald Trump vem aumentando a pressão sobre o regime chavista – chegou a oferecer uma recompensa pela captura de Maduro –, mas até agora não conseguiu remover a liderança bolivariana.
E onde se encaixa o envio dos navios pelo Irã, que também vem sendo pressionado por sanções impostas por Washington? Ajuda, oportunismo, provocação?
"São várias coisas", diz Víctor Mijares, professor de Ciência Política da Universidade dos Andes, na Colômbia, em entrevista à DW. "Existe uma situação de ajuda de um aliado." O Irã e a Venezuela mantêm relações muito estreitas desde a época de Hugo Chávez. "Mas agora também é uma oportunidade de negócios em um mercado deprimido, e o Irã está sofrendo as consequências dessa depressão", acrescenta Mijares.
Para Leonardo Bandarra, pesquisador em segurança internacional do Instituto de Estudos Regionais de Hamburgo (Giga), o estreitamento das relações entre Caracas e Teerã pode ser entendido como uma "externalidade" após o presidente americano Donald Trump ter promovido uma virada na política do antecessor Barack Obama, que buscou relaxar as tensões.
"Os dois adversários de Washington se unem para se apoiar mutuamente em relação à política da superpotência", diz Bandarra à DW. "Buscam permanecer mais estáveis em uma situação de crise". Segundo ele, é possível dizer que os EUA vem empurrando o país caribenho nessa direção: "A Venezuela tem poucas alternativas".
Enviar navios, no entanto, seria mais do que apenas um gesto humanitário ou oportunidade de bons negócios, diz Mijares: "Isso acaba sendo uma provocação inevitável". Inevitável porque entra na área de influência direta de seu grande rival geopolítico na região da América Latina. Na opinião do pesquisador, não é um gesto inocente: "Acho que o Irã está tentando testar quais podem ser as reações do governo Trump nessas circunstâncias. E a Venezuela também.”
A grande questão é como Trump reagirá a mais um episódio de tensão entre Washington e Teerã, desta vez com Maduro na equação. "Trump se manifestou contra isso, mas duvido que ele tome medidas. Ficaria surpreso", disse à DW Benedicte Bull, especialista em estudos latino-americanos da Universidade de Oslo.
Mijares concorda, argumentando que o governo dos EUA já tem problemas econômicos, políticos e de saúde domésticos suficientes "para correr mais um risco ”, especialmente em um ano eleitoral.
Ponte entre Golfo Pérsico e Caribe
"A situação mistura dois teatros de operações diplomáticas e militares para os Estados Unidos, que são o Golfo Pérsico e o Mar do Caribe, o Irã e a Venezuela", enfatiza Mijares. A equação da política externa é complicada, e, na sua opinião, "faria qualquer retaliação ser politicamente muito onerosa para os Estados Unidos ".
E como ficam os países europeus, muitos dos quais reconhecem Guaidó como presidente interino? Bull, de Oslo, acredita que "o covid-19 vai impedir que outros atores internacionais possam assumir algum papel nesse novo episódio de tensão." Também pesam diferenças de visão entre os EUA e os europeus.
"A União Europeia e os Estados Unidos estão de acordo sobre a questão venezuelana, mas não concordam sobre a questão iraniana", diz Mijares, lembrando que os europeus continuaram a apoiar o acordo nuclear com o Irã mesmo após a saída dos EUA. "O que é isso, uma questão iraniana ou venezuelana?”, pergunta.
Apesar de possuir as maiores reservas de petróleo do mundo, a Venezuela não tem conseguido produzir gasolina por causa da ruína da sua infraestrutura petrolífera, que vem sendo afetada pela crise, fuga de funcionários, corrupção e má gestão.
O primeiro navio, o Fortune, adentrou águas venezuelanas na noite de sábado (23/05), após passar por Trinidad e Tobago.
"Os navios da fraternal República Islâmica do Irã estão agora em nossa zona exclusiva econômica", tuítou Tareck El Aissami, vice-presidente Setorial da Economia da Venezuela e que acumula ainda a chefia das pastas do Petróleo e da Indústria.
A televisão estatal venezuelana mostrou imagens da chegada do navio e da aproximação de uma embarcação da Marinha venezuelana e de um avião militar que foram ao seu encontro.
