Presidente eleito do Chile, que assume na 5ª, critica preconceito contra Forças Armadas
Auxiliar de Bachelet admite que governo de esquerda teve dificuldade em recorrer a militares, a quem combateu durante ditadura de Pinochet
O presidente eleito do Chile, Sebastián Piñera, de centro-direita, que assume o cargo depois de amanhã, criticou ontem o "absurdo preconceito" que o atual governo, da esquerdista Michelle Bachelet, teria tido em relação à "presença das Forças Armadas nas ruas" após o terremoto do último dia 27.
Piñera anunciou, em entrevista a uma rádio chilena, que estuda estender a outras regiões do país o regime de "exceção constitucional por catástrofe", que permite a intervenção das Forças Armadas e a instituição do toque de recolher. Bachelet definiu como "zona de catástrofe" as duas regiões no Sul do país mais próximas ao epicentro do terremoto.
O futuro presidente indicou que pretende manter "por mais tempo" a atuação das Forças Armadas na pacificação das regiões onde houve saques a estabelecimentos comerciais e bancários após a catástrofe.
Na manhã do domingo seguinte ao abalo, Piñera pediu publicamente a Bachelet que recorresse às Forças Armadas para controlar a situação. A presidente só tomou a decisão de envolver o Exército na operação de emergência na tarde daquele dia.
Ontem, o futuro presidente classificou como "um preconceito que há que eliminar" a declaração do ministro de Obras Públicas, Sergio Bitar, de que "não foi fácil para a Concertação [a coalizão de Bachelet, que lutou contra a ditadura militar de Augusto Pinochet] a ideia de ter os militares nas ruas".
Piñera disse que "os militares são parte da sociedade chilena". "São tão chilenos quanto todos os demais. Portanto, se os militares podem ser úteis numa emergência, não há nenhuma razão para que essa ajuda não chegue."
Pesquisa de opinião publicada no último domingo pelo jornal "El Mercurio" aponta que a maioria dos chilenos aprova o envio das Forças Armadas às áreas mais atingidas pela catástrofe e avalia que Bachelet demorou a tomar essa iniciativa.
Na análise do doutor em ciência política e diretor do Instituto de História da Pontifícia Universidade Católica de Valparaíso, Eduardo Araya, esse é um comportamento circunstancial da sociedade chilena, que não tenderá a um giro político em direção à direita.
"Todas as pesquisas de opinião pública mostram que não há mudanças de orientação ideológica no grosso do eleitorado, cuja base, além disso, está congelada", afirma Araya.
O professor afirma que "é evidente que a decisão [de Bachelet] de mobilizar as Forças Armadas foi tardia. A pergunta é por quê?". Araya crê que Bachelet tenha sido pressionada a não tomar a medida por assessores preocupados com um impacto negativo em sua imagem. Mas acrescenta que a atitude de Piñera de cobrar publicamente a iniciativa "não é grata para nenhum governo".