Deutsh Welle
Após os terríveis ataques químicos na Síria na semana passada, aumentou a pressão sobre a comunidade internacional para que tome uma posição firme em relação ao conflito interno do país árabe.
Para analistas, o mundo ficou com a impressão de que os EUA e seus aliados não terão outra opção a não ser uma ofensiva militar contra o regime do presidente Bashar al-Assad. A famosa "linha vermelha" mencionada pelo presidente Barack Obama há quase um ano – ao referir-se ao uso de armas químicas ou biológicas no conflito sírio, atitude que justificaria uma intervenção internacional – foi indubitavelmente cruzada.
Analistas concordam que qualquer ataque dos EUA contra a Síria será relativamente limitado – possivelmente um ataque com mísseis aéreos contra edifícios do governo na capital síria, Damasco.
Mas Paul Rogers, analista de segurança do Grupo de Pesquisa de Oxford, uma consultoria com sede no Reino Unido, observa que "uma vez iniciada uma ação como essa, fica muito difícil prever o que irá acontecer." O especialista explicou em entrevista à DW que, "para o Oriente Médio, mesmo que o ataque dos EUA seja apenas simbólico, será visto com mais um exemplo de interferência ocidental".
Já o pesquisador Hayder al-Khoei, do Centro de Estudos Acadêmicos Xiitas no Reino Unido, concorda com Rogers. "Temo que um ataque irá apenas reforçar a crença de que os poderes do Ocidente tomaram partido em um conflito sectário brutal, cujas ramificações vão muito além da própria Síria", explicou.
A questão do Irã
Um país onde a reação a uma intervenção internacional pode ser especialmente volátil é o Irã, o principal aliado da Síria na região e eterno inimigo dos EUA. As recentes eleições no país levaram à presidência – de modo supreendente – Hassan Rohani, um candidato tido como "moderado". Muitos acreditam que o novo líder irá retomar as conversações com o Ocidente, na tentativa de aliviar o isolamento internacional de Teerã.
Mas, segundo Rogers, se houver um ataque dos EUA a um aliado do Irã, os conservadores irão orientá-lo para que não lide com os americanos, e que leve adiante a iniciativa de produzir armas nucleares.
Arshin Adib-Moghaddam, especialista em Relações Internacionais na Universidade de Londres e autor do livro On the Arab Revolts and the Iranian Revolution (em tradução livre, "Sobre as Revoltas Árabes e a Revolução Iraniana"), acredita que o efeito de um ataque militar internacional à Síria na política interna do Irã será limitado – mas que, mesmo assim, não faz com que uma intervenção na Síria seja uma boa idéia.
"[Um ataque] dificultará o diálogo com os iranianos", afirmou o especialista à DW. "Uma guerra contra a Síria seria mais um fiasco estratégico, uma imprudência."
Al-Khoei coloca a questão em termos ainda mais claros. "Um clérigo iraniano me disse recentemente: 'Se Assad cair, os iranianos irão marchar a pé até a Síria".
Impotência americana
No entanto, Walter Posch, especialista em assuntos iranianos do Instituto Alemão de Relações Internacionais e de Segurança (SWP, da sigla em alemão), não está convencido de que as consequências seriam tão dramáticas. "Me parece que os iranianos foram informados, ou que há algum tipo de comunicação indireta entre EUA e Irã através do sultão de Omã", observou. "Há dias, o sultão esteve no Irã, e teve uma longa conversa com o Líder Supremo [Ali Khamenei] sobre a segurança na região."
Posch acredita que a diplomacia de Teerã é mais hábil do que se imagina, e que não há a preocupação com um ataque militar na Síria. "Haverá as costumeiras condenações, mas e daí? A quem se poderá bombardear? Damasco? Já está bastante bombardeada. Não sobrou muita coisa. [A Síria] sempre foi uma peça que manteve um bom equilíbrio entre o Irã e a Arábia Saudita. Seja lá o que vier a ocorrer agora, esse conflito tem características sectárias. Em se tratando de um conflito intra-islâmico, será que o Ocidente teria muito a dizer nesse caso?"
De acordo com a perspectiva de Posch, os americanos estão completamente cientes de sua impotência no Oriente Médio. "Obama sabe que não pode fazer nada lá", afirmou o especialista. "Sabemos agora que após um ataque militar, os EUA não poderão nem controlar o país ou impor sua vontade na política local. Basta lembrar o caso da Líbia."
Plano B
Os iranianos também sabem disso, e aprenderam com a experiência do Iraque que a influência do Ocidente pode ser retirada do país-alvo, no caso a Síria. "O Irã já está se preparando para saber o que fazer após a queda de Assad, quando as coisas começarão de fato a acontecer", analisou Posch. "Estão compondo milícias locais. Quando Assad sair do poder, a guerra civil pode entrar em outra fase." Para Posch, o Irã "obviamente" preferiria que Assad continuasse no poder, mas mesmo assim o país já tem um "plano B".
O analista sugere também que a opinião pública iraniana não é particularmente simpática a Assad. "A maioria pensa 'o que estamos fazendo com esse país árabe?' Os bons muçulmanos pensam que é uma desgraça estar aliado com alguém do partido Baath, que está sempre reprimindo o Islã", explicou.
"Há o interesse garantido do Irã no aparato de segurança – com os que acreditam que precisam de Assad, da Síria e do Hisbolá [organização fundamentalista islâmica no Líbano] para que a pressão sobre Israel continue. Essa é uma corrente importante, que inclui o Líder Supremo, mas não a maioria dos iranianos. Alguns poderão até entrar em pânico, mas de modo geral não acho que haverá grandes reações a uma eventual saída de Assad", defende o especialista.
Ele entende que a liderança iraniana irá se adaptar à ausência de Assad. "Eles irão pensar 'OK, Assad caiu, e agora?' É o que sempre fazem. Quando alguem mede forças contra os iranianos, eles não costumam alinhar e expõe o adversário, enxergando suas intenções. Eles têm se saído bem assim até o momento."