Comissária de Direitos Humanos culpa Assad, oposição e Conselho de Segurança por banho de sangue
O Globo
GENEBRA e DAMASCO - As já altas estimativas de 45 mil mortes desde o início do conflito na Síria foram derrubadas ontem pela alta comissária de Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay. Após cruzar dados de sete fontes distintas durante cinco meses numa "análise exaustiva", um novo relatório coloca em pelo menos 60 mil o número de vítimas da guerra civil somente entre março de 2011 e novembro de 2012. E os responsáveis por essas milhares de mortes são tanto agentes do governo como membros da oposição armada.
Os números foram revelados horas depois da explosão de um posto de gasolina, alvejado por um míssil das forças do governo, em Damasco - episódio que matou ao menos 30 pessoas e deixou várias feridas, segundo ativistas.
Esse novo estudo foi compilado pela empresa independente Benetech e levou em consideração 147.349 denúncias. Se no verão de 2011 (no Hemisfério Norte), havia na Síria uma média de mil mortes ao mês, esse número saltou para cinco mil em julho de 2012. A região mais mortífera foi a província de Homs, com 12.560 mortes, além dos vilarejos no entorno da capital, onde foram contabilizadas 10.862 mortes. Já a província de Idlib aparece em terceiro lugar, com 7.686 - seguida por Aleppo, Deraa e Hama.
Segundo a comissária, o estudo não permite determinar o número de civis e militares mortos no conflito - mas indica que 76% são homens. Ela alertou, mais uma vez, para o caráter cada vez mais sectário da batalha e ressaltou que os opositores também vêm cometendo violações.
- O número de vítimas é muito maior do que esperávamos, o que é realmente chocante - pontuou ela.
Contagem feita "por baixo"
Os pesquisadores cruzaram denúncias de grupos opositores e defensores de direitos humanos para remover nomes duplicados e dar credibilidade às denúncias completas, com nome e sobrenome das vítimas, além da data e local das mortes. Após esse processo, chegou-se, então, à cifra de 59.648 mortes. Entre as fontes de informação, estão os grupos opositores Centro de Documentação das Violações; Rede Síria para os Direitos Humanos; o site Shuhada e o Observatório Sírio de Direitos Humanos, baseado em Londres.
Há, ainda, mortes desconhecidas de qualquer uma das sete entidades consultadas. Ou seja, o número total de vítimas da guerra civil deve ser maior.
"As estatísticas apresentadas neste relatório devem ser consideradas margens mínimas", adverte o texto final, intitulado Análise Preliminar Estatística da Documentação das Mortes na Síria.
Navi reforçou a constatação:
- Dado o fato de que não houve avanços no conflito, podemos supor que mais de 60 mil pessoas foram mortas até o início de 2013. Sem uma resolução rápida para o conflito, temo que milhares mais venham a morrer ou sofrer ferimentos como resultado daqueles que abrigam a crença obstinada de que algo pode ser atingido através de mais banho de sangue, mais tortura e mais destruição gratuita.
110 vítimas no 1º dia do ano
De acordo com ativistas radicados na Síria, o primeiro dia do ano teve pelo menos 110 mortos, entre pesados bombardeios na capital. Forças do regime usaram canhões para bombardear o vilarejo de Mleiha, ao Leste de Damasco. Testemunhas contam que a região, basicamente residencial, estava, até então, tranquila. Mas, a vila abriga uma base da defesa aérea de Assad.
- Até o ataque, Mleiha estava calma. Estamos sem combustível há quatro dias, e o povo da cidade e do interior correu para o posto de gasolina quando um carregamento do Estado chegou - contou um ativista identificado como Abu Fouad.
Entre os relatos de violência cada vez maiores na Síria, revelou-se ontem que o jornalista americano James Foley, de 39 anos, está desaparecido há seis semanas no país. Autônomo, ele teria sido sequestrado por homens armados não identificados na província de Idlib. Nenhum grupo reivindicou a responsabilidade.