Marinha do Brasil terá apenas 5 navios de escolta até 2022, caso não surja alguma compra de oportunidade
Por Alexandre Galante e Roberto Lopes | Forças de Defesa e Poder Naval
O amontoado de navios cinzentos em diferentes atracadouros do entorno da cabeceira da pista principal do Aeroporto Santos Dumont, na Baía da Guanabara (RJ), impressiona.
Em tempos normais isso poderia simbolizar – ou traduzir – o potencial operativo da mais importante Esquadra sul-americana.
Mas para as Forças Armadas brasileiras em geral, estes não são tempos normais.
Ou são tempos de uma “normalidade” também cinzenta, pautada pela escassez; pelo envio de oficiais observadores, no lugar de navios, a simulações de guerra de importante conteúdo instrutivo; pelo aumento dos exercícios “na carta” ou nos simuladores; e até pela necessidade de economizar os víveres levados a bordo, antes de uma travessia.
Exército e FAB (Força Aérea Brasileira) também adotaram, há tempos, a rotina dos treinamentos virtuais. Mas na Marinha do Brasil (MB) o esforço de expandir a tecnologia dos simuladores é quase uma obsessão.
Faz-se de tudo para não se dispender recursos com combustível, lubrificantes, alimentos e munição no mar.
A possibilidade de uma emergência com uma das unidades da Força de Submarinos (ForSub) da Esquadra é pequena, entre outros motivos, porque os submarinos raramente saem “fora da barra”, para cumprir missões em mar aberto…
Hoje a ForSub tem dois submarinos considerados “operacionais” (Tupi e Tapajó) e três em diferentes níveis de manutenção.
O desinteresse da iniciativa privada em fabricar baterias para os submarinos 209, de tecnologia alemã, é um problema para o qual a MB ainda busca solução.
A Marinha dos Estados Unidos mantém um programa de adestramento para as tripulações dos seus submarinos nucleares, que consiste no enfrentamento dissimilar com submersíveis de ataque diesel-elétricos (convencionais). Na interação com as marinhas sul-americanas que (a custo zero) se dispõem a figurar como sparrings da US Navy, esses exercícios recorrem, quase sempre, a submarinos do Peru e da Colômbia – que, nessa parte do continente, são os que aparentam oferecer maior disponibilidade.
O Chile oferta um número menor de submarinos para o treinamento. No fim da fila estão a Armada do Equador e a MB – com um litoral imenso e uma Força de Submarinos que pouco se move.
Há, contudo, imobilismos ainda mais danosos. À superfície.
Vírus
Mas para as Forças Armadas brasileiras em geral, estes não são tempos normais.
Ou são tempos de uma “normalidade” também cinzenta, pautada pela escassez; pelo envio de oficiais observadores, no lugar de navios, a simulações de guerra de importante conteúdo instrutivo; pelo aumento dos exercícios “na carta” ou nos simuladores; e até pela necessidade de economizar os víveres levados a bordo, antes de uma travessia.
Exército e FAB (Força Aérea Brasileira) também adotaram, há tempos, a rotina dos treinamentos virtuais. Mas na Marinha do Brasil (MB) o esforço de expandir a tecnologia dos simuladores é quase uma obsessão.
Faz-se de tudo para não se dispender recursos com combustível, lubrificantes, alimentos e munição no mar.
A possibilidade de uma emergência com uma das unidades da Força de Submarinos (ForSub) da Esquadra é pequena, entre outros motivos, porque os submarinos raramente saem “fora da barra”, para cumprir missões em mar aberto…
Hoje a ForSub tem dois submarinos considerados “operacionais” (Tupi e Tapajó) e três em diferentes níveis de manutenção.
O desinteresse da iniciativa privada em fabricar baterias para os submarinos 209, de tecnologia alemã, é um problema para o qual a MB ainda busca solução.
A Marinha dos Estados Unidos mantém um programa de adestramento para as tripulações dos seus submarinos nucleares, que consiste no enfrentamento dissimilar com submersíveis de ataque diesel-elétricos (convencionais). Na interação com as marinhas sul-americanas que (a custo zero) se dispõem a figurar como sparrings da US Navy, esses exercícios recorrem, quase sempre, a submarinos do Peru e da Colômbia – que, nessa parte do continente, são os que aparentam oferecer maior disponibilidade.
O Chile oferta um número menor de submarinos para o treinamento. No fim da fila estão a Armada do Equador e a MB – com um litoral imenso e uma Força de Submarinos que pouco se move.
Há, contudo, imobilismos ainda mais danosos. À superfície.
