Três pessoas morreram durante um incêndio em um supermercado na madrugada deste domingo; 9.500 integrantes das Forças Armadas foram mobilizados para atuar contra os protestos.
O governo do Chile informou que três pessoas morreram durante um incêndio em um supermercado na madrugada deste domingo (20) na zona sul de Santiago. O incêndio aconteceu em meio aos protestos e saques que tomaram as ruas do país.
Militares patrulham ruas de Santiago neste domingo após forte onda de protestos que deixaram rastros de destruição em Santiago, no Chile — Foto: Ivan Alvarado/Reuters |
A prefeita de Santiago, Karla Rubilar, afirmou que duas pessoas morreram queimadas e a terceira vítima faleceu no hospital. Ela disse que o incêndio ao supermercado foi causado por manifestantes, segundo a Reuters.
As vítimas morreram em um incêndio registrado durante o saque a um supermercado da rede Líder - controlado pelo grupo americano Walmart. Os bombeiros controlaram as chamas após duas horas.
O Walmart Chile informou que fecharia suas lojas em todo o país depois que 60 delas foram danificadas pelos distúrbios em Santiago e arredores - Valparaíso, Antofagasta, Calama, Conceição, San Antonio e Temuco.
A capital Santiago, Valparaíso (centro) e Concepción (sul) estão sob esquema de segurança, com grande presença militar e policial, depois que o presidente Sebastián Piñera decretou um toque de recolher nas três regiões durante a madrugada deste domingo, o que não impediu os atos de violência.
O governo anunciou toque de recolher ainda em Rancagua, La Serena e Coquimbo. O general Javier Iturriaga, responsável por comandar o estado de emergência, já havia decretado a medida na capital Santiago e na região metropolitana após manifestantes continuarem nas ruas mesmo com a suspensão da alta na tarifa do metrô.
O Ministro de Defesa, Alberto Espina, afirmou que mais 9.500 integrantes das Forças Armadas foram mobilizados para atuar contra os protestos, principalmente para controlar pontos estratégicos como centrais de abastecimento de água, eletricidade e cada uma das 136 estações de metrô, que são alguns dos alvos mais visados pelos manifestantes.
"Estamos vivendo elevadíssimos níveis de delinquência e saques", afirmou Alberto Espina, ministro da Defesa. O governo também mobilizou militares nas regiões de O'Higgins e Coquimbo, igualmente afetadas pela violência.
É a primeira vez que Santiago é patrulhada por soldados desde o fim da ditadura do general Augusto Pinochet, em 1990.
Segundo o ministro do Interior, Andrés Chadwick, 716 pessoas foram presas em todo o país devido aos tumultos, enquanto 244 foram detidas por violar o toque de recolher. Além disso, ele não descartou a extensão do estado de emergência - em vigor na região da capital, Valparaíso, Bío Bío, Coquimbo e O'Higgins - para outras regiões, se necessário.
Universidades e escolas suspenderam as aulas nesta segunda-feira, mas os estudantes convocaram um novo dia de protestos.
Os supermercados e shoppings anunciaram que permaneceriam fechados neste domingo para evitar saques. O metrô está paralisado e quase não circulam ônibus pela cidade.
Os táxis e os carros que são chamados por aplicativos para celulares - com tarifas muito acima do normal - eram praticamente a única forma de deslocamento na cidade de 7 milhões de habitantes, que passou por dois dias de violência extrema.
Voos suspensos
No aeroporto da capital chilena, centenas de pessoas ficaram retidas - muitas dormiram no chão - com o cancelamento ou adiamento de voos.
Os voos operados pelas maiores companhias aéreas do Chile, a Latam e a Sky Airline, foram suspensos por causa do toque de recolher.
A Latam Chile twittou que, devido à situação da ordem pública, seus voos para dentro e fora de Santiago estavam sendo afetados. "Continuaremos a ajustar nossos itinerários de voos dentro e fora de Santiago nos dias 20 e 21 de outubro", disse pelo Twitter, acrescentando que os passageiros devem verificar seus voos antes de ir para o aeroporto.
