Washington reconheceu o líder da oposição e membro do partido Vontade Popular, Juan Guaidó, como presidente da Venezuela e aumentou a pressão contra o governo de Nicolás Maduro que, por sua vez, rompeu as relações diplomáticas com os EUA. Que consequências esse passo poderia ter para a oposição dividida?
Sputnik
Guaidó, cujo nome há algumas semanas era pouco conhecido para a maioria dos venezuelanos, é a pessoa que Washington, bem como vários países do Grupo de Lima, apoia como presidente da Venezuela, desconsiderando assim as eleições de maio de 2018.
Juan Guaidó © AP Photo / Fernando Llano |
A decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de reconhecer Guaidó "é mais um passo da oposição para conseguir alcançar a legalidade internacional", revelou o analista de relações internacionais argentino Pedro Brieger à Sputnik Mundo.
Para o analista, embora a oposição a Maduro "tenha capacidade de mobilizar muita gente", mas "pensavam que através das mobilizações poderiam derrubar o governo de Nicolás Maduro e fracassaram".
Desta vez, "o contexto internacional é mais favorável à oposição", opinou Brieger. "Vários países formaram o Grupo de Lima para ajudar à queda de Nicolás Maduro e conseguir um governo favorável aos setores da direita venezuelana", afirmou ele.
"Isso deu à oposição um impulso para declarar que agora há um presidente interino com o objetivo de criar um governo paralelo, obter o reconhecimento internacional e afirmar que o único representante legítimo da Venezuela é Juan Guaidó", analisou o especialista.
Isto é acompanhado por medidas tomadas por vários países latino-americanos, como a decisão do Chile de não convidar o embaixador da Venezuela a uma recepção no Ministério da Relações Exteriores do Chile porque o país não reconhece o governo de Maduro, revelou Brieger.
Por enquanto, a situação é incerta: "Maduro não tomou nenhuma medida contra Guaidó. É muito pouco comum que alguém se declare presidente interino de um país, desafiando todas as leis. Até agora, o governo também não dissolveu a Assembleia Nacional, há experiências históricas de governos paralelos, algumas tiveram êxito, outras fracassaram", explicou o analista.
Entretanto, o que é incomum é que a oposição se apressou a declarar esse homem como presidente interino. Segundo Brieger, "é uma medida muito arriscada, o tudo ou nada, e parece que os setores [de oposição] mais radicais estão arrastando os mais moderados que estavam dispostos a dialogar".
"Voltamos à velha Doutrina Monroe do quintal e os EUA se comportando como o dono da região, ditando quem é legítimo e quem não é, e o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, reconhecendo Guaidó como presidente interino", disse Brieger.
Além disso, o analista avisou que "há uma armadilha no que pretende a oposição, porque propõem eleições, mas ninguém garante que venceriam essas eleições". "Se eles perderem, reconhecerão o presidente chavista? Algo que nunca reconheceram quando perderam", opinou ele.
Quanto à situação nas Forças Armadas do país, Brieger acredita que deve haver descontentamento, mas já um golpe militar é outra coisa: "Já houve um precedente em 2002, quando houve um golpe de Estado que destituiu o presidente Hugo Chávez durante 48 horas, e as massas populares saíram às ruas para restituí-lo. O chavismo tem uma capacidade de mobilização muito forte, o panorama não é simples, se está brincando com o fogo, e o que os EUA fazem é colocar mais lenha na fogueira", concluiu o analista.
Na quarta-feira (23), Guaidó se declarou "presidente encarregado" da Venezuela. Os EUA, União Europeia e uma série de países da América Latina, inclusive o Brasil, manifestaram apoio a Guaidó e à oposição venezuelana. Rússia, Cuba, México, Bolívia, Nicarágua, Turquia e Irã apoiam a permanência de Maduro.
Moscou declarou que seu posicionamento sobre o reconhecimento de Nicolás Maduro como presidente legítimo da Venezuela não mudaria, assinalando que a postura dos países ocidentais mostra a forma como eles encaram o direito internacional, a soberania e a não interferência nos assuntos internos de outros países.