O descontentamento dos círculos empresariais norte-americanos com as sanções antirrussas, decretadas pela administração de Barack Obama, acabou por se revelar em plena medida.
Andrei Fedyashin | Voz da Rússia
As duas maiores entidades empresariais dos EUA - a Associação Nacional de Produtores (NAM) e a Câmara do Comércio – divulgaram, em 26 de junho, um comunicado conjunto nas principais edições dos EUA e da Grã-Bretanha. O seu conteúdo se resume ao seguinte: as sanções económicas unilaterais contra a Rússia causarão prejuízos a empresas norte-americanas, favorecendo, ao mesmo tempo, os seus concorrentes.
A ideia fundamental da declaração é: se o presidente dos EUA tem reclamações pessoais ou políticas em relação a Vladimir Putin, o mundo de negócios não tem nada a ver com isso. Mais uma ideia expressa no comunicado não é menos importante: em virtude das sanções, as empresas dos EUA irão perder os contatos de negócios existentes, podendo tal lacuna ser preenchida por empresas europeias. “Seremos afastados do mercado não por um ou dois anos, mas sim por décadas”, frisa a nota.
Em outras palavras, os empresários dos EUA estão cientes de que seus colegas da Europa já não pretendem introduzir o terceiro pacote de sanções antirrussas. Eles estão à espera de um passo nefasto que Washington pode dar declarando sanções económicas unilaterais.
As conversas travadas por europeus sobre sanções não passam de um blefe para acalmar o presidente Obama. Os tempos da Guerra Fria estão no passado e a Europa entende que sanções irão atirar pela culatra, podendo danificar as relações sólidas com a Rússia, sustenta o analista, Yuri Solozobov:
“As sanções não têm nem terão sentido desde que não sejam aplicadas no sector energético. Todavia, tais medidas causarão prejuízos à Europa no valor de trilião de euros. Os EUA irão ganhar com isso por terem desejado criar uma zona de comércio livre com um parceiro fraco. A UE compreende que, desta forma, os EUA querem pô-la de joelhos”.
Ora, a declaração vem ainda cristalizando sérios receios do mundo de negócios dos EUA quanto à política da administração na vertente ucraniana.
Desde a primavera, os empresários temem que, no domínio das relações com a Ucrânia, a Casa Branca esteja a praticar uma espécie de “vendeta”. As ameaças constantes de introduzir novas sanções contra Moscou parecem ter prejudicado o próprio presidente Obama que, apesar de perder a Putin na esfera de política externa, procura pretextos de “vingança política”. Veja-se suas falhas no Oriente Médio, na Ucrânia e na China. O fracasso dos planos de “amputar” a Ucrânia e a Crimeia, criar ali uma rede de bases militares da OTAN e uma dura reação de Moscou acabaram por transtornar o presidente Obama no sentido político e, pelo visto, psicológico.
O problema é que a administração de Obama não evoluiu, ficando no século XX. As autoridades dos EUA não compreendem coisas elementares: o mundo mudou e quer edificar o sistema de segurança internacional através de coalizões e não a partir de um alicerce unipolar, como o pretendem fazer Washington, salienta o politólogo, Dmitri Abzalov. Em sua óptica, é nisso que reside o maior problema para Barack Obama, totalmente desnorteado:
“Até que ponto ele continuará sendo refém da sua política externa rígida, até que ponto poderá manter autonomia, até que ponto poderá sacrificar a sua boa imagem para entrar na história como um pacificador ou um presidente amante de paz – são estes os maiores desafios que Obama está enfrentando agora. Seja o que for, eu não descarto a possibilidade de normalização das relações russo-norte-americanas. Tudo depende de sagacidade do presidente dos EUA. Para já, a sua política tem sido fruto da miopia política dos seus conselheiros que não conseguem ver dois passos à frente”.
O comunicado foi redigido pelo presidente da Associação Nacional de Produtores (NAM), Jay Timmons, e o chefe da Câmara do Comércio, Thomas Donohue.
Para compreender melhor o atual e eventual efeito da declaração conjunta, convém recordar quem são estas duas entidades influentes.
A NAM é uma organização empresarial mais antiga e mais potente, integrando hoje mais de 14 mil companhias e corporações industriais de grande porte, responsáveis pela produção de artigos no valor superior a 1,8 triliões de dólares.
A Câmara do Comércio reúne 3 milhões de empresas que atuam em todos os setores económicos dos EUA.