Thomas L. Friedman | The New York Times
A equipe de Barack Obama teve de lutar com sua política sobre a Síria, mas, na verdade, esse é um problema complexo. Os EUA precisam de uma resposta em termos de estratégia que impeça um novo ataque com gás venenoso e, ao mesmo tempo, não envolva o país na guerra civil e não leve ao repentino colapso do Estado sírio com todas as suas armas químicas ou, pior, a um fortalecimento do regime e seus aliados: Hezbollah e Irã.
Mas acho que Obama adota estratégia errada. Ele quer o apoio do Congresso para um único ataque com mísseis, um ataque de "choque e pavor" contra alvos militares sírios. A estratégia correta seria ""armas e vergonha", Vou explicar. Considerem-me um ativista no que se refere a uma eventual resposta dos EUA ao massacre, segundo opositores, de cerca de 1,4 mil civis pelo regime sírio, entre eles, mais de 400 crianças, com gás venenoso. Se não houver uma resposta global, o mundo se tornará um lugar muito mais perigoso. Somente os EUA podem liderar uma resposta plausível: Rússia e China tomaram insignificante o Conselho de Segurança, a Europa é um museu militar, a Liga Árabe é inútil e todos os outros são espectadores. Os americanos estão na linha de frente - sozinhos. Talvez não quisessem estar ali, mas fato é que estão.
Entretanto, sustentar essa norma no contexto da guerra civil síria não é fácil. A começar pelo fato de que para construir uma Síria unificada e pluralista é necessária a chegada de uma força internacional que assuma o controle do país, monopolize todas as armas e se torne o intermediário de uma longa transição. Os sírios não podem fazer isso sozinhos. Ocorre que uma força externa não é possível no século atual e o Iraque demonstrou como é difícil que isso funcione.
Portanto, a opção mais provável para a Síria é algum tipo de partição de fato, com os sírios alauitas, de Assad, controlando uma região e os sírios sunitas e curdos controlando o restante. Mas os próprios sunitas se dividem entre os pró-ocidentais, o secular Exército Sírio Livre, que gostaríamos de ver vencer essa luta, e os jihadistas pró-Al-Qaeda, como a Frente Nusra, que gostaríamos de ver derrotada.
Por isso, acho que a melhor resposta ao uso de gás venenoso não é um ataque de mísseis contra as forças de Assad, mas o aumento do treinamento e do fornecimento de armas ao Exército Sírio Livre - com armamento antitanques e antiaéreas há tanto tempo esperadas.
Isso teria três benefícios. Primeiro, uma maior dotação de armas a unidades rebeldes responsáveis poderá afetar concretamente o regime de Assad -a dissuasão tem tudo a ver com isso - sem expor os EUA à vergonha de bombardear a Síria. Em segundo lugar, o envio de armas aos rebeldes permitirá que eles se protejam de maneira mais efetiva contra o regime. Por fim, isso pode aumentar a influência de grupos da oposição mais moderados sobre os jihadistas - e, finalmente, forçará Assad a negociar uma solução política.
Por outro lado, um bombardeio limitado contra a Síria pelo ar faria os EUA parecerem fracos, na melhor das hipóteses, mesmo que atingissem o alvo. Se matassem um grande número de sírios, isso permitiria a Assad desviar a atenção dos 1,4 mil que ele matou com gás venenoso. Além disso, quem sabe o que o bombardeio à Síria poderia desencadear? Será que o Irã decidiria apressar seu programa nuclear?
Os EUA precisam usar todos os instrumentos diplomáticos para lançar o opróbrio sobre Assad, sua mulher, Asma, seu irmão, o assassino Maher, e todos os membros do seu gabinete ou seus militares que identificassem como envolvidos nesse ataque com gás.
Washington deve levar seus nomes perante o Conselho de Segurança da ONU para que sejam condenados. Precisa levá-los ao Tribunal Penal Internacional. Precisa torná-los figuras notórias. Precisa colocar metaforicamente seus retratos em cada agência dos correios do mundo como pessoas procuradas por crimes contra a humanidade.
Não há muitas chances de eles serem levados à Justiça agora, mas não subestimem até que ponto poderia ser um elemento de dissuasão se a comunidade mundial imprimisse a marca de Caim em sua testa para que nem eles nem suas famílias nunca mais pudessem viajar para qualquer lugar que fosse, salvo Coreia do Norte e Irã. Talvez até pudesse fazer com que alguns dos partidários de Assad quisessem se livrar dele e buscar um acordo.
Se bombardearem a Síria por sua própria conta para defender sua "linha vermelha", os EUA farão com que os outros países virem simples espectadores - considerando ainda que a maior parte deles vaiaria. Se Washington envergonhar as pessoas que perpetraram o ataque com gás venenoso, poderá cooptar o resto do mundo e talvez até mesmo inspirar a comunidade internacional a unir-se aos americanos para traçar uma nova linha vermelha, como uma linha moral e, portanto, global. É fácil para Rússia, China e Irã denunciar um bombardeio americano, mas é muito mais difícil para eles defender o uso de armas de destruição em massa pela Síria. Portanto, os EUA devem obrigá-los a optar. E, melhor ainda, uma resposta moral pode ser uma resposta ilimitada - e não limitada.
Um ataque limitado com mísseis atende às necessidades de Obama de preservar sua credibilidade, mas incorreria no risco de modificar a questão. Em vez de tornar os rebeldes mais aptos a agir e a atrair o apoio do mundo para a ação, essa ação poderá tornar os EUA os elementos principais da história, o que o país não quer. A melhor maneira de ajudar é adotar a estratégia "armas e vergonha" para dissuadir o uso de gás venenoso, isolar Assad e pressioná-lo a um acordo. Não é perfeito? Não, mas a perfeição não está na pauta na Síria.
Tradução Anna Cappovila | O Estado de SP