Amparada em argumentos técnicos, a escolha dos caças Gripen NG, da sueca Saab, também respondeu ao lobby de um setor específico do PT
Denise Chrispim Marin | O Estado de SP
Amparada em argumentos técnicos, a escolha dos caças Gripen NG, da sueca Saab, pelo governo brasileiro, também respondeu ao lobby de um setor específico do PT. O prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, defendia essa opção desde a retomada do processo de compra de jatos militares pela Força Aérea Brasileira, há oito anos.
Durante o longo processo, os Estados Unidos sinalizaram com uma possível parceria com o Brasil no setor industrial, entre a Boeing e a Embraer.
Em junho passado, durante uma feira aeronáutica na França - o Paris Air Show -, Marinho extraiu do presidente da Saab, Hakan Buskeh a promessa de construção de uma fábrica de aeroestruturas em São Bernardo, onde possivelmente os caças Gripen serão montados.
Três meses antes, ele esteve com o vice-ministro das Relações Exteriores da Suécia, Gunar Wieslander, em Estocolmo, e recepcionou os reis suecos, Gustav e Silvia, em visita a São Paulo. Seu lobby em favor de um parque aeronáutico no ABC, ancorado no investimento da Saab, era um dos mais constantes no Ministério da Defesa.
O componente político seria igualmente relevante se a escolha da Força Aérea Brasileira fosse pelo F18 Super Hornet ou o pelo Rafale, da francesa Dassault, segundo Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington e presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. A proposta da França caiu por causa do custo mais alto. A oferta americana foi prejudicada pela descoberta da rede de espionagem dos EUA nos gabinetes de Brasília e na Petrobrás e pela reação brasileira - o cancelamento da visita de Estado da presidente Dilma a Washington, prevista para outubro passado. Mas, sublinhou Barbosa, sempre houve desconfiança no governo brasileiro sobre a dose real de transferência de tecnologia da Boeing à Embraer e a intromissão do Senado americano nessa parceria.
"Os acordos de Marinho com o governo sueco e a Saab certamente foram decisivos", afirmou. "Qualquer escolha teria uma motivação política. O que me surpreende não é a opção pelo Gripen, mas o momento escolhido pelo governo para anunciá-la", completou.
Anteontem, o governo brasileiro declarou não ter considerado uma a carta aberta aos brasileiros, escrita por Edward Snowden, como um pedido de asilo político. Snowden foi o responsável pela divulgação à imprensa de documentos da Agência Nacional de Segurança (NAS, na sigla em inglês).
Outro ex-embaixador em Washington, Roberto Abdenur, concordou estar ainda em evidência o escândalo de espionagem americana no Brasil, com sérias implicações negativas para a relação bilateral. Mas ponderou que a decisão em favor dos Gripen "não foi contra a americana Boeing e a francesa Rafale". A França, lembrou ele, manterá sua parceria estratégica com o Brasil, ampliada durante a recente visita do presidente François Hollande com a inclusão do projeto de compra de supercomputadores franceses.
Abdenur explicou ser importante também para o Brasil preservar as múltiplas áreas de diálogo e de cooperação com os EUA. Mas a recomposição da confiança mútua dependerá, inicialmente, de um pedido de desculpas pela espionagem da NSA. Para Barbosa, o governo americano terá de fazer um primeiro gesto, como a elevação do Brasil ao mesmo nível de parceria estratégica mantida por Washington com a índia e a Turquia.