Denize Bacoccina – IstoÉ Dinheiro
Seis dias após o cancelamento pela Força Aérea americana de uma licitação vencida pela Embraer para fornecimento de aviões Super Tucano e quatro dias depois da forte reação do Itamaraty, desembarcaram em Brasília, na segunda-feira 5, para encontros com o governo, o presidente da Boeing Military Aircraft, Chris Chadwick, e o vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios e Estratégias, Chris Raymond. O cancelamento da licitação americana se deu por pressão política, embora a justificativa oficial seja de problemas na documentação. Para a Embraer, o contrato de US$ 355 milhões era importante, já que podia abrir portas para novas encomendas. A pouco mais de um mês da visita da presidenta Dilma Rousseff a Washington, o Itamaraty bateu duro e disse que o ato "não contribui para o aprofundamento das relações entre os dois países em matéria de defesa". A concorrente que perdeu a licitação e entrou na Justiça contestando o resultado, a Hawker Bechcraft, mirou na Embraer, mas acertou na Boeing. Entre os acionistas da Hawker está outro peso-pesado da indústria de defesa americana, a Lockheed Martin, concorrente da Boeing. A gigante americana de aviação e defesa deve ser a maior prejudicada na briga, ao ver reduzidas suas chances de conquistar o contrato de até US$ 10 bilhões para fornecimento de 36 caças à Força Aérea Brasileira.
Na visita a Brasília, Chadwick se encontrou com o senador Fernando Collor de Mello, presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa, e com o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito. A Boeing se esforça para convencer o governo brasileiro de que, se vencer o contrato, irá repassar a empresas nacionais tecnologias sensíveis, só compartilhadas com os parceiros da Otan, a aliança militar entre Estados Unidos, Canadá e países europeus. Em 2006, no entanto, o governo americano proibiu a venda de aviões Super Tucano – o grande orgulho da indústria de defesa brasileira e que tem componentes americanos – à Venezuela, deixando um trauma no governo brasileiro, que teme a repetição do episódio, caso um novo cliente desagrade aos americanos. O Brasil quer usar sua crescente influência no mundo, especialmente entre os países em desenvolvimento, para criar uma indústria de defesa que também se torne, no futuro, um produto de exportação. Para isso, a transferência de tecnologia é – e deveria mesmo ser – o ponto-chave na escolha do novo fornecedor dos caças brasileiros. Além da Boeing, os outros dois concorrentes, a francesa Dassault e a sueca Saab, oferecem parcerias com empresas brasileiras para a produção local. A sueca fez a oferta mais generosa, sem impedimentos por parte do governo. O problema é que o seu avião ainda tem que ser desenvolvido. Se for bom como o projeto prevê, o Brasil será parceiro numa aeronave que pode correr o mundo.
Se não for, arcará com o ônus de ter comprado apenas um projeto, em vez de um avião. A Dassault, a grande favorita no governo Lula, também promete parcerias com as empresas brasileiras. De olho nas oportunidades, as empresas do setor já começam a conversar com os três concorrentes. O resultado da licitação, depois de tantos adiamentos, deve finalmente sair até maio. Um contrato benfeito pode ser a oportunidade esperada pela indústria nacional, castigada por um dólar que dificulta sua competitividade, num mercado em que a concorrência se dá não pelo preço mais baixo, mas pelo melhor produto.