No Afeganistão foi de novo cancelada a divulgação de resultados da segunda volta das eleições presidenciais. Em vez de 2 de julho, um balanço prévio será feito em 7 de julho e os resultados finais serão apurados e tornados públicos em 24 de julho.
Andrei Fedyashin | Voz da Rússia
Segundo anunciou um dos principais candidatos, antigo ministro das Relações Exteriores, Abdullah Abdullah, ele não reconhecerá resultados do escrutínio na sequência de mais de 2 milhões falsificações. De acordo com avaliações prévias, na segunda volta venceu o seu principal rival, ex-ministro das Finanças, Ashraf Ghani Ahmadzai, embora no primeiro turno, ele tivesse um atraso de 11%.
Hoje, Cabul está empreendendo esforços para convidar os dois candidatos à mesa de conversações e impedir que a disputa eleitoral se redunde numa “contenda quente”, o que é bem possível.
Por estranho que possa parecer, todos os países do Oriente Médio que, nos últimos 14 anos, foram alvo dos “esforços democráticos” dos EUA, ora estão degradando, ora estão em chamas de guerra civil. O Afeganistão constitui uma parte integrante deste elo decadente .
Para o Afeganistão, em que os EUA marcam sua presença desde 2001, as polémicas eleitorais não são uma coisa extraordinária. Desde que Washington começou a fazer-lhe “injeções democráticas” por meios militares, as eleições presidenciais e parlamentares nunca tiveram um desfecho feliz, sem escândalos e a recontagem de votos. O país poderia continuar “coxeando” se não fosse a iminente retirada das tropas dos EUA, agendada para os finais desse ano. Este é um fator de peso, capaz de mudar radicalmente o quadro.
Segundo peritos russos que conhecem bem as artimanhas da política externa afegã, o Afeganistão corre o risco de “implodir” dentro de meses, como foi no caso do Iraque, Líbia e Síria. Em resultado das “experiências” dos EUA, o país se fragmentou em muitos “principados” autônomos.
Atualmente, os EUA têm de lidar com os grupos criados e armados outrora por eles no Afeganistão, na Líbia, Síria e do Egito, comenta o perito Vladimir Isaev:
“Não obstante a assistência prestada aos novos regimes, ela vem fomentando a cisão e leva ao surgimento de novos problemas. A Líbia foi destruída e se dividiu em três partes. O Iraque também irá desmoronar-se em três ou quatro partes. O Afeganistão, embora “de jure” exista, “de fato”, está constituído de emirados afegãos. Assim, estamos perante um fenômeno de desestruturação de Estados únicos e a sua desintegração em fragmentos que procuram estruturar suas relações por meio da força militar”.
O Afeganistão, depois da retirada do contingente norte-americano, poderá vir a repetir o destino do Iraque em que os islamistas radicais estão controlando mais um terço do país.
É evidente que os EUA gostariam de ver nesses países regimes leais. Mas estão atuando como se fosse um médico não graduado que em vez de operar no apêndice começa a cortar pernas. Os EUA procuram mudar os regimes e as forças políticas sem olhar para os meios, constata o analista Serguei Demidenko:
“A estratégia dos EUA foi contraproducente. Foi alcançado um objetivo contrário. A região ficou perturbada. A intervenção foi feita sem tomar em conta as caraterísticas específicas dos países da região, destinados à reforma. Não foram considerados os fatores religioso, econômico e social”.
Deve haver muita presunção e ignorância para tentar reestruturar os países à sua maneira para edificar um “novo Oriente Médio”.
Na primeira fase, isto foi feito por neoconservadores durante a presidência de George Bush júnior. Agora tudo isso continua a cargo de neoconservadores no Departamento de Estado sob o governo de Barack Obama. Os métodos utilizados são idênticos, diz o politólogo Viacheslav Mutuzov:
“Se assiste a uma troca constante de regimes e a instalação de novos regimes obedientes a Washington. Basta referir um exemplo do Egito, em que os EUA, mediante uma tentativa de golpe de Estado, tentaram levar ao poder e levaram por algum tempo a Irmandade Muçulmana. Veja-se a Síria que foi praticamente demolida por múltiplos extremistas apoiados pelos EUA através da Turquia”.
O mais surpreendente no exemplo afegão é que, em termos políticos, ambos os candidatos à presidência não se distinguem muito. Ambos se opõem ao Taliban. Ambos estão dispostos a assinar com os EUA um acordo na área de segurança.
Abdullah se mostra mais contra a presença no Afeganistão de tropas estrangeiras. Ashraf Ghani Ahmadzai defende mais as posições pró-americanas depois de se formar por várias universidades dos EUA e ter trabalhado no Banco Mundial em Washington.