Putin pediu a grupos pró-Rússia na Ucrânia que adiem referendo polêmico
Daniel Sandford
Da BBC News, em Moscou
A onda de violência no leste ucraniano tem sido acompanhada de muitas demonstrações de indignação por parte de Moscou, mas de poucos indícios sobre as estratégias do presidente russo, Vladimir Putin.
Isso mudou na última quarta-feira, quando Putin surpreendeu jornalistas no Kremlin ao dizer que estava pedindo aos ativistas pró-Rússia no leste da Ucrânia que adiassem o polêmico referendo que eles pretendem levar a cabo no próximo domingo, dia 11.
Também disse que a eleição presidencial da Ucrânia, marcada para o dia 25 deste mês, é um passo "na direção certa". No entanto, ele afirmou que o voto não valerá nada se não vier acompanhado da proteção dos direitos de "todos os cidadãos".
Foi o primeiro sinal de que ele pretende tirar a Ucrânia da beira do abismo de uma guerra civil - ainda que tenha responsabilizado os ucranianos anti-Rússia por colocar o país nessa posição.
"A responsabilidade pelo que está acontecendo na Ucrânia é das pessoas que levaram a cabo uma tomada anticonstitucional de poder, um golpe de Estado, e das pessoas que apoiaram essas ações financeira e politicamente", disse o presidente.
"Entendo as pessoas no sudeste da Ucrânia, que dizem que se outros podem fazer o que quiserem em Kiev (onde políticos anti-Rússia tomaram o poder em fevereiro, com a saída do então presidente pró-Rússia Viktor Yanukovich da capital), pegar em armas e ocupar edifícios governamentais, policiais e militares, então por que eles seriam impedidos de defender seus interesses e direitos legítimos?"
Mas qual o próximo passo? Por que Putin decidiu intervir no referendo do leste ucraniano numa etapa mais tardia?
"A ideia de que a Rússia tem a chave para resolver o problema é uma armadilha pensada por nossos parceiros no Ocidente e não tem base real. Nossos colegas da Europa e Estados Unidos levam a situação a um beco sem saída e dizem que Moscou tem a chave para uma solução e colocam a responsabilidade em nós", prosseguiu o mandatário russo.
Mas ele disse também que um diálogo "igualitário" entre o governo em Kiev e representantes do sudeste é a melhor solução para a crise.
Sinais
Uma fonte de alto escalão próxima a Putin disse à BBC que a Rússia apoiaria as eleições presidenciais ucranianas do dia 25 de maio se esse diálogo for iniciado e se Kiev cessasse o uso de violência no sudeste.
Pode ser um sinal de que Putin achou que os confrontos em Donetsk e arredores caminhava para um sangrento beco sem saída, que poderia sair de controle.
Ou pode ser um sinal de que ele prevê que uma nova rodada de sanções do Ocidente traria muitos prejuízos à Rússia, e que a anexação da Crimeia já é punição suficiente para Kiev, Europa e EUA por enquanto.
Outra hipótese é que seja uma tática de adiamento: uma forma de parecer que está fazendo algo mesmo sabendo que os conflitos continuarão, desgastando assim o governo em Kiev.
Certamente, a fala final do presidente na quarta-feira não foi muito otimista.
"Não sei o quão realista seria uma segunda rodada de diálogo (internacional) ou mesmo diálogos internos na Ucrânia. Simplesmente acredito que, se queremos uma solução de longo prazo para a crise, um diálogo aberto, honesto e igualitário é a única opção possível."
Talvez Kiev e Ocidente devessem entender suas declarações de maneira literal e dar início imediato a um diálogo com os manifestantes no sudeste do país.
Mas, após a anexação da Crimeia - e o fracasso da Rússia em agir após a rodada de diálogo realizada em Genebra -, é pequeno o número de pessoas preparadas para confiar em Moscou novamente.