O controle de Yabrud permite ao regime usar a rota terrestre Damasco-Alepo-Mediterrâneo e sufoca os insurgentes, que dependiam dessa via para o seu abastecimento
Carmen Rengel | El País
Jerusalém - O conflito sírio entra em seu quarto ano com um importante avanço das tropas leais ao presidente Bachar al Assad na fronteira com o Líbano. Segundo confirmou a agência oficial Sana, o Exército recuperou ao amanhecer deste domingo o “controle total” da cidade de Yabrud, até hoje o principal bastião rebelde nas estratégicas montanhas de Qalamoun. O presidente Bachar al Assad consegue, com isso, uma vitória dupla com esta reconquista: consegue assegurar o controle da rota terrestre entre Damasco, Alepo — capital econômica até o início da guerra — e a costa mediterrânea, agora já livre de ataques opositores, e ao mesmo tempo sufoca os insurgentes, fechando a principal via pela qual recebiam fornecimentos, tanto materiais como humanos, do vizinho Líbano.
A importância do enclave explica o esforço do Exército para controlá-lo, de modo que lançou uma ofensiva intensa em novembro, ininterrupta e especialmente cruenta no último mês. Os rebeldes, representados majoritariamente pela Frente Al Nusra — braço da organização terrorista Al Qaeda na Síria —, suportaram o assédio até que no passado dia 4 as tropas do regime conseguiram entrar na cidade. Os combates foram “encarniçados” desde então, confirma o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), um grupo opositor que avalia o avanço da disputa. Choques corpo a corpo tinham se centrado nestes últimos dias no leste de Yabrud, entre membros da milícia xiita libanesa Hizbullah — que desde a primavera de 2013 combatem abertamente a favor de Al Assad em solo sírio — e os rebeldes. Segundo fontes militares citadas pela agência France Presse, os opositores perderam até 13 chefes em combate, além de um “grande número” de efetivos de base, tanto mortos como capturados.
Um membro da Al Nusra confirmou à agência Reuters que, diante do avanço das Forças Armadas regulares, sua milícia tomou a decisão de sair da cidade. Seus seguidores refugiaram-se nas localidades próximas de Hosh Arab, Rankos e Fleita, onde ainda têm uma infraestrutura estável. Este porta-voz afirma que não vão cruzar o Líbano para buscar segurança na zona de Arsal, a menos de 20 quilômetros da fronteira, território sunita simpatizante com os opositores a al Assad e local de onde está vindo uma ajuda notável. No que pese isso, uma fonte militar libanesa constatou no canal LBC que mais de mil combatentes escaparam para os arredores de Arsal nos últimos dias. Esta manhã, o Exército sírio lançou outros dois ataques aéreos em chão sírio, justo nesta região, para debilitar sua rede de assistência.
O canal de televisão Al Mayadeen, ligado ao Hizbollah, está transmitindo imagens de uma Yabrud totalmente deserta, com os escritórios e estabelecimentos comerciais fechados e os soldados de Damasco patrulhando fortemente armados. Os Comités Locales de Coordinación, outro grupo dissidente, explica que ao menos a metade dos quase 50.000 habitantes da cidade escaparam desde o outono passado, desesperados pelos bombardeios constantes. Vários colaboradores do grupo na cidade e seus arredores informaram esta manhã que ocorreram ataques aéreos de helicópteros e com artilharia, para expulsar aos últimos rebeldes, que ontem à noite ainda controlavam debilmente 1% do município. Os explosivos colocados pela oposição em sua fuga estão sendo já desativados em todos os caminhos de acesso à vila, acrescenta Sana.
Várias das colinas próximas foram tomadas entre a sexta-feira e o sábado, acrescentam os Comitês, o que somado à queda uma semana atrás da cidade rebelde de Zara, outra importante zona porosa nas montanhas, faz com que as vias de ajuda vital aos dissidentes estejam “praticamente seladas” na frente ocidental. “O terreno já não é permeável”, dizem.
Os 17 mortos contabilizados ontem em todo o país nos combates entre partidários e detratores de al Assad e por bombardeios do Exército se somam a outros 11 falecidos, ao menos, na cidade libanesa de Trípoli, onde também se registraram 50 feridos em choques sectários, produto da crise síria.
Além disso, a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos emitiu um novo comunicado em que denuncia que já leva duas semanas sem poder distribuir ajuda humanitária (alimentos e medicamentos) no campo de Yarmuk, em Damasco, onde aguardam cerca de 20.000 pessoas. Estes civis, tanto palestinos como sírios, sofrem desde o verão passado o cerco total por parte do regime e só em fevereiro começaram a receber assistência. Agora, os bombardeios intermitentes fazem impossível novas partilhas. A Agência lembra que a desnutrição continua sendo generalizada e que há mulheres que morrem no parto por falta de assistência médica.