Nesta sexta-feira, dia 1 de agosto, Israel e Palestina entraram formalmente em trégua formal de três dias após quase um mês de escalada do conflito. O cessar-fogo começou às 8h locais (1h em Brasília). Só para terminar abruptamente umas horas depois.
Vladimir Kultygin | Voz da Rússia
O primeiro dia da trégua foi precedido por uma noite de tiros, em que foram mortos pelo menos 15 palestinos.
E umas horas depois de iniciada a trégua, surgiram informações de um ataque de projéteis da parte do Hamas. O exército de Israel estava proibido de realizar ações militares salvo em casa de defesa. Fontes governamentais comentaram que “esperavam que desta vez, o Hamas aceitasse e cumprisse a trégua”. Além disso, um militar israelense foi capturado na manhã desta sexta-feira. Essas ações foram caraterizadas por Israel como “infração da trégua”, e houve um tiroteio intenso entre as partes.
Em vista disso, Israel informou o Egito sobre a sua recusa de manter negociações de paz antes que o militar seja entregue de volta. Depois, os combates reiniciaram. Segundo o Hamas, pelo menos cinco palestinos morreram durante um ataque aéreo israelense.
Trégua mal iniciada
Segundo a declaração oficial, citada por agências internacionais de notícias, um dos objetivos da trégua é humanitário. Os civis na Faixa de Gaza poderão receber ajuda humanitária e “ter a oportunidade de realizar atividades vitais”, como o enterro dos mortos, ajuda médica e psicológica aos feridos e reforço de estoques de alimentos”.
Além disso, a trégua deverá facilitar as negociações no Cairo. Tal declaração foi feita pelo secretário de Estado norte-americano, John Kerry. O objetivo desses encontros é viabilizar uma pacificação na região, com a ajuda do Egito e dos EUA.
Conforme várias estimativas, a deste julho é a ofensiva mais sangrenta de Israel em toda a história do conflito contra o Hamas. 1.428 pessoas já foram mortas do lado da Palestina, com mais de 8 mil feridos. E o site do Ministério da Defesa de Israel informa sobre “pelo menos 2.968 mísseis” disparados contra o Estado judeu desde o início da operação Margem Protetora. Mas o número de vítimas do lado de Israel é muito menor do que do lado da Palestina: entre militares, 56 soldados das Forças de Defesa de Israel foram mortos desde o início da operação.
A ofensiva de Israel contra a Palestina, alegada pelo país como “resposta” à agressão do Hamas, suscitou críticas e ações drásticas. Uma delas foi a retirada de seus embaixadores por um grupo de países da América do Sul. O Equador foi o primeiro, em 18 de julho. Depois, foi o Brasil, no dia 23. O Peru, o Chile e El Salvador retiraram os seus embaixadores do país judeu em 30 de julho, no quadro da 46ª cúpula do Mercosul, em que foi também declarado apoio “incondicional” à Argentina, na sua luta com os “fundos abutres”.
Segundo Gelia Filatkina, jornalista e professora na Faculdade de Jornalismo da Universidade Estatal de Moscou, tal reação latino-americana não significa quebra das relações diplomáticas, senão uma mostra de atitude frente às ações de Israel:
“Cada dos cinco países latino-americanos tem as suas próprias razões para a retirada de embaixadores, mas são parecidos na sua essência: estes países condenam as ações dos militares israelenses contra a população palestiniana, porque elas contradizem as normas do direito internacional e vão em contra do principal argumento de legítima defesa, que é o princípio do uso proporcional da força. A retirada de embaixador não significa quebra das relações diplomáticas, agora se trata somente do rebaixamento do seu estatuto. E, além disso, do protesto explícito de todo um grupo de países latino-americano s contra a política atual de Israel e contra o apoio deste Estado por parte dos EUA. É de notar que os países da América Latina tomam frequentemente decisão comum quando se trata de retirada de embaixadores. Por exemplo, tal foi o caso de julho do ano passado, quando o avião do presidente boliviano Evo Morales foi forçado a pousar em Viena porque vários países da Europa pensaram que o bordo presidencial podia levar também Edward Snowden”.
Porém, antes da trégua, os EUA começaram a se mostrar críticos a Israel. Na imprensa estadunidense, como The New York Times, The Los Angeles Times e outras edições, surgem notícias condenando a exageração militar do país. “Tem-se lamentado muito os mísseis do Hamas que chocam com o sistema de defesa antiaérea israelense Cúpula de Ferro. Mas terrorismo é usar violência para impor uma condição política. Terrorismo é Israel cercando um povo porque esse povo votou a favor de um governo de que Israel não gosta”, diz Ahdaf Soulif, em um artigo do jornal The Los Angeles Times.
A ONU, que já tem acompanhado com certa cautela as trocas de tiros entre a Faixa de Gaza e Israel, ficou indignada nesta semana, após um ataque à escola patrocinada pelas Nações Unidas, em que se escondia um grupo de civis. Agora, o acordo de armistício foi saudado muito por Ban Ki-moon, secretário-geral desta organização. Contudo, na tarde da quinta-feira, o primeiro-ministr o israelense Benjamin Netanyahu declarou que o exército iria destruir o resto dos “túneis de terror” (túneis subterrâneos supostamente usados pelo Hamas para ações terroristas contra Israel). “De modo nenhum eu vou me conformar com uma proposta que impeça o exército de terminar esta tarefa primordial”, disse Netanyahu no dia 31, citado pela Itar-Tass. A destruição de túneis subterrâneos foi o principal pretexto para começar a operação terrestre na Faixa de Gaza, em 17 de julho.
Danos colaterais
A retirada de embaixadores por parte de cinco países da América Latina provocou uma irritação da diplomacia de Israel. Notavelmente, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Estado judeu, Yigal Palmor, respondeu a esta ação do Brasil chamando o “gigante” de “anão diplomático”. A mídia brasileira mostrou discrepância interna, com uns jornalistas adotando a expressão se referindo às relações com outros países, e outros (a maioria) criticando a atitude de Israel. “Anão diplomático não mata crianças”, diz, por exemplo, uma manchete no Brasil Post.
A expressão soa muito também no âmbito da corrida presidencial no Brasil, mas na qualidade de um bon mot, palavra de ocasião agora em moda.
Israel não é o único país que virou no final de julho alvo de tensão diplomática. Vários países da União Europeia, como a Espanha, a França e a Grécia, retiraram os seus embaixadores da Líbia, onde a situação está piorando. A delegação da UE evacuou a sua representação de Trípoli para a Tunísia. O Brasil também transferiu a sua missão militar para o país africano vizinho. Isto se deve a uma nova escalada de tensão que iniciou em meados do mês passado.