No início desta semana o ministro das Relações Exteriores da Turquia, Mevlut Cavusoglu, efetuou uma declaração, na qual anunciou que a Turquia concordou com o uso, pela milícia curda Peshmerga do Iraque, do território turco para ajudar Kobane. Até agora Ancara não só não intervinha nos acontecimentos, como não permitia que os curdos turcos ajudassem a cidade cercada de Kobane.
Yuri Mavashev | Voz da Rússia
O que provocou esta iniciativa de Ancara? Porque autorizou a Turquia o auxílio a Kobane apenas por parte das unidades curdas iraquianas? Pavel Shlykov, historiador, orientalista e professor da Universidade de Moscou partilhou sua opinião com a Voz da Rússia:
“Na minha opinião, existem duas razões principais que podem explicar isso. Uma consiste em que Ancara se dá conta que, existindo uma intervenção por parte dos EUA, se a Turquia não participasse, ela iria perder a face. Assim, os turcos querem minimizar suas perdas numa situação em que os restantes protagonistas regionais já tomaram a iniciativa.
“A segunda razão está relacionada com a primeira. O problema é que as perdas e riscos que Ancara irá sofrer, se ocorrer a queda de Kobane, poderão afetar a segurança nacional da Turquia. Todos se recordam da dimensão dos protestos da população curda que ocorreram em muitas cidades da Turquia há várias semanas. Aliás, neles participaram igualmente estudantes turcos. Eu recordo os acontecimentos dos anos 60 e 70 na Turquia, quando protestos estudantis provocaram uma crise política no país.”
Eis o que pensa a esse respeito outro dos nossos interlocutores, o presidente da Associação Russa de Solidariedade e Cooperação com o Povo Curdo Yuri Nabiev:
“Para entender esse passo de Ancara, temos de perceber quais são os curdos que serão ajudados. Se trata de desertores do exército sírio de Bashar Assad que se deslocaram para Arbil, no Iraque. Assim, para a Turquia é vantajoso fornecer um corredor a essas unidades. Assim, a Turquia não terá de deslocar suas próprias tropas para resolver o problema do Estado Islâmico, mas fazê-lo pelas mãos de cidadãos sírios de origem curda já será politicamente seguro, porque estes atraem muito menos atenções que o exército turco.
“É importante referir que Ancara não tem nada contra os curdos apoiantes de Massoud Barzani, o presidente do Curdistão iraquiano. Entre Arbil e Ancara já se estabeleceram há muito tempo relações bilaterais construtivas. Além disso, esses apoiantes de Barzani fazem parte da oposição síria apoiada por Ancara.
“Também não podemos descurar o fato de o presidente Barzani ter igualmente boas relações com Washington. Até os ataques aéreos dos EUA contra o Estado Islâmico foram uma iniciativa sua. Até o armamento largado pelos norte-americanos em Kobane era proveniente do Curdistão iraquiano.”