As razões que teriam motivado a saída dos EUA da Síria podem ser financeiras, disseram analistas sírios à Sputnik, explicando como a retirada americana afetará Turquia e Israel, além dos aliados europeus de Washington que permanecem no país árabe.
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Mesmo o presidente americano, Donald Trump, tendo prometido anteriormente a saída das forças militares, a retirada das tropas americanas do país sírio pegou muitos de surpresa. Até porque, no início de setembro, o representante especial dos EUA na Síria, James Jeffrey, deixou claro que as forças militares norte-americanas "não desistiriam até o fim do ano", além da administração de Trump declarar que manteria 2.200 soldados na região por tempo indeterminado.
CC0 / Staff Sgt. Jacob Connor / 5th Special Forces Group (Airborne) |
Surge a questão se essa medida repentina foi devido à promessa de Trump de sair assim que derrotasse o Daesh (grupo terrorista proibido na Rússia e em outros países), ou se houve outros motivos que levaram à retirada precoce.
"Podemos especular e aparecer com muitas razões; o mais importante para um pragmático fiscal como Trump talvez seja o fator custo financeiro real", disse à Sputnik o analista político sírio Ghassan Kadi.
"Trump não parece preparado para se envolver em ação militar a menos que alguém esteja pagando por isso, e este não é o caso na Síria. [Trump] é empresário e dirige os EUA como uma corporação com uma declaração de lucros e perdas e investidores para agradar", adicionou.
Segundo Kadi, essa abordagem "não é necessariamente uma coisa ruim para o mundo, porque os governos anteriores desperdiçaram trilhões dos contribuintes americanos para destruir o mundo". Além disso, ele destacou que nada ocorreu na região para que os EUA tomassem tal decisão, "a menos que Trump e Erdogan tenham fechado um acordo".
No entanto, de acordo com o analista, "a menos que Trump prometesse entregar suas posições às tropas turcas, sua retirada da Síria deixaria a Turquia em posição de desvantagem em Idlib".
Já o analista político sírio Christopher Assad, acredita que os americanos tenham perdido o interesse já que as operações militares na Síria, Iraque e Afeganistão não beneficiavam os EUA de maneira nenhuma, além de não fazer nenhum progresso em relação à "neutralização" desses países. Segundo Assad, o efeito acabou sendo contrário, e a "decisão americana de apoiar os curdos no norte da Síria, acabou de fato fazendo com que os EUA ganhassem outro inimigo na região".
Ambos os analistas chamaram atenção para o fato de que, mesmo que os EUA saiam da Síria, eles manterão presença militar no Qatar e no golfo Pérsico.
"Afinal, [Estados Unidos da] América estão em estado de atrito, e eu não acredito que eles tenham verba para manter o mesmo nível de presença militar que têm no exterior por muito mais tempo. Dito isso, não acredito que os EUA vão deixar sua base do Qatar e posições navais no golfo em breve", disse Kadi.
De acordo com Christopher Assad, "também é preciso dizer que o papel de Trump como presidente é manter a economia de seu império acima da superfície".
"Portanto, embora ele [Trump] possa remover as tropas do Afeganistão […] não poderá em nenhuma circunstância abandonar completamente o Oriente Médio, porque o Irã está tão bem nas instalações militares dos EUA e permanece o alvo mais cobiçado do Império".
Em meio à retirada americana, o presidente francês Emmanuel Macron prometeu continuar apoiando a milícia curda no norte da Síria.
"A França é uma potência nuclear […] mas não tem mais o poder geopolítico e militar que acredita ter. Se a França decidir substituir os EUA na Síria, como [Paris] poderia ter sucesso onde EUA falharam?", retoricamente questionou Kadi.
Para Kadi, "a Rússia é o único poder que tem o respeito e a confiança de todas as partes relevantes" para "patrocinar mediações justas e apropriadas".
Além disso, o especialista acredita que "uma retirada americana unilateral pode enfraquecer a posição de Israel e alavancar a negociação de uma retirada iraniana. No entanto, isso reforçará ainda mais a posição da Rússia como a única potência que pode intermediar futuras negociações de paz".
Christopher Assad acha o contrário, e enfatiza que "os israelenses estão em uma situação vantajosa, porque podem continuar a semear a instabilidade e instigar a violência tanto no Irã quanto na Síria".
"O movimento de Trump, embora possa ser bom para os sírios, certamente encorajará tanto Israel quanto a Turquia, cada um por razões opostas […] libertará as mãos da Turquia para lidar com o problema curdo e dará aos israelenses, britânicos e franceses a justificativa para continuar a busca de uma política beligerante contra a Síria, usando os sírios curdos como um ardil", concluiu Assad.