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O Departamento de Estado dos EUA divulgou um relatório sobre a rivalidade com a Rússia e a China, em que indica ações a realizar contra os dois países, sem descurar completamente "compromissos diplomáticos" na área de segurança e paz internacional.
S-400 Triumph © Sputnik / Ministério da Defesa da Rússia |
O plano visa travar Moscou e Pequim de todas as maneiras possíveis, por os dois países alegadamente desafiarem a ordem mundial defendida pelos EUA.
Recomendações contra os dois países
A Rússia e a China são vistas pelo Departamento de Estado como rivais praticamente iguais, que ameaçariam a segurança nacional americana. Portanto, é necessário "se opor às suas tentativas de formar um mundo contrário aos valores e interesses dos EUA", aponta o relatório.
"[É necessário] impedir transferência de tecnologias perigosas implementando e apoiando controles de exportação de segurança nacional, revendo o investimento estrangeiro, monitorando vistos e outras abordagens para impedir os esforços desses concorrentes em adquirir tecnologia estrangeira e redirecioná-la para fins militares e de segurança", diz o documento.
"[É necessário] executar vendas de armas a fim de melhorar e apoiar as capacidades dos nossos parceiros para combater diretamente a influência maligna e a agressão da RPC [República Popular da China] e da Rússia", recomenda.
Esta abordagem tem precedentes: em 2014 Paris, sob a pressão de Washington, se recusou no último momento a entregar à Rússia dois porta-helicópteros da classe Mistral encomendados e já pagos por Moscou. Em 2015, a França aceitou devolver o dinheiro. Desde então, os EUA têm aplicado esforços para garantir que Moscou não receba tecnologia e produtos militares.
A empresa alemã Rheinmetall, que desde 2011 estava construindo um moderno centro de treinamento militar perto de Nizhny Novgorod (sul da Rússia), teve que parar temporariamente todos os trabalhos em 2014 sob pressão do governo, só concluindo os trabalhos no ano seguinte.
As sanções tiveram impacto nas cadeias de produção da indústria de defesa russa, mas acabaram estimulando a produção de análogos nacionais, provocando uma reviravolta na busca de parceiros comerciais no Oriente.
Coreia do Sul
"Acho que agora é a vez da Coreia do Sul, com a qual ainda temos um bom volume de negócios", disse Sergei Sudakov, membro correspondente da Academia de Ciências Militares russa, à Sputnik.
"Eles nos vendem, entre outras coisas, tecnologias de defesa [...]. Os EUA estão com ciúmes disso. A verdade é que Washington 'drena' todos os desenvolvimentos militares de alta tecnologia da Coreia do Sul. [A cota-parte das] inovações coreanas na defesa americana é de sete a dez por cento".
O especialista acredita que Washington vai pressionar Seul para eliminar ou enfraquecer significativamente sua cooperação com Moscou. Além disso, afirma que os EUA continuarão cortando os poucos os laços tecnológicos que restam entre a Rússia e os países da União Europeia.
Quem desobedecer, será punido com sanções, pois os Estados Unidos não estão habituados a considerar seus aliados como atores independentes na arena mundial, afirma.
A epopeia dos mísseis antiaéreos
O relatório do Departamento de Estado afirma que o desenvolvimento militar da Rússia está diretamente ligado ao comércio de armas.
Ou seja, o objetivo é bloquear os contratos de defesa da Rússia com outros países e forçar Moscou a sair do mercado mundial de armas.
A compra pela Turquia, país membro da OTAN, de sistemas de defesa antiaéreas russos S-400 poderia ser um elemento dessa estratégia. O acordo entre Ancara e Moscou provocou fortes críticas dos EUA.
Como resposta, as autoridades norte-americanas disseram que, nesse caso, a Turquia seria excluída do programa de produção do caça F-35 de quinta geração. O presidente Erdogan acabou não cedendo à pressão e completou a transferência.
Outro país que foi criticado pelos EUA foi a Índia, também por causa dos sistemas S-400. Moscou e Nova Deli acordaram a entrega à Índia de cinco baterias do sistema S-400, com 16 lançadores cada uma, no valor de US$ 5,43 bilhões (R$ 20,07 bilhões) em outubro de 2018.
Na última semana, Alice Wells, secretária de Estado adjunta para Relações da Ásia Central e do Sul, relatou, de acordo com a revista Business Today, que o Congresso "continua seriamente preocupado" com a possibilidade de Moscou lucrar com isso.
Ela deu a entender que, se a Índia passar a dispor dos sistemas de defesa aérea russos, a aquisição por Nova Deli de sistemas norte-americanos estaria fora de questão no futuro. Em 2018, este argumento ajudou Washington a impedir a entrega dos S-400 russos à Arábia Saudita.
Um caso semelhante ocorreu com a Indonésia, em que, apesar de o acordo de venda de caças Su-35E russos por US$ 1,1 bilhão (R$ 5,8 bilhões) ter sido assinado em fevereiro de 2018, os EUA ameaçaram apoiar a oposição se a transação avançasse. Washington ainda espera poder parar a chegada das aeronaves.
O último pacote de sanções norte-americanas contra as exportações militares russas entrou em vigor em 20 de fevereiro deste ano, aplicado à área nuclear, sistemas de mísseis e drones.
"As decisões das autoridades norte-americanas de limitar a exportação de produtos militares da Rússia são uma manifestação de concorrência desleal", disse na época Frants Klintsevich, membro do Comitê de Defesa do Conselho da Federação da Rússia, aos jornalistas. "Nosso país é autossuficiente na esfera da defesa. [...] Encontraremos sempre alguém com quem cooperar a nível internacional".
Desígnios contra a China
Em relação ao gigante asiático, Washington frustrou a compra da empresa ucraniana de construção de motores Motor Sich pela empresa chinesa Beijing Skyrizon Aviation.
Em março, o Comitê Antimonopolista da Ucrânia anunciou oficialmente a proibição do negócio, decisão que o presidente do país Vladimir Zelensky disse ter tomado levando em conta "potenciais violações da lei" por parte dos chineses e "problemas geopolíticos associados".
Em maio de 2017, Stepan Kubib, vice-premiê da Ucrânia, disse que a Motor Sich, juntamente com a Beijing Skyrizon Aviation Industry, construiria uma fábrica de motores de aeronaves em Chongqing, China. Além disso, a empresa chinesa concordou em adquirir o controle acionário da Motor Sich, prometendo em troca investir US$ 250 milhões (R$ 1,32 bilhão) no desenvolvimento da produção.
Em maio de 2019, o Departamento de Defesa dos EUA divulgou um relatório dizendo que a China pretende transformar suas forças armadas em uma máquina de guerra de primeira classe para competir com os EUA ao redor do mundo e possivelmente invadir Taiwan.
Desde então, Washington congelou um programa de ajuda militar de US$ 391 milhões (R$ 2,06 bilhões) para a Ucrânia. Pouco depois, uma visita de John Bolton, então conselheiro de Segurança Nacional do presidente dos EUA, motivou Kiev a abandonar o negócio, o que deteriorou suas relações com Pequim.
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