O antigo palácio imperial de Hofburg, em Viena, sediou na última terça-feira (6) a 124ª sessão do Comitê de Ministros do Conselho da Europa. As reuniões do Comitê de Ministros são geralmente vistas como mero protocolo, necessárias sobretudo para testemunhar a passagem da presidência de um dos 47 Estados-membros do Conselho da Europa para outro a cada seis meses. Mas desta vez foi diferente.
Iúri Paniev, especial para Gazeta Russa
Depois dos eventos em Slaviansk, Odessa e outras cidades do sudeste da Ucrânia, era evidente que a reunião seria dominada pela questão da crise na Ucrânia. Nesse contexto, não é surpresa que o chanceler russo, Serguêi Lavrov, tenha recebido atenção especial.
O ministro levou consigo o Livro Branco, relatório elaborado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros russo que resume as violações dos direitos humanos na Ucrânia entre novembro de 2013 e o final de março deste ano.
A tarefa dos austríacos era evitar a divisão dos membros do Conselho da Europa com base na questão ucraniana – e a probabilidade de isso acontecer era alta.
Os enviados de Kiev, liderados pelo chanceler interino, Andrêi Deschitsia, queriam colocar à análise do Comitê de Ministros o projeto de uma declaração que submetia a posição da Rússia a duras críticas. As probabilidades de aprovação desse documento também eram bem altas.
Mas, ao que tudo indica, a maioria dos países europeus não quis levar o assunto até o ponto de confronto, e a parte ucraniana decidiu não apresentar o documento. O discurso de Lavrov também não foi tão áspero quanto inicialmente previsto. O foco do pronunciamento foram os trágicos acontecimentos de 2 de maio em Odessa, que deixaram 46 mortos e 214 feridos.
“No Ocidente, apesar de condenarem a tragédia de Odessa, tentam fechar os olhos à sua verdadeira causa, como no seu tempo calaram, e até justificaram, a linha de ação do antigo presidente Viktor Iuschenko e seus companheiros sob o disfarce de um novo patriotismo ucraniano”, lê-se no rascunho do discurso.
Na coletiva final de imprensa, o ministro russo não rejeitou a ideia do chanceler alemão, Frank-Walter Steinmeier, em organizar em Genebra uma nova reunião a quatro. No entanto, alertou que no formato anterior – Rússia, Ucrânia, EU e EUA, sem a participação de representantes do sudeste da Ucrânia, as negociações não surtirão efeito.
“Podemos voltar a nos reunir com o mesmo formato, sem que haja representantes da oposição ao atual regime, mas isso dificilmente irá acrescentar alguma coisa: vamos andar em voltas e falar de novo que é necessário realizar tudo o que foi acordado”, disse Lavrov. “Mas são os ucranianos que devem realizar isso –tanto os do regime, como aqueles que se opõem a ele.”
Mudança de atitude
Sobre a participação das tropas ucranianas no leste da Ucrânia, Lavrov pediu para as autoridades de Kiev pararem de recorrer ao Exército na repressão a protestos civis. Ele lembrou que, sob o governo de Viktor Ianukovitch, o Ocidente se opunha ao uso de militares em confronto civil.
“E agora ouvimos, inclusive dos líderes da UE, a tese de que as autoridades ucranianas têm todo o direito de usar as Forças Armadas para realizar a chamada ‘operação antiterrorista’”, declarou Lavrov. “Não vamos dividir a Ucrânia em Oriente e Ocidente, mas juntar os nossos esforços para iniciar o diálogo”, pediu o ministro.
Eleição sem futuro
Embora demostrando estranhamento pelas eleições presidenciais na Ucrânia em 25 de maio, “enquanto o exército está sendo usado contra parte da população”, Lavrov não questionou a sua legitimidade. “As eleições devem ser livres, justas, realizada em um ambiente sem violência e sob monitoramento internacional”, disse, destacando que o processo da reforma constitucional não será concluído até o dia das eleições.
“Ao votar em um determinado candidato para a presidência, os eleitores não vão saber até onde irá a autoridade e poder dessa pessoa caso seja eleita, uma vez que a Constituição irá redistribuir os poderes entre o presidente e o Parlamento”, acrescentou Lavrov. O chanceler russo sugeriu novamente o cumprimento das ações delineadas no acordo de 21 de fevereiro, isto é, uma nova Constituição e eleições até o final do ano.