A oposição a Nicolás Maduro, liderada por Juan Guaidó – reconhecido como presidente interino do país por mais de cinquenta países, incluindo a Alemanha e Brasil – denunciou que o envio dos navios é ilegal e pediu cooperação internacional para impedir que as embarcações continuem a viagem.
No entanto, não houve sinal de resposta imediata dos EUA, apesar de os iranianos e venezuelanos terem apontado que as embarcações foram observadas por navios de guerra e aviões americanos. Um porta-voz do Pentágono afirmou que não tinha conhecimento do episódio envolvendo as embarcações. Outra autoridade dos EUA, no entanto, disse que o país considerando tomar medidas.
A interminável crise econômica na Venezuela, que recentemente sofreu mais um abalo com a pandemia do coronavírus, também vem sendo exacerbada pelas sanções dos EUA. O governo Donald Trump vem aumentando a pressão sobre o regime chavista – chegou a oferecer uma recompensa pela captura de Maduro –, mas até agora não conseguiu remover a liderança bolivariana.
E onde se encaixa o envio dos navios pelo Irã, que também vem sendo pressionado por sanções impostas por Washington? Ajuda, oportunismo, provocação?
"São várias coisas", diz Víctor Mijares, professor de Ciência Política da Universidade dos Andes, na Colômbia, em entrevista à DW. "Existe uma situação de ajuda de um aliado." O Irã e a Venezuela mantêm relações muito estreitas desde a época de Hugo Chávez. "Mas agora também é uma oportunidade de negócios em um mercado deprimido, e o Irã está sofrendo as consequências dessa depressão", acrescenta Mijares.
Para Leonardo Bandarra, pesquisador em segurança internacional do Instituto de Estudos Regionais de Hamburgo (Giga), o estreitamento das relações entre Caracas e Teerã pode ser entendido como uma "externalidade" após o presidente americano Donald Trump ter promovido uma virada na política do antecessor Barack Obama, que buscou relaxar as tensões.
"Os dois adversários de Washington se unem para se apoiar mutuamente em relação à política da superpotência", diz Bandarra à DW. "Buscam permanecer mais estáveis em uma situação de crise". Segundo ele, é possível dizer que os EUA vem empurrando o país caribenho nessa direção: "A Venezuela tem poucas alternativas".
Enviar navios, no entanto, seria mais do que apenas um gesto humanitário ou oportunidade de bons negócios, diz Mijares: "Isso acaba sendo uma provocação inevitável". Inevitável porque entra na área de influência direta de seu grande rival geopolítico na região da América Latina. Na opinião do pesquisador, não é um gesto inocente: "Acho que o Irã está tentando testar quais podem ser as reações do governo Trump nessas circunstâncias. E a Venezuela também.”
A grande questão é como Trump reagirá a mais um episódio de tensão entre Washington e Teerã, desta vez com Maduro na equação. "Trump se manifestou contra isso, mas duvido que ele tome medidas. Ficaria surpreso", disse à DW Benedicte Bull, especialista em estudos latino-americanos da Universidade de Oslo.
Mijares concorda, argumentando que o governo dos EUA já tem problemas econômicos, políticos e de saúde domésticos suficientes "para correr mais um risco ”, especialmente em um ano eleitoral.
Ponte entre Golfo Pérsico e Caribe
"A situação mistura dois teatros de operações diplomáticas e militares para os Estados Unidos, que são o Golfo Pérsico e o Mar do Caribe, o Irã e a Venezuela", enfatiza Mijares. A equação da política externa é complicada, e, na sua opinião, "faria qualquer retaliação ser politicamente muito onerosa para os Estados Unidos ".
E como ficam os países europeus, muitos dos quais reconhecem Guaidó como presidente interino? Bull, de Oslo, acredita que "o covid-19 vai impedir que outros atores internacionais possam assumir algum papel nesse novo episódio de tensão." Também pesam diferenças de visão entre os EUA e os europeus.
"A União Europeia e os Estados Unidos estão de acordo sobre a questão venezuelana, mas não concordam sobre a questão iraniana", diz Mijares, lembrando que os europeus continuaram a apoiar o acordo nuclear com o Irã mesmo após a saída dos EUA. "O que é isso, uma questão iraniana ou venezuelana?”, pergunta.