Parlamentar iraniano afirma que o seu país permanecerá vinculado ao acordo de 2015 se a Europa resistir às pressões dos EUA.
Abel Coelho de Morais | Diário de Notícias
"Israel iniciou um jogo muito perigoso" ao realizar a operação militar da noite de quarta-feira para ontem sobre alvos alegadamente iranianos "em território sírio", afirmou ontem em Lisboa o presidente da Comissão de Política Externa e Segurança Nacional do Parlamento de Teerão, Alaeddin Boroujerdi, que se encontra de visita a Portugal para contactos bilaterais.
Presidente da Comissão de Política Externa e Segurança Nacional do Parlamento de Teerão, Alaeddin Boroujerdi | Reprodução |
Alaeddin Boroujerdi, que falava num encontro com jornalistas, desmentiu que os alvos visados na operação israelita fossem iranianos, nomeadamente da força Al-Quds dos Guardas da Revolução, que está envolvida ao lado do regime de Bashar al-Assad na guerra civil síria. "Não foram alvos iranianos" que foram atingidos, disse de forma taxativa. Prosseguiu, afirmando que se deve esperar uma resposta cada vez mais firme da parte da Síria perante a repetição de ataques desta natureza, que qualificou como serviço prestado à Administração de Donald Trump "para desviar a atenção da opinião pública mundial" da decisão do presidente americano em desvincular os EUA do tratado sobre o nuclear do Irão.
Boroujerdi salientou que as ações de Israel podem conduzir a uma situação de guerra aberta no Médio Oriente e, com isso, "mudar" toda a conjuntura internacional. E deixou no ar a ideia de que o resultado final pode não ser favorável a Israel, evocando o caso da guerra de 2006 no Sul do Líbano, em que o exército israelita enfrentou as forças do movimento xiita Hezbollah. Ainda que seja considerado uma vitória de Israel, o nível de resistência e de eficácia do Hezbolllah foi bastante superior ao inicialmente antecipado.
Na questão do acordo nuclear, Boroujerdi disse que a decisão de Trump revela que os Estados Unidos se tornaram "num país no qual não se pode confiar". Trump "quebrou a norma" de que um tratado internacional é para cumprir e que devem existir razões muito fortes e reais para a sua denúncia, considerou o político iraniano. Por outro lado, pensa que a "Europa está perante uma situação histórica" se souber resistir "às pressões dos EUA" para a Alemanha, França e Grã-Bretanha, os outros signatários de 2015 (além da China e Rússia), também se desvincularem do acordo. Boroujerdi disse esperar que essas pressões sejam "muito fortes" e - repetindo uma ideia já expressa pelos principais dirigentes de Teerão - que a Europa "precisa de dar garantias práticas", mostrando que tenciona cumprir a sua parte do acordo, e não deixou de salientar que Portugal espera que o documento assinado em Viena, a 14 de julho de 2015, permaneça em vigor.
Quanto à posição do seu país no acordo, o deputado iraniano deixou em aberto diferentes cenários: Teerão permanecerá vinculado, desde que existam as "garantias práticas" antes referidas. Neste quadro, o Irão "ficará no acordo enquanto a Europa cumprir a sua parte". Mas também poderá tomar decisão em sentido contrário, caso considere comprometidos os seus "interesses nacionais".
Ainda sobre a questão do nuclear recusou qualquer paralelismo do Irão com a Coreia do Norte: este país dotou-se da bomba atómica, o que Teerão não fez nem fará, assegurou Boroujerdi. Para o dirigente iraniano, o elemento central da defesa nacional é o programa de mísseis balísticos, que não é negociável. Este programa é um dos elementos que Trump pretende incluir em eventuais novas negociações sobre o nuclear iraniano.
No quadro da deslocação do parlamentar iraniano, além de contactos com deputados portugueses, aquele esteve reunido com responsáveis do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Ministério da Administração Interna, elementos da associação de amizade Portugal-Irão e outras personalidades, com o objetivo de reforçar as relações bilaterais.