Vírus
No agrupamento dos navios cinzentos atracados no AMRJ e na BNRJ na Ilha de Mocanguê em Niterói, se espalha, como um vírus invisível, insidioso, o germe da indisponibilidade.
O Decreto nº 3.682, de 6 de dezembro de 2000, que modificou a Estrutura Organizacional da Esquadra, deixou ao Comando da Força de Superfície a seguinte composição:
Também subordinado ao Comando da Força de Superfície, o porta-aviões São Paulo foi desmobilizado em fevereiro do ano passado. O prejuízo para a Esquadra (ou para a Aviação Naval) foi grande, mas um golpe de sorte – a desativação do porta-helicópteros HMS Ocean, capitânia da Marinha Real Britânica – colocou esse moderno navio no colo da MB, que agarrou a oportunidade. Em agosto de 2018, o navio porta-helicópteros multipropósito Atlântico (A140) estará no Rio.
Saudado internamente como uma mudança de patamar operacional para a Marinha Brasileira, o Atlântico, para os esquadrões de escolta da Força, constitui apenas mais um problema.
Rigorosamente despojados de embarcações sofisticadas, como as fragatas (ou destróieres) de Defesa Antiaérea, os esquadrões de escolta vão precisar se desdobrar para interagir, no mar, com o porta-helicópteros Atlântico.
Casco
O Decreto nº 3.682, de 6 de dezembro de 2000, que modificou a Estrutura Organizacional da Esquadra, deixou ao Comando da Força de Superfície a seguinte composição:
- Comando do 1º Esquadrão de Escolta (ComEsqdE-1) – que tem sob sua subordinação as Fragatas Classe Niterói.
- Comando do 2º Esquadrão de Escolta (ComEsqdE-2) – com as Fragatas Classe Greenhalgh, Corvetas Classe Inhaúma e a Corveta Barroso.
- Comando do 1º Esquadrão de Apoio (ComEsqdAp-1) – que conta com o Navio Doca Multipropósito Bahia, Navio Desembarque de Carros de Combate Mattoso Maia, Navio-Tanque Almirante Gastão Motta e os Navios Desembarque de Carros de Combate Classe Garcia D’Avila.
- Navio-Escola Brasil e o Navio-Veleiro Cisne Branco
Também subordinado ao Comando da Força de Superfície, o porta-aviões São Paulo foi desmobilizado em fevereiro do ano passado. O prejuízo para a Esquadra (ou para a Aviação Naval) foi grande, mas um golpe de sorte – a desativação do porta-helicópteros HMS Ocean, capitânia da Marinha Real Britânica – colocou esse moderno navio no colo da MB, que agarrou a oportunidade. Em agosto de 2018, o navio porta-helicópteros multipropósito Atlântico (A140) estará no Rio.
Saudado internamente como uma mudança de patamar operacional para a Marinha Brasileira, o Atlântico, para os esquadrões de escolta da Força, constitui apenas mais um problema.
Rigorosamente despojados de embarcações sofisticadas, como as fragatas (ou destróieres) de Defesa Antiaérea, os esquadrões de escolta vão precisar se desdobrar para interagir, no mar, com o porta-helicópteros Atlântico.
Casco
No Comando do 1º Esquadrão, a fragata Niterói (F40) já é, há tempos, tratada, informalmente, como apenas mais um casco cinzento.
Há cerca de dois anos que o navio vem perdendo componentes necessários a outros navios de igual projeto (Vosper Mk.10). Seu valor militar resume-se, portanto, à sua capacidade de navegar, e, eventualmente, oferecer uma sensação de “navio de guerra de verdade” aos Aspirantes da Escola Naval.
A Defensora (F41), a “Deusa” para seus tripulantes – mantém-se na condição de figura etérea, espécie de miragem.
Há cerca de dois anos que o navio vem perdendo componentes necessários a outros navios de igual projeto (Vosper Mk.10). Seu valor militar resume-se, portanto, à sua capacidade de navegar, e, eventualmente, oferecer uma sensação de “navio de guerra de verdade” aos Aspirantes da Escola Naval.
A Defensora (F41), a “Deusa” para seus tripulantes – mantém-se na condição de figura etérea, espécie de miragem.
Fragata Defensora F41 |
Imobilizado desde o primeiro semestre de 2010, o navio vem sendo submetido a um longo processo de recuperação, que só no ano passado foi acelerado. Diferentes previsões do Centro de Comunicação Social da Marinha acerca da devolução do navio à rotina operativa caíram no vazio. E esse PMG atrasadíssimo ainda não tem, nem mesmo, um cronograma firme de provas de mar.
Veterano de quatro comissões na Força-Tarefa Marítima da UNIFIL (Força Interina das Nações Unidas no Líbano), o “Corsário” – como a fragata União (F45) é conhecida – “abriu o bico”.
