Ameaça crescente. Relatório da agência de
monitoramento de energia atômica da ONU, a ser apresentado hoje ou amanhã, deve
alertar para a cooperação recebida de cientistas da ex-URSS, Paquistão e Coreia
do Norte, que teria impulsionado planos iranianos
O Estado de SP
Informações
fornecidas à divisão de armas nucleares da ONU mostram que o governo do Irã
domina as fases fundamentais necessárias para a fabricação de uma arma nuclear,
informou ontem o jornal The Washington Post, citando diplomatas e especialistas
em arsenais atômicos. De acordo com as mesmas fontes, Teerã recebeu a
assistência de cientistas estrangeiros para superar os principais obstáculos
técnicos.
Documentos
que devem ser apresentados hoje ou amanhã anexados ao relatório da Agência
Internacional de Energia Atômica (AIEA) sobre o programa do Irã trarão novos
detalhes sobre a atuação de um ex-cientista soviético que teria supervisionado
os iranianos durante a construção de detonadores de alta precisão, usados para
desencadear uma reação nuclear. A tecnologia oferecida por especialistas do
Paquistão e da Coreia do Norte também permitiu que o Irã chegasse perto da
obtenção da capacidade nuclear.
As
fontes disseram que os documentos reforçam os temores de que o Irã continuou
com as pesquisas em busca de armamentos depois de 2003 - quando, acreditam as
agências de inteligência americanas, os líderes iranianos interromperam suas
experiências atendendo a pressões internacionais.
Os
temores de que o Irã possa construir uma bomba atômica nos próximos meses
intensificaram a retórica contra o Irã e incitoram novas ameaças de ataques.
As
autoridades iranianas mostraram-se indiferentes ao relatório. "Deixem que
eles publiquem o relatório e vamos ver o que acontece", afirmou no sábado
o ministro de Relações Exteriores iraniano e ex-principal autoridade da divisão
nuclear, Ali Akbar Salehi. O chanceler disse ainda que a discussão sobre o
programa nuclear do Irã é "de caráter inteiramente político", e a
AIEA está sendo "pressionada por potências estrangeiras".
Embora
a AIEA venha exigindo total transparência do Irã em relação a vários projetos
aparentemente científicos, as novas revelações dão a impressão de que existe um
programa de pesquisas secretas mais ambicioso, mais organizado e mais
bem-sucedido do que se suspeitava.
Interrupção. Depois de uma
interrupção em 2003, os cientistas iranianos trabalharam para obter as
competências imprescindíveis à fabricação e aos testes de uma arma nuclear que
possa ser transportada no interior de mísseis de longo alcance, disse David
Albright, ex-funcionário da AIEA que analisou as informações da inteligência.
"O
programa nunca parou", afirmou Albright, presidente do Instituto para as
Ciências e a Segurança Internacional sediado em Washington. "Após 2003, o
Irã destinou recursos para a pesquisa em atividades que com toda a certeza se
destinam à construção de armas nucleares, mas que foram disfarçadas em
instituições civis", disse Albright.
Representantes
do serviço de informações dos EUA afirmam que Teerã não decidiu se construirá
armas nucleares, mas está empenhada em reunir todos os componentes e as
competências necessários para montar rapidamente uma bomba. O Irã insiste que
suas atividades são pacíficas e para a geração de eletricidade.
Dispositivo de detonação. Uma descoberta
fundamental ainda não divulgada foi o sucesso do Irã na obtenção de informações
relativas ao projeto de um artefato conhecido como gerador R265. O objeto é uma
cápsula de alumínio revestida de explosivos capazes de provocar detonações com
total precisão. As explosões comprimem uma pequena esfera de urânio ou plutônio
enriquecido, desencadeando a reação nuclear.
A
criação é um formidável desafio técnico, e, segundo Albright, o Irã precisou de
ajuda externa para projetar o gerador e testar seu desempenho. De acordo com as
informações fornecidas à AIEA, a assistência foi dada por Vyacheslav Danilenko,
um cientista nuclear soviético contratado na década de 90 pelo Irã.
O
papel de Danilenko foi considerado crucial, e a AIEA procurou de todo modo
obter sua cooperação. O cientista admitiu participação no projeto, mas disse
que pensava que era um trabalho de engenharia civil.
O Irã
precisou ainda de especialistas estrangeiros para conseguir os cálculos e
códigos necessários para o trabalho teórico do projeto - que teriam sido
fornecidos pela Coreia do Norte. Uma assistência adicional teria sido
proporcionada pelo famoso cientista paquistanês Abdul Qadeer Khan, cujo projeto
de um dispositivo foi encontrado no Irã.
As
revelações ocorrem num momento em que são feitas novas ameaças de ataque ao
Irã. Os jornais israelenses noticiaram o apoio de funcionários graduados do
governo de Israel a um ataque militar a instalações nucleares do Irã. Ontem, o
chanceler russo, Serguei Lavrov, advertiu que qualquer ação militar contra
Teerã seria um erro grave com consequências imprevisíveis, que levaria a mais
conflitos e a mortes de civis. A Casa Branca decidiu esperar a divulgação do
relatório da ONU para se manifestar sobre o programa nuclear do Irã.
THE WASHINGTON POST