Mark Mardell
Da BBC News, em Washington
A possibilidade de um ataque ganhou força nesta terça-feira, quando o secretário de Defesa dos EUA, Chuck Hagel, afirmou à BBC que as Forças Armadas americanas estão prontas para um ataque à Síria caso a ordem para o início da operação militar seja dada pelo presidente Barack Obama.
O congressista republicano Justin Amash tuitou que o gabinete presidencial só pode passar por cima do Congresso e ir à guerra no caso de uma emergência nacional - ainda que isso já tenha sido feito antes.
É possível que Obama não tivesse dificuldades em conseguir autorização para uma ação militar, mas talvez a imprensa seja o único fórum em que uma eventual decisão seja debatida.
O secretário de Estado, John Kerry, e o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, lançaram ambos o mesmo argumento: de que o "senso comum" indica ao mundo que houve um ataque com armas químicas na Síria, perpetrado pelo presidente sírio, Bashar al-Assad.
'Circunstancial'
"O aparente número de vítimas, os supostos sintomas dos que foram mortos ou feridos, os relatos em primeira mão de organizações humanitárias em campo, como os Médicos Sem Fronteiras e a Comissão de Direitos Humanos da Síria - todos indicam fortemente que tudo o que essas imagens já nos dizem é verdadeiro: que armas químicas foram usadas na Síria", declarou Kerry.
"Além disso, sabemos que o regime sírio guarda essas armas químicas. Sabemos que eles têm a capacidade (de lançá-las) com foguetes", prosseguiu o secretário de Estado. "Sabemos que o regime está determinado a varrer a oposição dos locais onde os ataques ocorreram."
Tudo isso é circunstancial e joga um grande peso sobre o "senso comum". Ainda há questionamentos quanto à força das provas necessária para que uma resposta militar seja adotada.
Kerry está correto em pensar que muitos americanos compartilharão da mesma opinião que ele ao assistir às imagens televisivas das supostas vítimas dos ataques químicos.
Alguns, entretanto, exigirão provas mais contundentes do episódio, sobretudo levando em consideração que dados falhos de inteligência foram usados como justificativa para a Guerra do Iraque.
Obama liberou um relatório de inteligência para divulgação nos próximos dias, com uma análise mais detalhada do caso.
Congressistas americanos e parlamentares britânicos aguardam respostas mais contundentes - e o público aguarda um alto nível de escrutínio.
O que diz a Lei Internacional
A expressão 'lei internacional' evoca uma ideia de regras globais de comum acordo entre nações, facilmente entendidas e aplicadas por elas. Infelizmente, a realidade está longe disso. Na prática, é difícil - ou impossível - usar jurisprudência internacional em intervenções militares.
Não há cortes internacionais para dar o aval a intervenções. Entretanto, está em desenvolvimento uma estrutura legal para validar intervenções militares por razões humanitárias - a 'Responsabilidade em Proteger', ou R2P, idealizada após as tragédias em Kosovo e Ruanda nos anos 1990. É ampla - ainda que não universalmente - aceita.
Ela prevê que Estados têm de proteger seus povos do genocídio, de crimes de guerra e de crimes contra a humanidade. Ante evidências fortes desses crimes e da incapacidade do Estado em evitá-los, a comunidade internacional deve tentar todos os meios pacíficos para pôr fim às atrocidades.
Se essa estratégia fracassar, a comunidade internacional poderia, então, usar a força.
Para ter legitimidade, a intervenção militar deveria ser autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU. Mas, como no caso da Síria, esse órgão tem dificuldades em obter consenso. Em casos assim, a R2P ofereceria embasamento legal para uma ação externa - seja por uma coalizão regional ou uma 'coalizão dos (países) dispostos' a agir.
Há diversas salvaguardas à R2P: é necessário haver provas contudentes de uma atrocidade em curso; ações diplomáticas têm de ter sido exauridas; e o uso da força deve visar apenas o fim das atrocidades e a proteção de civis. Ou seja, o poder de ação é limitado. Mas, cumpridas essas precondições, essa ação seria legal perante a lei internacional.
No fim das contas, intervenções nessas circunstâncias dependem mais da decisão de governos do que de juristas. Cabe a políticos argumentar que a intervenção é válida. No caso da Síria, pode-se dizer que há atrocidades em curso, que as tentativas pacíficas de impedi-las foram exauridas e que uma ação militar poderia interromper a tragédia e proteger a população civil.