O navio tem sérios problemas de propulsão, eixo e acoplamento de fluído (acoplamento hidrodinâmico para transmissão de potência, por meio da energia cinética produzida pelo fluído de trabalho, seja ele água ou óleo).
A Constituição (F42) já está fora do rodízio organizado pela Força de Superfície para atender o compromisso de presença da MB no Líbano. Com mais de 3.000 dias de mar, o navio tem a sua propulsão comprometida, e, segundo uma informação de fontes do Poder Naval, passará todo o seu sistema de Comunicações (SISCOMFRAG) para a Defensora.
Aposta
Os navios Niterói, União e Constituição estão fora do programa de revitalização que a Marinha prepara para tentar estender a vida útil das três outras classe Niterói – Defensora, Liberal e Independência – por mais 15 anos.
A meta estabelecida pela Diretoria Geral de Material da Marinha (DGMM) é considerada, até mesmo por alguns chefes navais, como irrealista.
As fragatas Liberal e a Independência serão mantidas no rodízio da UNIFIL. A Defensora ainda precisará provar que é mesmo uma “Deusa”…
O retorno de duas corvetas classe Inhaúma ao setor operativo é outra das promessas da Marinha, que vem sendo feita desde 2014, e a vida real teima em não respaldar.
A meta estabelecida pela Diretoria Geral de Material da Marinha (DGMM) é considerada, até mesmo por alguns chefes navais, como irrealista.
As fragatas Liberal e a Independência serão mantidas no rodízio da UNIFIL. A Defensora ainda precisará provar que é mesmo uma “Deusa”…
O retorno de duas corvetas classe Inhaúma ao setor operativo é outra das promessas da Marinha, que vem sendo feita desde 2014, e a vida real teima em não respaldar.
Corveta Júlio de Noronha |
Segundo fontes consultadas pelo Poder Naval, a corveta Jaceguai (V31) se encontra em situação ainda pior que a Júlio de Noronha (V32), parada há cerca de uma década. Informações extraoficiais dão conta de que o antiquado computador de controle de armas (Weapon System Automation, WSA) e o sistema de comando e controle do navio (Computer–Assisted Action Information System, CAAIS) – um must à época em que foi projetado, na década de 1970 – apresentam problemas em seu funcionamento, e sofrem com a falta de sobressalentes.
No Comando do 2º Esquadrão de Escolta, as duas fragatas Type 22 Batch I – Greenhalgh e Rademaker – tem vida útil estimada em mais quatro anos (outra meta que exigirá um esforço inaudito dos especialistas em manutenção).
Fragata Rademaker |
Fontes do Poder Naval consideram que a Rademaker teria condições de ser escalada para o rodízio nas costas do Líbano.
O navio apresenta consumo de óleo combustível elevado, mas esse gasto é, aparentemente, compensado pelo baixo consumo de óleo lubrificante.
Oficiais ouvidos pelo blog argumentam, entretanto, que os sensores do navio são muito antigos, e o seu armamento não está inteiramente disponível.
Novo patamar
A verdade é que, no que tange a escoltas, a MB mudou de patamar histórico. Para pior, bem entendido.
A Força que, entre os anos de 1960 e de 1980 alinhava de 12 a 18 escoltas não terminará a década de 2020 com mais de oito – isso, obviamente, no caso de o Almirantado não se munir de vontade ou encontrar recursos para comprar navios usados, “de oportunidade”.
A Marinha está atenta às ofertas das diferentes marinhas – caso, por exemplo, das Type 23 britânicas –, mas, hoje, devido à escassez de verbas, essas compras parecem impossíveis.
Atualmente a Força de Superfície dispõe, no papel, de 11 escoltas, mas só seis têm condições de navegar, com restrições importantes na capacidade de usar os armamentos.
A MB vem licitando a compra de materiais para aumentar essa disponibilidade e, na medida do possível, recuperar alguns sistemas de armas que ainda têm chance de voltar a operar. Mas é certo que algumas dessas armas permanecerão somente como enfeites, até a desincorporação dos navios.
Uma realidade constrangedora, triste, mas que é impossível esconder.
Caso não surja nenhuma compra “de oportunidade” até o ano de 2022, a Força de Superfície estará restrita a três fragatas Classe Niterói (FCN), uma corveta (Barroso) e, possivelmente, uma corveta Classe Inhaúma (CCI).
Com o início da incorporação das embarcações Classe Tamandaré (sejam elas corvetas ou fragatas leves), a partir de 2022 a força de Escoltas crescerá, mas não muito.
