Benedito Monteiro lutou nas trincheiras contra a ditadura Vargas.
Para ele, memória da luta é que mantém a honra de quem se foi.
Poliana Casemiro | G1 Vale do Paraíba e Região
Benedito Monteiro carrega uma memória valiosa. Ele é um dos poucos combatentes da Revolução de 1932 ainda vivos. Há 84 anos, ele estava nas trincheiras lutando contra a ditadura do então presidente Getúlio Vargas. Aos 101 anos, o morador de Cruzeiro, no Vale do Paraíba, se empenha em manter viva a memória do combate daquele 9 de julho.
Benedito Monteiro participou da Revolução de 1932 (Foto: Tucandira Monteiro/ Arquivo Pessoal) |
A Revolução Constitucionalista de 32 começou depois do golpe de Estado que colocou Getúlio Vargas na presidência. Os paulistas não o reconheciam e queriam uma constituinte, o que motivou o conflito. Foram três meses de conflito entre São Paulo e o resto do país.
Benedito tinha quatro meses de farda e menos de 18 anos quando foi chamado para o combate. Inexperiente, contou que à época a emoção de representar um ideal era o que o encorajava. “Nós lutávamos contra uma ditadura. Não sabia muita coisa ainda, mas eu me orgulhava do uniforme e da causa”, afirmou.
O militar viveu momentos de tensão nas trincheiras, viu muitos de seus amigos morrerem, mas se diz de consciência tranquila. “Acredito piamente que não matei ninguém nesse combate. Reconhecia a importância da causa, mas nada me fazia entender matar um amigo, outro brasileiro como eu. Colocava minha arma para cima e atirava para afugentar os inimigos, mas não matei ninguém”, garantiu.
Monteiro lutou em várias cidades do Estado, entre elas Cruzeiro. A cidade faz fronteira com Minas Gerais por um túnel ferroviário. Para evitar que as tropas inimigas invadissem São Paulo pelo local, a cidade foi palco de vários combates.
A historiadora Claudia Ribeiro, responsável pelo museu em memória da revolução, explica que a cidade perdeu cerca de 600 combatentes no local. “O túnel trouxe muitos militares para Cruzeiro para impedir invasão de tropas. O local foi palco de tiroteios e explosões. A história da cidade é marcada com o sangue derramado de uma causa legítima”, conta.
Além dos confrontos, foi em Cruzeiro que, depois de três meses de revolução, foi assinado o armistício que colocou fim ao conflito e o compromisso da constituinte.
Lendas
Na cidade, a revolução deixou, além dos fatos, lendas urbanas. Uma das histórias conta que do túnel é possível ouvir os brados de guerra e tiros dos combatentes. Nas paredes, quem toca os sulcos pode ouvir os gritos de socorro dos que perderam a vida no combate. “A revolução é parte da história da população local, são espaços e lendas urbanas fazem parte da cultura popular. Elas remontam a história da época até hoje”, disse Claudia.
Monteiro viu muitos combatentes morrerem e presenciou momentos de risco, mas acredita que ele e outros sobreviveram para não deixar essa história morrer.
“A revolução é triste por quem se foi, mas não podemos nos esquecer de onde ela nos levou. Não quero que essa memória morra, isso é o que mantém a honra de quem se foi”, diz. Benedito Monteiro é autor do livro ‘A farda e a partitura’, em que traz memórias da época. Benedito tinha menos de 18 anos quando foi
chamado para o combate
(Foto: Arquivo Pessoal/Benedito Monteiro)