Área Militar
Têm-se vindo a acumular nos últimos tempos noticias sobre potenciais aquisições russas de equipamentos de origem ocidental e a última delas dá conta do interesse do exército russo na aquisição da viatura LMV de origem italiana e também utilizada por britânicos e espanhóis entre outros.
Ainda que não se confirme qualquer aquisição, que foi aliás desmentida pelo ministério da defesa russo, o interesse não foi negado.
Também nas últimas semanas foram publicadas notícias na imprensa russa sobre o interesse de entidades da polícia daquele país na aquisição de viaturas blindadas francesas sobre rodas.
Desde a chegada à presidência de Dimitri Medvedev e de algumas modificações no comando das forças armadas russas, tem havido por parte de vários sectores russos uma maior abertura para a possibilidade de aquisição de equipamentos ocidentais.
Obsolescência é o problema
A Rússia não é exactamente conhecida por não ter capacidade para produzir equipamentos militares, mas o problema é grave e como todos os problemas graves não é imediatamente aparente.
Desde que receberam os primeiros jipes norte-americanos do tipo Bantam, que a então União Soviética começou a produzir versões locais.
As versões locais sempre foram consideradas inferiores às versões norte-americanas e os militares soviéticos preferiam os modelos norte-americanos, dos quais muitos milhares foram recebidos durante a II guerra mundial.
Com a guerra fria a União Soviética desenvolveu os seus próprios sistemas com base em plataformas modificadas e derivadas dos modelos norte-americanos. Esta é a tradição da industria militar russa, que normalmente demonstra uma grande capacidade para modernizar continuamente os modelos e adapta-los a novas situações, mas chega a um ponto em que a industria pura e simplesmente precisa de novos modelos.
Durante o período soviético era possível promover a concorrência entre os gabinetes de desenvolvimento e depois escolher quais as fábricas soviéticas que produziriam os novos modelos, mas o fim da URSS levou a que esta estrutura caísse por terra.
A Rússia continua a produzir os seus próprios veículos, mas na maioria dos casos eles estão ultrapassados, como é o caso do veículo russo conhecido como «Tiger», que aparentemente não corresponde às necessidades russas.
O principal problema russo é o atraso do país na produção de ligas de metais compostos, onde a Rússia ficou irremediavelmente para trás desde o fim da União Soviética.
Blindagem russa: calcanhar de Aquiles
O problema da blindagem tem constituído uma das dores de cabeça dos projectistas russos desde há muitos anos. Quando os ocidentais começaram a recorrer a munição de energia química[1], a solução russa consistiu na utilização de blindagem reactiva, e neste sector os russos atingiram uma posição de excelência, produzindo módulos de blindagem considerados dos mais eficientes.
Mas quando começaram a vulgarizar-se as munições de energia cinética [2] a blindagem dos carros russos voltou a ser considerada pouco eficiente. Todos os veículos russos, mesmo os mais recentes tanques T-90, baseiam a sua capacidade de protecção em módulos de blindagem reactiva, mas a blindagem composta, que permite deter os projecteis modernos nunca foi considerada eficaz, pelo que a solução russa consistiu no aumento da quantidade de aço, o que aumenta o peso das viaturas para lá do aceitável, ainda mais que o espaço disponível para colocar motores nos tanques russos é reduzido.
Para tornar a situação mais complicada, o recurso à blindagem reactiva é uma solução simples e «à russa», mas tem um inconveniente muito grande: Ela precisa ser substituída com regularidade, porque o explosivo que contem deteriora-se com o tempo (como qualquer explosivo) e passado o prazo de validade, pode não garantir qualquer protecção.
Isto ficou claro durante a invasão da Geórgia, em que muitos dos tanques russos já não tinham os módulos de blindagem reactiva instalados, porque já estavam fora de prazo, eram instáveis e apenas acrescentavam peso aos veículos.
A Rússia parece assim interessada em adquirir tecnologia europeia, que lhe permita ultrapassar este reconhecido problema.
O interesse russo poderá também servir – segundo vários analistas europeus – para tentar passar uma mensagem de que a Rússia está disponível para negociar com o ocidente, nomeadamente com os países europeus.
Em Washington, esta aproximação ao problema é vista com desconfiança, pois a tentativa de provocar entraves ao relacionamento entre os dois lados do Atlântico sempre foi uma das tácticas utilizadas pelos russos para dividir os países ocidentais.
[1] – Munição que pode ser disparada de grande numero de veículos e cuja capacidade de perfuração de blindagem não depende da potência do disparo. A ogiva viaja a baixa velocidade, e quando atinge o alvo, forma-se um jacto de metal liquido que perfura a blindagem a uma velocidade de aproximadamente 9000m por segundo. Este tipo de munição não é eficiente contra blindagem reactiva.
[2] – Munição que baseia a sua capacidade de perfurar a blindagem, nna velocidade de disparo do projéctil. Normalmente este tipo de munição só pode ser disparado por viaturas pesadas e a única protecção eficaz é a blindagem composta por várias camadas de materiais compostos.