Suspensão na alta da tarifa
Após a onde de protestos, o presidente chileno Sebastián Piñera anunciou no sábado a suspensão do aumento de 30 pesos (quase 20 centavos) na passagem de metrô na capital Santiago. "Escutei com humildade a voz de meus compatriotas e não terei medo de seguir escutando esta voz. Vamos suspender o aumento nas passagens do metrô", disse o presidente em uma transmissão.
O presidente se reunirá com seus ministros neste domingo para abordar a situação. Piñera também convocou uma mesa de diálogo "ampla e transversal" para atender às demandas sociais, que até o momento não apresentam um líder ou uma lista precisa de reivindicações. A Câmara dos Deputados também convocou uma sessão especial para este domingo.
Estado de emergência
Na sexta e no sábado, auge das manifestações, as forças de segurança foram esmagadas pela multidão: houve destruição em pontos diversos da capital, entre incêndios em estações de metrô, ônibus, concessionárias de carro e postos de gasolina, além de inúmeros saques em lojas, supermercados, bancos e hotéis.
Isso levou à declaração de emergência no sábado para confiar ao Exército o controle da situação em Santiago, ao qual o governo acrescentou as regiões de Valparaíso (centro), Concepción (sul), as comunas de Coquimbo e La Serena, na região de Coquimbo (norte) e a comuna de Rancagua, O'Higgins (centro).
Piñera disse que o objetivo da medida é voltar a recuperar a normalidade. "O objetivo deste estado de emergência é muito simples, mas muito profundo: garantir a ordem pública, a tranquilidade dos habitantes da cidade de Santiago, proteger bens públicos e privados e, acima de tudo, garantir os direitos de todos", disse.
Prejuízos a metrô passam de US$ 300 milhões
Os danos causados pelos protestos ao Metrô de Santiago ultrapassam US$ 300 milhões, anunciou neste domingo o presidente do metrô de Santiago, Louis de Grange. E há estações e linhas que levarão meses para voltar a funcionar.
O meio de transporte público, usado por cerca de 3 milhões de passageiros por dia, sofreu "uma destruição brutal", disse.
Pelo menos 78 estações da ferrovia metropolitana foram atingidas e algumas delas foram completamente destruídas. Três vagões foram completamente queimados, enquanto outros três foram severamente danificados.
As linhas 4 e 4-A, que vão ao sudeste de Santiago, são as mais afetadas e podem levar meses para voltar a funcionar.
O metrô não operou neste final de semana e ainda não está claro se voltará a operar - parcialmente - a partir desta segunda-feira.
A prioridade, segundo De Grange, é reativar a Linha 1, que atravessa de leste a oeste Santiago e transporta 40% dos passageiros todos os dias.
Além disso, cerca de 20 ônibus foram queimados nas manifestações.
Críticas a modelo econômico
As manifestações não têm um líder definido nem uma lista precisa de demandas. Até o momento aparece como uma crítica generalizada a um sistema econômico neoliberal que, por trás do êxito aparente dos índices macroeconômicos, esconde um profundo descontentamento social.
Aos gritos de "basta de abusos" e com o lema que dominou as redes sociais "ChileAcordou", o país enfrenta críticas a um modelo econômico em que o acesso à saúde e à educação é praticamente privado, com elevada desigualdade social, baixos salários em relação ao custo de vida, valores de pensões reduzidos e alta do preço dos serviços básicos. A força dos protestos abalou o governo de Piñera, que poucos dias antes havia afirmado que o Chile era uma espécie de "oásis" na região.
Piñera reconheceu que há "boas razões" para protestar, mas pediu uma "manifestação pacífica" e observou que "ninguém tem o direito de agir com violência criminosa brutal" em relação aos danos ao Metrô de Santiago.