Opção é tida como improvável, apesar de não ser descartada por EUA e pela oposição venezuelana. Mas consequências de uma ação que não tem precedentes na América do Sul seriam enormes e imprevisíveis.
Michael Knigge | Deutsch Welle
A recusa das forças militares leais a Nicolás Maduro em permitir a entrada de ajuda externa na Venezuela neste fim de semana levou a uma escalada da tensão na região, com os Estados Unidos insistindo que todas as opções estão sobre a mesa. Isso incluiria se envolver militarmente no conflito entre chavistas e a oposição.
Na segunda-feira, o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, que viajou à Colômbia para se encontrar com o presidente do país, Iván Duque, e Guaidó, anunciou novas sanções à Venezuela e prometeu que Washington permanecerá com Guaidó "até que a liberdade seja restabelecida" no país.
Enquanto isso, em Bruxelas, a União Europeia (UE) rejeitou nesta segunda-feira (25/02) uma intervenção armada no país. "Devemos evitar uma intervenção militar", disse a porta-voz da chefe da diplomacia da UE, Federica Mogherini.
Em Bogotá, o Grupo de Lima, que reúne vários países latino-americanos, incluindo o Brasil e a Colômbia, também descartou a intervenção militar e defendeu uma solução pacífica.
A rejeição aberta da UE e do Grupo de Lima à opção militar é oportuna, segundo analistas dos EUA, porque a probabilidade de uma intervenção americana aumentou desde o fim de semana.
"A opção militar é mais provável agora do que em qualquer outro momento desde o início da crise na Venezuela", avalia Michael Shifter, diretor do Inter-American Dialogue (IAD), um centro de estudos em Washington especializado no hemisfério ocidental.
"É mais provável agora do que era em 23 de fevereiro, porque o esforço para fazer entrar ajuda na Venezuela fracassou", concorda o cientista politico Gregory Weeks, da Universidade da Carolina do Norte.
Embora a probabilidade tenha aumentado para ambos os especialistas, que a coloca entre 30% e 40%, eles ainda avaliam uma intervenção dos EUA como improvável. Isso porque não há apoio na Europa e na América Latina.
"Sequer Bolsonaro, no Brasil, diz tal coisa", observa Weeks. Mas ele pondera que o atual clima político, que torna improvável uma intervenção, pode mudar rapidamente. "No momento, não temos uma faísca em especial", frisa o especialista. "Mas já vimos isso no passado. E isso é algo que eu acho que definitivamente aumentaria a chance e mudaria o cálculo da intervenção armada."
Tal "faísca" que poderia mudar o cálculo político pode ser o aumento da violência contra a oposição e de mortes em protestos, a prisão de Guaidó ou um ataque contra a equipe diplomática dos EUA na Venezuela.
Os efeitos seriam imprevisíveis. Embora Washington tenha um longo histórico de interferência na América Latina, nada seria comparável a uma intervenção armada na Venezuela para derrubar Maduro.
"Os EUA nunca enviaram tropas para derrubar um regime na América do Sul", diz Shifter, acrescentando que a intervenção armada de Washington no Panamá, há cerca de 30 anos, mencionada algumas vezes, não é uma comparação adequada.
"É um país muito menor e muito diferente, que teve laços muito mais estreitos com os EUA do que a Venezuela, o que tornou a intervenção de Washington, numa época muito diferente, comparativamente fácil", argumenta. "A Venezuela não é o Panamá", sublinha Shifter.
"Não acho que realmente tenhamos uma comparação à altura", diz Weeks, observando que os EUA tipicamente intervieram militarmente em países muito menores e muito mais dependentes, na América Central e no Caribe.
As repercussões negativas de uma intervenção militar dos EUA são tão grandes e imprevisíveis que ambos os estudiosos dizem ser contra essa opção.
"Atualmente, não há boas opções, porque até mesmo o aumento das sanções prejudicaria principalmente o cidadão venezuelano médio", avalia Weeks. "Ainda assim, eu acho que a opção militar seria a pior", opina, justificando que tal ação traria consigo mais violência e morte, sem garantia de sucesso.
Shifter avalia que os EUA seriam bem-sucedidos em derrubar militarmente o governo de Maduro, mas pondera que o maior problema viria depois. "Há diferentes tipos de milícias no país, o grupo guerrilheiro colombiano ELN opera na Venezuela e ainda há muitos chavistas que provavelmente estarão prontos a defender o que ainda veem como a revolução venezuelana", argumenta. Para ele, tudo isso representa uma mistura volátil e perigosa para uma força militar estrangeira.
"Algumas pessoas podem dizer que os EUA entrariam e se livrariam de Maduro, e todo mundo iria festejar e receber os EUA de braços abertos. E aí Guaidó presidiria um governo de transição, realizaria eleições e tudo seria muito simples e bom", diz Shifter. "Mas não tenho tanta certeza de que tudo sairia dessa maneira."