Com as desincorporações previstas para a próxima década, ela dificilmente irá superar o grupo dos oito navios, o que parece irrisório para os compromissos da Esquadra Brasileira no Atlântico Sul – ainda mais com o virtual desaparecimento da capacidade de patrulha da Marinha Uruguaia e com o apequenamento da frota argentina.
A chamada Flota de Mar até agora não conseguiu iniciar o processo de obtenção de quatro navios-patrulha oceânicos franceses tipo L’Adroit, e, entre outras difíceis decisões, já admite que não terá dinheiro para modernizar as suas corvetas Classe A69, compradas também à França antes ainda da Guerra das Malvinas. Esses navios continuarão a operar do jeito que for possível, até o momento em que nada mais for possível fazer para que suspendam da Base Naval de Puerto Belgrano.
Na Marinha do Brasil, a “ficha” ainda não caiu.
Oito escoltas é um número inacreditavelmente pequeno. Bom para a Marinha do Chile, por exemplo, mas muito abaixo do patamar histórico da Esquadra brasileira no passado.
Para oficiais amigos do Poder Naval, é difícil aceitar que a Força de Superfície da MB continue a operar, pelos próximos dez ou 11 anos, sem importar ao menos dois ou três navios de 2ª mão (quatro seria o número mais adequado).
Internamente, os escalões superiores da Força consideram que uma eventual compra de usados deve ser feita com muito cuidado, para que os economistas cinzentos (nunca identificados) de plantão na Praça dos Três Poderes, em Brasília, não percam, repentinamente, a vontade de financiar o programa das unidades Classe Tamandaré.
Vamos rezar.
A Força que, entre os anos de 1960 e de 1980 alinhava de 12 a 18 escoltas não terminará a década de 2020 com mais de oito – isso, obviamente, no caso de o Almirantado não se munir de vontade ou encontrar recursos para comprar navios usados, “de oportunidade”.
A Marinha está atenta às ofertas das diferentes marinhas – caso, por exemplo, das Type 23 britânicas –, mas, hoje, devido à escassez de verbas, essas compras parecem impossíveis.
Atualmente a Força de Superfície dispõe, no papel, de 11 escoltas, mas só seis têm condições de navegar, com restrições importantes na capacidade de usar os armamentos.
A MB vem licitando a compra de materiais para aumentar essa disponibilidade e, na medida do possível, recuperar alguns sistemas de armas que ainda têm chance de voltar a operar. Mas é certo que algumas dessas armas permanecerão somente como enfeites, até a desincorporação dos navios.
Uma realidade constrangedora, triste, mas que é impossível esconder.
Caso não surja nenhuma compra “de oportunidade” até o ano de 2022, a Força de Superfície estará restrita a três fragatas Classe Niterói (FCN), uma corveta (Barroso) e, possivelmente, uma corveta Classe Inhaúma (CCI).
Com o início da incorporação das embarcações Classe Tamandaré (sejam elas corvetas ou fragatas leves), a partir de 2022 a força de Escoltas crescerá, mas não muito.
Com as desincorporações previstas para a próxima década, ela dificilmente irá superar o grupo dos oito navios, o que parece irrisório para os compromissos da Esquadra Brasileira no Atlântico Sul – ainda mais com o virtual desaparecimento da capacidade de patrulha da Marinha Uruguaia e com o apequenamento da frota argentina.
A chamada Flota de Mar até agora não conseguiu iniciar o processo de obtenção de quatro navios-patrulha oceânicos franceses tipo L’Adroit, e, entre outras difíceis decisões, já admite que não terá dinheiro para modernizar as suas corvetas Classe A69, compradas também à França antes ainda da Guerra das Malvinas. Esses navios continuarão a operar do jeito que for possível, até o momento em que nada mais for possível fazer para que suspendam da Base Naval de Puerto Belgrano.
Na Marinha do Brasil, a “ficha” ainda não caiu.
Oito escoltas é um número inacreditavelmente pequeno. Bom para a Marinha do Chile, por exemplo, mas muito abaixo do patamar histórico da Esquadra brasileira no passado.
Para oficiais amigos do Poder Naval, é difícil aceitar que a Força de Superfície da MB continue a operar, pelos próximos dez ou 11 anos, sem importar ao menos dois ou três navios de 2ª mão (quatro seria o número mais adequado).
Internamente, os escalões superiores da Força consideram que uma eventual compra de usados deve ser feita com muito cuidado, para que os economistas cinzentos (nunca identificados) de plantão na Praça dos Três Poderes, em Brasília, não percam, repentinamente, a vontade de financiar o programa das unidades Classe Tamandaré.
Vamos rezar.