Ministro Aloysio Nunes seria recebido pelo presidente egípcio no Cairo, onde uma comitiva de empresários brasileiros já o aguardava. Cancelamento é visto como primeira reação árabe a declarações pró-Israel de Bolsonaro.
Deutsch Welle
O governo do Egito cancelou uma visita oficial que o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Aloysio Nunes, faria ao país árabe nos próximos dias. O governo brasileiro foi informado sobre a decisão nesta segunda-feira (05/11), às vésperas da viagem, algo atípico na diplomacia.
Ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes foi comunicado da decisão às vésperas de embarcar para o Egito |
O Egito justificou que precisou adiar o encontro – sem apresentar uma nova data – por problemas na agenda de autoridades do país. O gesto, contudo, foi entendido como uma retaliação a declarações recentes pró-Israel feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro.
O capitão da reserva anunciou que pretende seguir os passos dos Estados Unidos e transferir a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, reconhecendo assim a cidade como capital do Estado israelense. A ideia não é bem vista pela comunidade árabe.
Segundo o jornal Folha de S. Paulo, diplomatas relataram que a Liga dos Países Árabes chegou a enviar uma nota à embaixada brasileira no Cairo rechaçando as declarações de Bolsonaro.
Os compromissos oficiais de Aloysio Nunes no Egito estavam marcados para esta semana, entre os dias 8 e 11 de novembro. Na capital, ele se reuniria com o presidente egípcio, Abdel Fattah el-Sisi, e com o ministro do Exterior, Sameh Shoukry.
Na mesma ocasião ocorreria ainda um encontro entre representantes do setor privado de ambos os países. Um grupo de 20 empresários brasileiros já estava no Egito à espera do ministro e terá que retornar ao Brasil sem a rodada de negociações.
Segundo a imprensa brasileira, a visita de Aloysio e da comitiva de empresários ao Cairo foi um convite que partiu do próprio governo do Egito, um dos principais parceiros comerciais do Brasil no Oriente Médio. De janeiro a setembro, o país exportou 1,5 bilhão de dólares ao Egito, com um superávit de 1,33 bilhão de dólares para o Brasil quando subtraídas as importações.
O país também mantém laços comerciais importantes com os governos do Oriente Médio. Juntos, esses países são responsáveis por 5,3% das exportações do Brasil e são o segundo maior comprador de proteína animal brasileira. Em 2017, as exportações somaram 13,5 bilhões de dólares, com um superávit de 7,17 bilhões de dólares.
Diplomatas árabes chegaram a alertar colegas brasileiros de que o país poderá sofrer retaliações comerciais caso a transferência da embaixada prometida por Bolsonaro seja confirmada.
A intenção do presidente eleito, por outro lado, foi elogiada pelo primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, que classificou a decisão de "um passo histórico, correto e emocionante". Ele foi um dos líderes que telefonou para Bolsonaro após a eleição para parabenizá-lo pela vitória.
Na ligação, o premiê também fez um convite a Bolsonaro para uma visita a Israel, e o capitão da reserva prometeu ir assim que sua saúde melhorar – ele está se recuperando de uma facada que levou durante um ato de campanha em Juiz de Fora em setembro.
Netanyahu pretende ainda comparecer à cerimônia de posse do novo governo em 1º de janeiro em Brasília. Se acontecer, será a primeira visita de um chefe de governo israelense ao Brasil desde a criação do Estado, em 1948.
A mudança da embaixada brasileira para a cidade disputada entre israelenses e palestinos marcaria uma ruptura na tradição de neutralidade diplomática mantida durante muitos anos pelo Brasil em relação ao conflito entre os dois povos.
O país mantém relações diplomáticas com Israel desde 1949 e, em 2010, reconheceu o Estado Palestino com as fronteiras de 1967, anteriores à Guerra dos Seis Dias entre países árabes e israelenses.
Foi durante essa guerra que israelenses ocuparam o setor oriental de Jerusalém. Israel considera a cidade sua capital "única e indivisível", ainda que essa alegação não seja reconhecida pela ONU. Os palestinos, por sua vez, reivindicam Jerusalém Oriental como capital de seu almejado Estado.