Secretário de Estado dos EUA, John Kerry, ameaçou impor sanções econômicas a Moscou antes mesmo do final de semana. Paralelamente, Europa se pronunciou sobre o endurecimento na concessão de vistos e recusa em projetos conjuntos. Mas, aparentemente, nenhuma das declarações causou desespero nas autoridades russas.
RBC Daily
Não é surpresa alguma que os EUA estão ameaçando impor sanções contra bancos, agências governamentais e investidores privados, assim como possíveis restrições de visto para os russos. “Congelamos as próximas conversações com a Rússia sobre comércio e investimento”, anunciou o porta-voz da representação comercial dos EUA, Michael Froman. O primeiro a insinuar que “a Rússia pagaria caro” pelo possível envio de tropas foi o próprio presidente Barack Obama, na sexta-feira passada (28).
O mercado de ações russo já sofre com os efeitos de medidas antirrussas desde o ano passado. “Muitos fundos retiraram ativamente capital da Rússia e essa tendência pode aumentar. Com as sanções podem também sofrer as grandes empresas. As instituições financeiras estrangeiras irão reduzir os limites de crédito para a Rússia, o que será um golpe para o comércio”, diz o diretor da Lombard Odier, Arnaud Leclerc.
No entanto, o economista garante que as sanções serão um golpe para os próprios EUA. “Em 2013, a Rússia exportou mercadorias para os EUA no valor de US$ 27 bilhões e importou US$ 11 bilhões de lá. Além disso, o país possui grandes reservas em dólares americanos e é ativo no mercado da dívida dos EUA”, explica.
Caso as ameaças sejam colocadas em práticas, os EUA perderão um mercado para escoamento de carne (aves, suínos e bovinos), com volume de mais de US$ 500 milhões. Em 2013, a Rússia importou 250 toneladas de carne de frango por quase US$ 300 milhões.
Também no ano passado, o comércio de carne suína e bovina ficou estagnado, pois o Serviço Federal de Vigilância Veterinária e Fitossanitária da Rússia havia proibido a importação de carne com a presença de ractopamina. O abastecimento de carne suína dos EUA deveria recomeçar em breve, mas os norte-americanos rapidamente cancelaram a visita dos agentes de inspeção russos.
Mas grandes atores do mercado, como a produtora de titânico VSMPO-AVISMA, garantem que não há motivos para temer possíveis sanções dos Estados Unidos. Segundo a empresa russa, que fornece até 40% do titânio aos americanos, o agravamento das tensões entre os dois países não teve qualquer impacto nas relações e acordos com a Boeing.
Outro exemplo que afasta receios é o da venda da cota no comércio do petróleo da Morgan Stanley à Rosneft. “As negociações estão ocorrendo de acordo com os prazos acordados entre as empresas”, afirma um representante da petrolífera russa.
“Devemos temer não tanto a recusa direta de petróleo e gás russos, quanto o fato de o Ocidente acelerar a sua saída da dependência energética da Rússia”, aponta o diretor do Instituto de Análise Estratégica da FBK, Igor Nikolaev. “A Europa pode assumir alguns custos e passar a comprar gás natural liquefeito do Qatar.”
Muro alto, risco grande
De acordo com o senador Christopher Murphy, as sanções unilaterais dos Estados Unidos contra a Rússia não serão muito eficazes se não foram associadas a outras medidas impostas pela União Europeia (UE). Mas, ao que tudo indica, a Europa continua em cima do muro.
Os ministros das Relações Exteriores da EU anunciaram, após reunião na segunda-feira passada (3), que se não forem tomadas “ações imediatas para diminuir as tensões na Ucrânia”, os chefes de Estado dos países do grupo, iriam votar “medidas específicas” contra a Rússia em uma cúpula de emergência.
Fontes diplomáticas em Bruxelas garantiram, contudo, que “não se discutiu nenhuma sanção adicional ou mais rigorosa contra a Rússia a não ser a de interromper as negociações sobre os vistos e os Acordo de Cooperação UE-Rússia”.
“A UE pode impor sanções contra os cidadãos: restringir as remessas de capital, negar a entrada a funcionários oficiais, interromper as negociações para facilitação de vistos e cancelar o estatuto especial do visto para estudantes, cientistas e pessoas em tratamento, assim como dificultar a reunificação familiar”, afirma o sócio do escritório de advocacia IUST, Aleksandr Bolomatov.
O presidente da União de Industriais e Empresários da Rússia, Aleksandr Chokhin, refuta a possibilidade de congelamento de bens de empresas privadas ou fechamento forçado da negociação na Bolsa de Londres, por exemplo. “Mas pode ser uma dica para que os bancos e fundos europeus fechem os seus programas na Rússia e se voltem para o Brasil”, acrescenta.
As dificuldades de negociações com membros específicos da OMC e o retardo no processo de adesão da Rússia à OCDE também foram citadas como possibilidades pelo professor da Escola Superior de Economia, Aleksêi Portanski.